HORÁRIO DE VERÃO NO BRASIL
Todo ano a mesma rotina. Adiantamos nossos relógios e atrasamos nossas vidas, tudo por um motivo que permanece na obscuridade.
Para quem ainda pensa que horário de verão economiza energia, fato é que nem o
Ministério das Minas e Energia nem o
Operador Nacional do Sistema Elétrico acreditam mais nisso. Já faz mais de uma década que desistiram de tentar se convencer de tal coisa. E basta pesquisar um pouco para saber que, ainda que tal economia ocorresse, E NÃO OCORRE, ela seria irrisória.
Na verdade, a justificativa atual do horário de verão é a preservação do sistema elétrico, pois como a parte final do expediente industrial não mais coincide com o acender das luzes, reduziríamos o horário de pico de consumo, evitando sobrecarga no sistema e prevenindo problemas de abastecimento.
Mas basta pensar um pouco para perceber que essa justificativa é ainda mais furada do que a da economia.
Passamos meses de seca, racionando, ou ameaçando racionar, água e energia, e mesmo assim suportamos a coincidência do fim de tarde onde as indústrias ainda funcionam simultâneas ao acender das luzes. O sistema aguenta esse "fato inevitável no inverno", com seus dias mais curtos e secos, e na nossa seca e quentíssima primavera, onde a falta de chuvas diminui o nível dos rios e cai a potência de nossas hidrelétricas.
Então porque diabos teríamos que ter medo do pico justo na época onde mais temos água e não corremos risco de apagões!?
Mesmo no horário normal, durante o verão já ocorre uma natural distribuição da luz diurna, que já alivia o pico, e associado às chuvas, elevando o nível dos rios frequentemente acima do máximo que as hidrelétricas podem utilizar, não faz o menor sentido dizer que o risco de sobrecarga no sistema é maior! O que mais então justifica esse horário?
Apesar do que diz o governo, é bem possível que durante o verão o consumo seja até menor. Graças às chuvas usa-se muito menos o ar condicionado, e por não ser tão frio pode-se usar o chuveiro em temperaturas mais baixas. Os recessos escolares e o fato de muitos trabalhadores tirarem suas férias nessa época diminuem até mesmo a produção industrial e consequentemente o consumo de energia, apesar do suposto aumento de produção industrial de fim de ano.
Ademais, mesmo admitindo esse consumo maior, o mesmo só ocorre até o final do ano, e dessa forma, o horário de verão deveria ser encerrado logo no começo de Janeiro. Mas ele dura até o fim de Fevereiro!
E ao menos aqui em Brasília, se é verdade que em Novembro, as 6:00 da manhã, o dia já está claro, em Fevereiro a escuridão é total!
Como justificar isso com o argumento do maior consumo do final do ano?!
Em suma, justo quando temos energia de sobra, e possivelmente consumo de menos, com dias mais claros, nos dizem que precisamos ser ainda mais cuidadosos com o horário de pico?!
E observe bem essa situação. O horário de verão foi reintroduzido pela última vez há 26 anos, sempre sob a justificativa da economia de energia. Agora é assumido que essa economia não ocorre. Não é estranho então apelar para a justificativa do "achatamento da curva de consumo"?
Vale a PENA o HORÁRIO DE VERÃO?
Muitas pessoas costumam dizer que o verdadeiro motivo do Horário de Verão nem é tão obscuro. Uma vez que ele é ótimo para o comércio, em especial os bares e lazeres ao ar livre, que podem ser usufruídos até mais "tarde".
Isso de certo é verdade. Os comerciantes adoram HV. E também muitas pessoas que não precisem ou não se importem de levantar cedo.
Mas quem madruga antes das 6 da manhã, o que inclui praticamente toda a população trabalhadora, normalmente detesta essa tortura anual.
É curioso viver num estado de direito que deve respeito à intimidade do cidadão, mas que num decreto causa uma mudança no âmbito mais íntimo da privacidade. Todos podem escolher onde e com quê trabalham, tendo algum grau de determinação sobre seus horários. Mas de repente, vem o estado e simplesmente determina uma alteração que tem impacto fisiológico direto no indivíduo. Que afeta o corpo e a mente do modo mais invasivo possível.
Será que esse benefício ao comércio justifica esse dano cronobiológico numa população inteira?
Justifica a queda de rendimento escolar, trabalhista, aumento de acidentes de trabalho, atrasos e todo o estresse a que a população é submetida?
É verdade que também há vantagens pessoais. Sair do trabalho com o dia claro realmente interessa à muita gente, e as opções de lazer se ampliam. Mas o que merece mais respeito: a possibilidade do lazer de fim de tarde para alguns, ou o fato de quase todos terem que levantar cedo para trabalhar?
Ademais, vivemos num país tão grande que o HV não pode ser totalmente implementado, visto que NÃO SE APLICA HV EM ZONAS EQUATORIAIS! Por isso, Norte e Nordeste ficam excluídos, e a diferença maior de iluminação é sentida com mais intensidade na Região Sul. Única onde realmente poderia haver alguma economia significativa.
