DEUS
Se algum desconhecido me perguntar diretamente se eu acredito
em Deus e exigir apenas Sim ou Não como resposta, eu não saberia
o que dizer. Pelo simples fato de que eu não saberia sobre que Deus essa
pessoa estaria falando.
Mas agora, apenas para mostrar o quão complexa é a questão,
verifiquemos o significado de diversas palavras diretamente relacionadas ao
termo Deus.
Palavras secundariamente relacionadas: MONISMO:
Idéia de que todo o Universo pode ser visto através de uma única
substância, reduzido a uma única essência, que pode estar
associado à idéia de Deus e mais aproximadamente de um Deus Panteísta.
DUALISMO:
Concepção de que o Universo é composto fundamentalmente
por duas forças primárias, princípios complementares, substâncias
equivalentes e distintas, que podem se harmonizar ou não dependendo de
suas proporções estarem ou não em equilíbrio. Só
poderiam ser reduzidas a uma, se puderem, num plano transcendente.
MANIQUEÍSMO:
Religião fundada na Pérsia no século III que propunha de
que o Universo é constituído de dois princípios fundamentais
opostos que se repelem e não podem se harmonizar, no caso o Bem e o Mal.
Nome também usado para designar qualquer concepção de Dualismo
desarmônico e conflitivo.
MONOLATRIA:
Adoração centrada num único ponto. Geralmente no Politeísmo,
onde ocorre a adoração de uma só divindade embora não
implique sempre em Henoteísmo. Muitas vezes o foco da adoração
se desloca para uma figura humana, um Governante, Rei, Imperador, ao qual se
atribuem qualidades divinas.
NIILISMO:
Crença que não há qualquer forma de deus, transcêndencia,
ética ou moral superiores. Descrença absoluta.
MATERIALISMO:
Forma de MONISMO onde a substância é a Matéria, reduzindo todo o universo e os
fenômenos a causas materiais.
ESPIRITUALISMO:
DUALISMO onde além da Matéria, haveria uma substância sutil adicional, que constituiria
inclusiva nossa mente, ou parte dela, e um plano imaterial imperceptível pelos sentidos.
FISICALISMO:
Doutrina que visa explicar todos os fenômenos existentes pelo ponto de
vista unicamente físico, sem apelar para qualquer conteúdo Metafísico.
HEDONISMO:
Modo de vida que se ocupa unicamente da busca do prazer e satisfação pessoal.
CETICISMO:
Posição crítica que rejeita alegações sem
uma boa fundamentação e apresentação de evidências convincentes,
principalmente se de caráter extraordinário.
SOLIPSISMO:
Proposição de que o Eu é a única realidade comprovada,
e todas as demais coisas podem ser projeções da mente individual.
EXISTENCIALISMO:
Doutrina que prega que o ser humano é quem determina todos os eventos
a partir de sua própria escolha, sendo totalmente livre para fazer o
que quiser, não havendo qualquer impedimento de ordem divina, moral ou
ética. Nesta concepção a Existência precede a Essência
do Ser, que na verdade é um Não-Ser, um vazio. Creio que este simples glossário possa evidenciar a complexidade dessa
questão que ao longo da história vem sendo abordada das mais diversas
formas possíveis. Há muitas proposições que visam
comprovar ou reprovar a existência de um princípio divino no Universo,
porém, pelo meu ponto de vista, o estabelecimento de uma certeza com
relação a essa questão é praticamente impossível.
Esta frase famosa diz que o fato de não podermos perceber algo não significa que este não exista, isso deveria ser óbvio, todavia inúmeras pessoas declaram a inexistência de algo apenas por nunca a terem experienciado. Significa que não se pode provar definitivamente que algo não exista. Mais provável é o contrário. Eu só preciso provar um único fenômeno para demonstrar que o mesmo existe, mas não tenho como demonstrar sua não existência a não ser negando alegações mal fundamentadas. Exemplificando: Para provar que existe um Coelho Verde basta apresentar um, mas eu não posso vasculhar o mundo inteiro em cada metro quadrado para mostrar que o mesmo não exista em algum lugar. Eu poderia entretando demonstrar que um suposto Coelho Verde seja uma fraude, mas isso mostra apenas que não se provou a existência de tal Coelho, não garante que ele não exista em algum outro lugar. Por essas duas proposições anteriores, fica claro que é mais provável provar alguma coisa, inclusive Deus, positivamente do que negativamente. Entretanto podemos sim demonstrar a inconsistência de determinadas proposições Teístas, principalmente a mais difundida de todas, a Monoteísta Judaíco-Cristã-Islâmica. Para prosseguir nessa abordagem só me resta estebelecer alguns nomes para evitar confusões. A palavra Deus será usada sempre da forma mais genérica possível, não significando então nenhum Deus específico. Quanto aos Deuses das diversas religiões, todos podem ser chamados por nomes específicos, como se segue no caso das religiões monoteístas.
