Tais denúncias pretendem desqualificar todo o movimento progressista, em especial por mostrar que tais financiamentos direcionam-se sempre para políticas que afetam a tradição, costumes, a família ou o valores morais. E o que tais plutocracias têm a ganhar com tais iniciativas? As explicações tradicionais sugerem a desestabilização propositada da sociedade, corrupção das tradições, especialmente a cristã, construção de um Metacapitalismo global ou de uma Nova Ordem Mundial, um governo de alcance planetário quase sempre associado ao Anticristo. Mas há uma explicação muitíssimo mais clara e provável do que qualquer uma das anteriores, que não precisa apelar a seitas místicas secretas com objetivos incognoscíveis, conspirações hollywoodianas ao estilo Arquivo-X, ou profecias apocalípticas arcáicas que já falharam há muito tempo sobrevivendo somente por curiosos artifícios teológicos. É simples. As revoluções dos últimos séculos, sempre de esquerda, deixaram a clara lição de que não é possível, nem mesmo às mais poderosas elites do mundo, bater aberto e de frente contra a classe trabalhadora. A maioria populacional pode ser manipulada, corrompida, confundida ou ludibriada. Mas qualquer tentativa de oprimi-la num nível além do tolerável só pode ter como resultado uma revolta de massas devastadora, capaz de destruir em questão de dias impérios erguidos há séculos. Assim, ocorre a esses setores elitistas a solução óbvia de se infiltrar nesse processo histórico, de modo a minimizar seu impacto, conter os extremismos e, participando de seu desenrolar, manter seus privilégios intocados. Para isso lançam mão da mais elementar lição da Arte da Guerra. Dividir para conquistar!Considero aqui como pertencente à Classe Trabalhadora qualquer pessoa que tenha que trabalhar para viver, ao invés de poder viver somente à base de Ativos Econômicos. Isto é, o trabalhador precisa produzir, sustentar ou servir à alguma coisa, e não apenas manipular valores na especulação financeira. E como dividir a massa trabalhadora? Simplesmente fornecendo privilégios para uns, tentando empurrá-los uma parte contra a outra e fazendo-os gastar demasiado tempo com questões parcialmente relevantes mas que têm como principal objetivo apenas confundir e enfraquecer. Sendo a humanidade heterogênea, sempre é possível encontrar nichos com especificidades, e então explorando essas diferenças, incitar animosidades e subdivisões, realizando o nunca pronunciado mas axiomático ditado: “A Desunião Faz A Fraqueza”. Divididos por raças, religião, preferência sexual ou meramente sexo, espera-se que os trabalhadores briguem entre si, prestem menos atenção às questões realmente primordiais sem as quais o mundo jamais deixará de manter o modelo “minoria numericamente ínfima detendo a maioria economicamente imensa dos recursos”.
Novos SatãsTodas essas iniciativas têm em comum a construção de fantasmagóricos inimigos que precisam ser combatidos a todo custo, mas tal esforço de combate, nada podendo fazer contra meras abstrações, só pode afetar os segmentos populacionais que são relacionados a tais fantasmas. Ataca-se o mito, fere-se as pessoas, e o mito continua intocado, apenas podendo mudar de aparência. Inevitavelmente não pode haver outro resultado do que a divisão dos trabalhadores por meio de categorias que no fundo elas não representam realmente, mas que fatalmente as levará a alguma forma de retaliação, dando início a um clico revanchista, que move humanos reais numa tragédia samsariana girando em torno de miragens. Com elas, inventou-se posturas perspectivas que vêem na pura e simples inércia social, e no fato puramente físico de que melhorar é sempre mais difícil e lento do que piorar, um tipo de conspiração oculta com o objetivo de manter as desigualdades intrínsecas entre os trabalhadores como são. Como se o fato evidente de que os descendentes de etnias mais abastadas ainda carreguem vantagens socioeconômicas por mais que essas venham histórica e comprovadamente diminuindo, seja na verdade implementada por artifícios deliberados que fazem com que qualquer regularidade tola seja um ato consciente e deliberado de manutenção ativa de privilégios, demandando em, contrapartida, ações afirmativas que beneficiam um grupo em detrimento de outros que não necessariamente estão de fato em situação melhor. Também criou-se novas fobias e misonias que fazem com que a estranheza natural das pessoas para com os comportamentos menos comuns seja visto como uma atitude ativa de discriminação e ódio, ligando-as aos casos isolados de ataques reais contra minorias ou segmentos mais fragilizados, e fazendo com que se veja uma conspiração de maiorias ativamente trabalhando na repressão de condutas privadas ou libertárias. Nenhum desses 'satãs' é criado do nada. Todos eles apontam para entes reais que indicam problemas que merecem ser enfrentados, mas todos, TAMBÉM são hiperdimensionados ao ponto de se tornarem não apenas males, mas o maior dos males, e são frequentemente redefinidos para que, mesmo quando as condições históricas esvaziem por completo sua credibilidade, mudem de forma passando a encarnar novas aparências, mantendo-se perpetuamente como um alvo a ser combatido. O Micro pelo MacroAssim, o foco da exploração da classe trabalhadora, que é a esmagadora maioria da humanidade, por uma elite minoritária e indiscutivelmente privilegiada em todos os níveis, é deslocado para elementos secundários. O problema deixa de ser a exploração dos trabalhadores pelos poderosos para ser dos negros pelos brancos, das mulheres pelos homens, de uma nação pela outra e até de homossexuais por heterossexuais. Se isso não for uma ofensiva de uma mega elite bilionária, ao menos funciona muito bem como uma estratégia reativa da direita popular, que com a colaboração espetacular de neo esquerdistas, consegue esvaziar a imagem da defesa da classe trabalhadora e substituí-la por lutas progressistas mais diversas e pitorescas. No Brasil, as últimas décadas de governo foram bem sucedidas em melhorar as condições da vida da maioria esmagadora da população, e sem prejudicar significativamente as minorias privilegiadas. Por esse serviço prestado, a Situação dificilmente poderia, ou deveria, deixar de ser agraciada com a perpetuação. Não existe compra de apoio mais eficiente do que beneficiar efetivamente as vidas dos que mantém a sociedade funcionando. Se esse estado de coisas, ou projetos similares, vierem a perder para projetos mais tradicionais que colocam a defesa incondicional do privilégio das elites acima de qualquer coisa, o será não apenas por ter deixado de atender aos trabalhadores, mas sobretudo por desviar-se disso para atender privilégios de minorias, ou maiorias, em detrimento de outras. A receita certa para o fracasso da esquerda é que ela deixe de ser considerada como a defesa dos trabalhadores, que são a maioria esmagadora, para ser reduzida a defensora do Aborto, da Parada Gay, da Marcha das Vadias ou da Marcha da Maconha. Marcus Valerio XROriginal de Março de 2013
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