Esse atraso entre a hora oficial de Brasília e as regiões NO e NE gera uma série de problemas, razão pela qual empresários baianos, mesmo admitindo o inconveniente, preferem adotar também o HV, evitando as discrepâncias de horários. Até mesmo a população comum sente a diferença no horário de programação da TV, do funcionamento do sistema bancário e de serviços de atendimento pelo telefone.
Em suma, há inúmeros aborrecimentos que mesmo a população que não está diretamente sob o HV tem que enfrentar.
Pra quê serve HORÁRIO DE VERÃO?
Algo muitíssimo estranho é que se nem o
Ministério das Minas e Energia, o
Operador Nacional do Sistema Elétrico ou mesmo as companhias elétricas tem alardeado economia de energia com o HV (não confudir com redução de 'demanda'), mesmo assim continuamos a ver inúmeras agências de notícia comunicando expectativas de economia, SEMPRE NO FUTURO! Ou seja, jamais é dito o quanto o HV efetivamente economizou de energia, mesmo porque é impossível avaliar tal economia. Por isso, só o que sempre temos são estimativas, o quanto se pensa que o horário de verão deverá economizar.
Na página do ONS há nenhum resultado conclusivo, mas sim "Expectativas" e "Resultados Preliminares", disponíveis em PDF e PPT, que ainda assim são, na melhor das hipóteses, modestos. Como por exemplo dizer que
"Para o consumidor final, o benefício se traduz, basicamente em se evitar aumento de tarifa." Apesar das tarifas viverem aumentando.
Um resultado conclusivo é impossível por que não temos como realmente saber o quanto gastaríamos no horário normal. Teríamos que ter uma realidade alternativa, ou ao menos fazer um regime de adotar o HV durante anos alternados, para ao fim de uma década comparar os 5 anos em que foi adotado com os que não foi. E mesmo assim, sempre poderíamos ser surpreendidos com mudanças nos hábitos de consumo e nas novas tecnologias.
Lembremos que desde que o HV foi novamente adotado, 1985, muitas coisas mudaram. Nossas lâmpadas deixaram de ser predominantemente incandescentes para se tornar fluorescentes, nosso televisores e monitores de computador de tubos deram lugar a telas de LCD e LED, bem mais econômicas. Mais e mais pessoas estão usando dispositivos de aquecimento solar para a água, e o mais importante, o último racionamento de energia ensinou, a duras penas, o consumidor a economizar. Isso sem contar a onda de preocupação com o meio ambiente que faz as pessoas serem mais cuidadosas com o desperdício de energia.
Nessa Lista de Períodos em que Vigorou o Horário de Verão no Brasil, podemos notar algo interessante. O HV foi adotado de 1931-1933, 1949-1953, 1963-1968, e de 1985 até agora. Portanto, estamos na maior era pró horário de verão em nossa história, 26 anos. Metade da população nem sabe o que é não precisar mudar seus horários todo o ano.
Mas notemos os intervalos entre os períodos onde vigorou, e não vigorou. Após 3 anos vigorando, caiu em desuso por 16! Após mais 4 em vigor, foi abandonado por mais 10! Após 5, foi descontinuado por mais 17! Se houvesse mesmo uma vantagem inequívoca, demoraríamos tanto tempo para adotá-lo novamente?!
Observemos que as tentativas de uso sempre foram problemáticas, com critérios sempre diferentes, mesmo em nosso mais longo período de uso.
E lembremos que, sendo uma estação do ano, o Verão dura aproximadamente 3 meses. Mas o nosso HV dura mais de 4!
Fica então a pergunta: Diante de tão pífios possíveis benefícios, qual será o verdadeiro motivo?
Pra QUEM serve HORÁRIO DE VERÃO?
Não pretendo responder definitivamente. Esse assunto é obscuro demais para ser tratado brevemente. Na verdade, talvez seja o melhor candidato a Teoria da Conspiração séria que exista em nossa sociedade.
É possível que seja mesmo uma mera pressão do empresariado, que lucra não apenas nas áreas de lazer e comércio varejista, mas talvez até mesmo em sua produção industrial, ao não precisar de ampla iluminação ao final do expediente. Ou seja, se há de fato alguma economia, esta é dos empresários. Isso se não adotarem a estranha postura das repartições públicas de manterem todas as luzes acessas em força total mesmo quando a luz radiante do Sol invade todo o ambiente.
É possível também que exista alguma sutileza que favoreça o sistema bancário. Procurei informações mas nada achei sobre o que acontece com as taxas de juros no momento em que uma hora é comida do sistema. Tenho a impressão que, do nada, os bancos lucram uma hora a mais. Mas posso estar enganado.
Fato é que apesar de algumas vantagens, a implantação do HV é na melhor das hipóteses questionável. E não só no Brasil, mas até mesmo em países onde a diferença de iluminação entre as estações é extrema, como se pode ver nas controvérsias do verbete da wikipedia
Daylight Saving Time.
Deste verbete adaptei o seguinte gráfico, que denuncia a controvérsia por si só.
Os países que o adotam atualmente estão em AZUL. Quanto mais longe da linha equatorial, melhor seria a aplicação do HV, apesar de haver vários países no mundo que parecem discordar.
Veja só quem está mais próximo da linha do Equador.
Marcus Valerio XR
7 Novembro de 2011
Adendos de 13 de Fevereiro
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