Na maioria dos casos tais nomes não possuem um significado muito específico. ALÁ por exemplo é apenas a palavra "Deus" em árabe, o tetragrama impronunciável YHWH, geralmente corrupetalado para IAVÉ, e do qual decorre a grosseira falha de tradução que resulta em JEOVÁ, significa basicamente "EU SOU". Além do Deus cristão, o bhramane é o único que também possui uma natureza Trinitária. Quando ao Espíritismo Kardecista, ao qual resisto em classificar como
Monoteísta e que apresenta a meu ver uma das mais convincentes proposições
Teístas, ocorre o problema de não haver um nome específico
para a divindade, por tanto sempre me referirei a ela como "Deus Kardecista"
ou algo parecido.
O INSUSTENTÁVEL MONOTEÍSMO TRADICIONAL
DO OCIDENTE
A maioria da população terrestre crê em religiões
Monoteístas, uma vez que Cristianismo, Islamismo e Hinduísmo são
as 3 maiores crenças, totalizando mais 2/3 do número de habitantes
no globo. Como tento demonstrar no texto sobre RELIGIÕES,
os motivos disso são principalmente a maior articulação
teórica do Monoteísmo e sua postura expansiva incisiva.
A crítica que se segue tem como alvo o Monoteísmo Cristão,
e em menor grau o Judáico e Islâmico, não afetando outras
formas de monoteísmo. É importante lembrar que tal crítica
em si não invalida por completo todas as teologias desenvolvidas por
essas religiões, mas apenas aquelas mais disseminadas, o que infelizmente
corresponde a maioria esmagadora. O fato de, diferente da Trindade do Cristianismo,
Judaísmo e Islamismo não aceitarem qualquer subdivisão
da unicidade de Deus, também não é aqui relevante.
O problema desse tipo de Monoteísmo já vem sendo abordado de
várias formas há milhares de anos, e sua mais famosa expressão
é objeto de estudo de uma das partes da Teologia, a TEODICÉIA.
Uma vez que se propõe que JEOVÁ é ONIPRESENTE, ONISCIENTE e ONIPOTENTE,
além de ETERNO e IMUTÁVEL, fica claro que absolutamente nada está
fora de seu poder e conhecimento, sendo assim, por que existe aquilo que esse
mesmo monoteísmo classifica como sendo o Mal?
Por que JEOVÁ criou os anjos e os humanos já sabendo que um deles
se rebelaria e que disso resultaria toda a saga do mundo após a queda
do homem? Se ele não pudesse prever o que ocorreria, então não
seria ONISCIENTE, pois ONISCIÊNCIA absoluta incluiu o conhecimento pleno
do Futuro e do Passado, se ele sabendo não pudesse evitar, não
seria ONIPOTENTE.
Sendo assim é inevitável aceitar que tudo o que ocorre no universo,
inclusive todas as mazelas do mundo, são responsabilidade direta deste
Deus. E não adianta utilizar o velho Sofisma Agostiniano de que o Livre
Arbítrio humano é o responsável pela existência do
Mal, pois isso não remove a responsabilidade de JEOVÁ se ele tem
poder absoluto acima de tudo.
(Este tema é analisado em detalhes na monografia
DEUS ME LIVRE (2003), onde faço uma análise sistemática
da obra 'O Livre Arbítrio' de Santo Agostinho.)
Na realiade sequer existiria Livre Arbitrio, pois todo o destino já
estaria traçado dentro da "mente" de JEOVÁ, e os humanos e mesmo os anjos
não teriam poder para alterá-lo, portanto tudo o que fazemos não
é realmente resultado de nossas vontades e escolhas, mas sim, é
predeterminado por JEOVÁ.
Além disso, um Livre Arbítrio que exige uma conduta específica
que do contrário resultaria numa pena severíssima, é um falso
Livre Arbítrio.
O problema porém surge quando se propõe um dos pontos chaves
e clássicos da Doutrina Cristã, o da Justiça Divina, que
se relaciona com a premiação e punição dos Anjos
e Humanos devido as suas escolhas. Em geral a SOTERIOLOGIA, parte da Teologia
que estuda a doutrina da salvação, compartilha a visão
do julgamento divino e da sorte diferenciada dos seres, onde alguns receberão
o gozo perpétuo e outros a aflição perpétua.
Fica impossível contestar o fato de que então, desde o princípio,
JEOVÁ planeja, cria, dá a vida, e dá como destino a bilhões
de seres humanos um indizível sofrimento infinito num plano existencial
infernal, deliberadamente. Não há como negar que Ele é
o responsável por tudo isso. Portanto:
JEOVÁ CRIA HUMANOS PARA SEREM LANÇADOS NO INFERNO INTENCIONALMENTE
SEM QUALQUER POSSIBILIDADE DESTES EVITAREM ISSO.
Esta á a Doutrina da PREDESTINAÇÃO, proposta inicialmente
pelo protestante João Calvino, e que influencia a maior parte das designações
protestantes cristãs. Afirma que JEOVÁ cria o Ser Humano e lhe
concede Livre Arbítrio, mas já sabe de antemão quais serão
as escolhas dele e qual será seu destino. Sendo assim, bem poderia não
tê-lo criado, ou o criar com um natureza diferente, um Livre Arbítrio
inclinado para a salvação. Se ele não puder fazer isso, não será Onipotente.
O FATOR LÓGICO
Até aqui na verdade, não há de fato nenhuma contradição
lógica em si, mas já fica impossível atribuir a JEOVÁ
qualquer conceito de Justiça e Bondade humanamente aceitável.
Ou seja, pelos parâmetros humanos, JEOVÁ é infinitamente
Cruel!
Tentando atenuar isso, já se produziram várias Teodicéias
que em geral não encontram outra solução que estabelecer
um Dogma que afirma a impossibilidade de se compreender o desígnio divino,
ou que tenta relativizar o conceito de Mal, ou então romper com a Soteriologia
tradicional do Cristianismo.
Se aceitarmos o Dogma da Incognoscibilidade, colocamos a Teologia em xeque.
Ela seria uma atividade inútil. De nada valeria então toda a nossa
elaboração teórica para compreender as revelações
divinas. Dessa forma, todas as doutrinas perdem sua base como atividade humana,
inutiliza-se então a religião como algo praticável, pois
tudo estaria apoiado sobre algo que afinal não compreendemos em essência.
Por que então haveria a revelação? Se esta não pode
ser compreendida. Para quê Leis trazidas por profetas? Se nada do que
fizermos mudará nosso destino. Toda a religião não passaria
de um engodo, um abissal amontoado de supertições.
Pode-se no máximo argumentar que os Dogmas ocupam apenas alguns aspectos
da doutrina, ainda que os mais importantes, mas fica inegável a característica
de irracionalidade, ainda que com o nome de Fé ou Graça, e a constatação
que toda a demais teologia compreensível é no máximo um
passatempo sem qualquer valor prático.
Se aceitarmos a relativização do conceito de Mal, como entender
que na realidade não exista o Mal em si, e sim apenas uma ilusão,
então os preceitos clássicos da religião ficam abalados.
Não haveria então o pecado, e sem o tal nem mesmo qualquer forma
de punição, ou mesmo sofrimento. O próprio Inferno seria
ilusório assim como o sofrimento. Isso retira por completo a força
argumentativa da doutrina.
A única saída a meu ver, será como veremos mais adiante,
romper com certos estabelecimentos tradicionais do Cristianismo.
Mas a grande contradição não está na verdade, nesse
conteúdo emotivo da doutrina, que coloca a existência de todas
as desgraças, todos os sofrimento, como sendo resultado da ação
direta, intencional e plenamente consciente de JEOVÁ.
A contradição está na verdade na alteração
de estado da criação em relação aos atributos de
IMUTABILIDADE e ETERNIDADE divinas.
É inegável que o Universo logo após a criação
é diferente do que virá logo após o Dia do Juízo.
Ou seja, há duas realidades distintas completamente diferentes separadas
por um certo intervalo de tempo.
Se esse Deus é então ONIPRESENTE a toda a sua criação,
é inegável que ele se relaciona com a mesma, então como
poderia ele ser IMUTÁVEL?
Simplificando, se JEOVÁ é ETERNO e IMUTÁVEL, ou seja,
pleno em todas as suas perfeições, por que então ele criaria
um Universo temporal que é mutável? Não se pode produzir
algo intencionalmente sem um propósito, qual seria então o proposito
de um SER absolutamente perfeito?
Qual a função da Criação? Se nada falta a JEOVÁ?
Se a Criação tivesse apenas um objetivo em si própria,
o papel então de sua expressão máxima, o Ser Humano, deveria
ser muito mais independente da natureza divina do Deus. Então por que
não permitir a este Ser Humano uma verdadeira liberdade de ação
em um Universo que só tem sentido para ele próprio?
Como aceitar que o JEOVÁ da recém criação, que
convive, intereage, delega, e se relaciona apenas com seres quase perfeitos,
os anjos, num universo perfeito, o mundo recém-criado, e o primeiro casal
ainda no Éden, seja o mesmíssimo JEOVÁ que convive, interage,
delega e se relaciona com um universo onde há uma parte da humanidade
vivendo no Paraíso, e parte sofrendo no Inferno, incluindo um ou dois
terços dos anjos no lago de fogo e enxofre, seres que antes foram quase
perfeitos?
Fazendo a comparação, uma pessoa que vive numa belíssima
casa não o faz da mesma forma que se vivesse numa casa de péssimas
condições, suas impressões, sentimentos, atitudes, mudariam,
ela mudaria, a não ser que ela ignorasse por completo a casa. Da mesma
forma a não ser que JEOVÁ ignorasse por completo sua criação,
não há como aceitar que sendo o Universo uma expressão
de seu poder, irá existir em tempos distintos de formas tão distintas,
sem afetar de alguma forma as caracteristicas deste Deus.
Sintetizando:
SE JEOVÁ EXISTIA ETERNAMENTE ANTES DA CRIAÇÃO, E ENTÃO
DEU ORIGEM A UMA CRIAÇÃO, ENTÃO NÃO É IMUTÁVEL,
SUFICIENTE EM SI MESMO, E PERFEITO.
A SOLUÇÃO PARA O IMPASSE
Esse problema já era exposto desde os primórdios do Cristianismo,
e uma de suas formas era com a pergunta: "O que Deus fazia antes de criar o
Universo?"
Seria ingenuidade crer que isso é suficiente para neutralizar a teologia
cristã. Com quase dois mil anos de elaboração e tendo em sua
tradição brilhantes mentes ao longo da história, não
são simples perguntas e raciocínios aparentemente inescapáveis
que irão demolir a trabalho milenar de filósofos que remontam
até o helenismo.
As duas contradições citadas acima, entre os ONI atributos de
JEOVÁ e o Livro Arbítrio, e entre a Imutabilidade e a criação
temporal, costumam receber o nome de ANTINOMIA, um paradoxo que só pode
ser aceito pela fé.
Orígenes de Alexandria, no século II dC, já
propunha uma resposta que, infelizmente, jamais foi muito aceita na doutrina
cristã. Trata-se da APOCATÁSTASE
(Restauração), ou UNIVERSALISMO, também
conhecida como ORIGENISMO.
Segundo essa proposição, ao final de todos os eventos apocalípticos
previstos nas escrituras, todo o Universo seria revertido ao estado de perfeição
original. Essa restauração eliminaria todas as divisões,
inclusive entre o Inferno, a Terra e o Céu, e todos os seres seriam reintegrados
à divindade. Enfim, mesmo Satan seria perdoado.
Com essa idéia, e acentuando essa reversão, a Criação
seria desfeita até o estado onde antes só houvera JEOVÁ
e o vazio. Tendo isto, fica aberta a idéia de que a Criação
poderá ocorrer novamente da estaca zero, para depois ser encerrada de
novo, e de novo. É evidente de que houveram infinitas criações
anteriores e haverão posteriores. Sendo assim, o Universo seria infinitamente
criado e desfeito, num ciclo eterno.
Essa idéia elimina o problema da contradição entre a existência
eterna, perfeição e imutabilidade divina, e a criação
temporal isolada no tempo. Pois deus recriaria o Universo incessantemente, e
esse ciclo faria parte de sua natureza, essa constante atividade estaria inclusa
na sua imutabilidade, que não seria um estado em si, mas um processo
imutável.
Essa idéia é parte integrante de duas outras religiões
monoteístas. O Bhramanismo e o Shikismo indianos, e abre espaço
para várias outras elaborações, inclusive a que permite
uma maior veracidade do Livre Arbítrio.
A APOCATÁSTASE exige também um conceito que embora não
maioritário na doutrina cristã, é de bem maior aceitação,
o ANIQUILACIONISMO, que diz que os condenados ao Inferno não sofrerão
perpétuamente e sim serão aniquilados, deixarão de existir
após um certo período de tempo. Algumas designações
cristãs como os ADVENTISTAS DO 7o
DIA e os TESTEMUNHAS DE JEOVÁ
são adeptos dessa doutrina.
Porém é muito grande a insistência das maioria das teologias
cristãs em manter um doutrina completamente insustentável racionalmente,
o da Punição e Graça Pérpetuas.
PUNIÇÃO "ETERNA"
A crença no tormento eterno para os infiéis é uma das
mais notáveis, marcantes, incômodas, e sem dúvida a mais
execrável de todas as proposições das teologias monoteístas
tradicionais.
Ela elimina qualquer possibilidade de se defender a idéia de que JEOVÁ
seja um ser bondoso, amoroso ou piedoso em qualquer parâmetro humanamente
compreensível. Pior, ela torna impossível defender a idéia
sequer de que Ele seja um ser Justo e Inteligente.
Isso pode ser facilmente demonstrável por uma alegoria. Sabemos que
os delitos podem ser punidos com penas diferentes de acordo com a gravidade
da infração, como por exemplo:
O Roubo de um pão: - 1 Dia de prisão
Crime Hediondo Brutal: - 50 Anos de prisão.
Está implícito que de certa forma, o Crime Hedindo Brutal é
cerca de 18.262 vezes e meia mais grave que o roubo do pão, pois para o mesmo
é aplicado 50 x 365,25 dias de prisão. Isso sem dúvida é
algo que podemos considerar como justiça pelos parâmetros humanos,
ainda nos padrões do senso comum.
Seria justo porém, que a punição para os dois crimes acima
fosse a mesma?
Se considerarmos que não, então não temos como aplicar
qualquer concepção humana de justiça à idéia
de "Punição Eterna", pois pela maioria das teologias convencionais,
não são apenas os mais hediondos e brutais crimes imagináveis
que serão punidos com o tormento infinito.
Segundo o Islamismo, uma pessoa, por mais íntegra, caridosa, sensível
e justa que seja, será atirada ao ignominioso castigo interminável
se simplesmente não acreditar na existência de ALÁ. Segundo
a Teologia da maior parte das designações protestantes, a mesma
pessoa terá o mesmo destino se não aceitar o dogma de que todos
os humanos são inerentemente pecadores e só se salvam pela fé
em Jesus Cristo.
Por outro lado, mesmo após praticar crimes extremamente terríveis,
o indivíduo poderia obter a Graça Infinita se realizar sua conversão
e abraçar a fé.
Dessa forma, se torna possível igualar um Ser Humano que só cometa
um leve delito, ao mais horrendo dos psicopatas de todo os tempos. Ao mesmo
tempo que esse psicopata extremo possa ser subitamente igualado ao mais louvável
dos Seres Humanos, se ele cumprir, ao final de toda uma vida de crimes, as exigências
de uma conversão religiosa.
Se considerarmos praticamente todos os parâmetros humanos de justiça,
é impossível considerar justos esses procedimentos de punição
e premiação, entretanto ainda podemos apelar para o super relativismo,
de que tais parâmetros de justiça não são humanos,
ou ainda os inúmeros recursos racionais possíveis para se fazer
valer um ponto de vista específico contra os tradicionais pontos de vista
da ótica humana.
O único ponto entretanto que não pode ser superado pela razão
é o conteúdo "Eterno" desta Punição ou Salvação
divinas. Esse peculiar elemento torna a doutrina racionalmente incompreensível.
Trata-se da incoerência lógica de se relacionar diretamente um
evento temporal com um evento supra temporal, "Eterno". Como veremos a seguir.
(Deve-se considerar, porém, que a graça divina não se relaciona à idéia de justiça retributiva, mas
simplesmente à escolha de certas qualidades psicológicas presentes ignorando o contexto passado. Ora,
uma pessoa pode cumprir integralmente a pena para um crime que cometeu, e continuar disposta a praticá-lo. A punição não garante a purificação. Por outro lado, alguém pode jamais ser punido por um crime
mas terminar por se aperfeiçoar interiormente até o ponto de jamais ser capaz de cometê-lo de novo. Ou seja, as
pessoas podem mudar, e essa mudança é difícil de ser prevista, e quase nunca poder ser forçada.
Infelizmente, a maioria dos cristãos e seus brados por "justiça divina" não ajudam a ver a questão
dessa forma mais promissora. - Adendo de 11/11/11)
O TEMPO E A ETERNIDADE O próprio termo "Punição Eterna" já é contraditório. 'ETERNO' significa o que está "fora do tempo", não tendo tido começo nem fim, 'PUNIÇÃO', por outro lado, é um conceito claramente temporal, algo que se aplica a partir de um determinado momento devido a um evento ocorrido na linha do tempo. Portanto o termo correto na verdade seria PUNIÇÃO PERPÉTUA, pois Perpétuo é o que mesmo tendo início não teria fim, o que acrescenta um problema talvez ainda maior, pois sendo o Perpétuo uma espécie de "Metade de Eternidade", como compreender a idéia de que a Eternidade permita ser dividida? Faria sentido dividir o infinito? A idéia do Perpétuo, ou do "Retro-Perpétuo", que seria o que nunca teve começo mas teria fim, seria então equivalente a Eternidade? Ou aceitaríamos a "Meia-Eternidade"? Antes de observarmos a ilustração abaixo, é bom lembrar que a idéia de que o ETERNO possa ser representado por uma Linha de Tempo Infinita é em si errônea. O ETERNO não seria um "tempo" interminável para o passado e para o presente, mas sim uma ausência de tempo. Porém na impossibilidade racional de se trabalhar com esse Não-Tempo, usemos enfim a ilustração na forma de "Tempo Infinito".
Até agora não vimos um meio de driblar esse paradoxo da "Semi-Eternidade", que caracterizaria o Perpétuo, mas o mais importante no momento é compreender a diferença desses conceitos com o conceito Temporal. Tudo o que existe no tempo, só pode ser relacionado com outras coisas temporais, a relação direta entre o temporal e o Eterno ou Perpétuo é como já vimos, no mínimo duvidosa. Sabemos que tudo o que existe no nosso plano temporal não pode perpetuar-se indefinidadamente. É preciso antes de tudo se livrar da idéia de que o Perpétuo seria um período de tempo muito grande, não é, seria uma forma de escapar do Temporal. Se imaginarmos que existe um tipo de "barreira" entre o Eterno e o Temporal, perceberemos que nada temporal pode adentrar a "Dimensão do Eterno", o que passou a existir não pode se tornar ETERNO, isso é completamente absurdo. Isso nos leva então a duas possibilidades: Se o PERPÉTUO equivaler ao ETERNO, no sentido de que metade de Infinito continua sendo Infinito, então nada temporal pode se perpetuar infinitamente, portanto, a idéia de que algo temporal possa ser de um modo ou de outro "eternizado" é insustentável. O temporal não pode se tornar ETERNO, portanto nesse sentido, Punição Perpétua seria o mesmo que Punição Eterna, ou seja, uma contradição. Se o PERPÉTUO pertencer a uma dimensão diferente do ETERNO, resta então verificar a viabilidade de tal possibilidade. O PERPÉTUO como algo em especial, diferente do Temporal e do Eterno. Consideremos o seguinte esquema:
Podemos notar que em relação aos TEMPORAIS, um PERPÉTUO é como um ETERNO, a não ser que sua interrupção ocorra dentro do período decorrido do TEMPORAL. Mas o detalhe é que se existe o Perpétuo FUTURO, porque não existiria o Perpétuo PASSADO? Ou Retro-Perpétuo? Seria válido considerar apenas o "sentido" PASSADO-FUTURO como passível de produzir PERPÉTUOS? O que impediria que algo tivesse pré-existência Perpétua e então cessasse de existir? Se for esse o caso, então a criação de Perpétuos se daria ao infinito, porém jamais fariam parte do ETERNO. Para os temporais entretanto equivaleriam ao ETERNO. A questão de se o Perpétuo é possível, é no mínimo duvidosa. Mas como ficaria o Retro-Perpétuo? Como poderia ser desfeita um coisa que sempre existiu no Passado? É evidente que o problema em si está fora do escopo da razão humana, mas podemos apresentar possibilidades. Uma delas é a de que não existiria o Perpétuo em si, mas o SUPER TEMPORAL. Esse estaria acima dos temporais normais para os quais equivaleria ao ETERNO, ou seria Perpétuo caso sua interrupção se desse no decorrer desse temporal. Sendo assim o Pérpetuo e o Retro-Perpétuo formariam um Super Temporal. Outra é considerar que exista uma "dimensão" diferenciada para o Perpétuo, o que o tornaria possível, porém isso acrescenta um discussão ainda mais complicada. Uma vez que os Perpétuos podem ser criados, eles iriam aumentar incessante e exponencialmente o "conteúdo" de existência? Como um Universo se expandindo indefinidamente? Ou o fim dos Retro-Perpétuos compensaria? Sendo assim, a não ser que o ETERNO não se relacione como os demais Universos, como manter sua característica de IMUTABILIDADE? Além de tudo isso, observe como uma diagramação diferenciada, circular, do esquema parece tornar a característica do Perpétuo ainda mais desafiadora.
Nesse caso fica claro que no Eterno, no centro, não há movimento, ao contrário do Perpétuo onde ocorreria um ciclo fechado de movimento, aparentemente com eventos repetitivos. Os Temporais e Super-Temporais seriam ciclos abertos. Outra forma de visualizar a questão seria:
Colocando o Eterno num plano "externo" à dinâmica. Na melhor das hipóteses, essas possibilidade desafiam a concepção cosmodinâmica do Monoteísmo Tradicional, acrescentando problemas e mais problemas de racionalidade cuja única saída satisfatória seria aceitar os Dogmas incognoscíveis. Mas sendo assim, porque aceitar como dogma a possibilidade de existência do Perpétuo e não sua impossibilidade? Além disso há o problema da categorização do estado de ETERNIDADE. No Eterno, ou no Perpétuo, não existe movimento, pois não existe tempo e logo espaço. Não há dinâmica, mas sim uma essência, pode haver um SER, nunca um DEVIR, ou este não seria imutável, e logo estaria fadado a transformação, e invariavelmente ao fim. Sendo assim, como aceitar conceitos tão necessariamente dinâmicos
como Sofrimento ou Gratificação num plano que sendo Perpétuo,
iria invalidar tais estados de movimento? Seria mais fácil crer num plano
de "congelamento" da existência, onde sequer haveria consciência
do acontecimento.
CONCLUSÃO
Sendo assim, a idéia de uma Punição ou Premiação
Perpétuas é inaceitável tanto Ética, Moral, Emocional
ou Lógica e Racionalmente. É, pois, sendo empurrada na forma de
Dogma, uma forma arbitrária de forçar um coquetel de conceitos
como se fossem um único, quando este em si não possui qualquer
sentido.
Dessa forma, admite-se que a Teologia Monoteísta Tradicional é
indefensável racionalmente, assumindo um caráter de irracionalidade,
o que não necessariamente ocorre com outras possibilidade Monoteístas
como a cíclica, ou Panteístas.
A questão é: SE ESSE MONOTEÍSMO TRADICIONAL É INCOERENTE
TANTO EMOCIONAL QUANTO RACIONALMENTE, E SE NÃO APRESENTA QUALQUER EVIDÊNCIA
MATERIAL, POR QUE ACEITÁ-LO?
Baseando-se apenas na autoridade de um Livro Sagrado? Que sequer conseque provar
ser a Palavra de Deus. Porque crer numa proposição que se baseia
unicamente numa obra literária sem acuidade racional, de cunho ético
e moral discutível e claramente cultural, e que comete flagrantes erros
na concepção do mundo físico?
Por tudo isso considero que a adição de soluções
como a APOCATÁSTASE e consequentemente o ANIQUILACIONISMO, longe de serem
prejudiciais à crença, fazem é elevar em muito sua qualidade
argumentativa, tornando-as competitivas racionalmente e emocionalmente com doutrinas
bem mais elaboradas.
Bastante diferente é a concepção Panteísta de divindade. Trata-se de considerar que Deus é o
próprio Universo, a Natureza, de modo que ele estaria em toda parte. Sendo assim, Deus seria
um ser Físico, Dinâmico, Perpétuo ainda que sujeito a mudanças cíclicas. Deus seria então,
IMANENTE à Natureza, intrínseco, ou seja, não Transcendente.
|