Universidade de Brasília, Abril de 2004
Departamento de Filosofia
Disciplina de Tópicos Especiais em Filosofia Política / Seminário de Filosofia
Professor: Rodrigo Dantas








DINHEIRO É TEMPO
"SE TEMPO É RELATIVO, DINHEIRO TAMBÉM"

OU

"'TEORIA' DA RELATIVIDADE MONETÁRIA"
Aproximadamente 26,5 mil caracteres (sem espaços).







Marcus Valerio XR
FREE MIND!!!
www.xr.pro.br
Graduando em Filosofia
Matrícula: 02/98255



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INTRODUÇÃO

Teoria da Relatividade Monetária? O que falta agora? Economia Quântica?

É evidente que se trata de uma alegoria, mas não desprovida de certo conteúdo, pois se o Século XX viria demonstrar a relatividade de uma das noções tidas como mais constantes na natureza, o Tempo da Física Newtoniana, a evolução do Capitalismo viria a demonstrar incríveis decorrências da geração espontânea de dinheiro por meio das taxas de juros.

Sendo o Capital Bancário criado basicamente pela indexação de um valor arbitrário a um certo período de tempo, temos que tal relação pode ser definida nos mais diversos parâmetros, gerando amplas diferenças no modo como o tempo afeta o capital de empresas, bancos, investidores e correntistas comuns.

Para as instituições financeiras, Tempo sempre é Dinheiro, ou seja, quanto mais o tempo decorre, mais se valorizam seus créditos, para o cidadão comum, ocorre o inverso. O mesmo Tempo que aumenta o lucro dos bancos, desvaloriza o dinheiro da classe trabalhadora. Para o trabalhador, atrasar o pagamento de uma conta resulta em prejuízo, para a maior parte das empresas também, porém o atraso no recebimento, mesmo para as empresas, não resulta em qualquer benefício, mas simultaneamente, para as instituições financeiras, esse mesmo tempo é como mágica, promovendo a reprodução espontânea de seu capital.

Esta monografia pretende explorar algumas correlações e analogias a respeito desta Relatividade Temporal na Economia, com a Relatividade Temporal Física, comparações bastante inspiradoras, e que não se limitam somente ao Capital Financeiro, uma vez que o Tempo é o referencial comum e intrínseco ao trabalho humano, o ponto em comum de toda e qualquer mercadoria ou serviço.

O teor do trabalho, não obstante, não pode negar uma verve poética, e portanto algumas divagações mais ousadas podem ser inevitáveis. Entre elas a comparação com um dos mais bizarros resultados da Teoria da Relatividade, os Buracos Negros, com a idéia de que certos núcleos de hiper acumulação de Capital tenderiam a gerar na economia colapsos financeiros equivalentes às possibilidades de aniquilação do Universo e seu congelamento no Tempo.

Por fim, pretendo ainda nesse mesmo viés, oferecer uma resposta à questão central da disciplina em curso, proposta pelo professor Rodrigo Dantas, que é explicar porque ocorre um certo "bloqueio" de tentativas emancipatórias mesmo em pessoas que tem plena consciência dos problemas resultantes do Capitalismo, e das prováveis vias de sua superação histórica.

Marcus Valerio XR
Maio de 2004

ÍNDICE

INTRODUÇÃO E ÍNDICE
O QUE É TEMPO?
TEMPO É DINHEIRO?
A GERAÇÃO ESPONTÂNEA DE DINHEIRO
DINHEIRO É RELATIVO
O COLAPSO DO UNIVERSO FINANCEIRO
RESPONDENDO À PERGUNTA
BIBLIOGRAFIA

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Segunda Página
Terceira Página
Quarta Página
Quinta Página
Sétima Página
Nona Página
Décima Página
Décima Primeira Página

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O QUE É TEMPO?

Não é fácil imaginar modo mais difícil de iniciar uma dissertação do que lançando uma pergunta para a qual milhares de anos de Mitologia, Física e Metafísica não parecem ser suficientes para tratar. É no entanto uma pergunta crucial ao tema proposto, e que não pode ser negligenciada. Mas uma vez que este não é um tratado de assunto obscuros, a solução é propor uma definição que melhor se adeque ao ponto de vista que a Ciência Contemporânea tem adotado sem contudo se distanciar demais de uma noção popularmente consensual.

Após a Teoria da Relatividade, chegou-se a conclusão talvez tardiamente óbvia de que Tempo não pode ser dissociado de Espaço. Não há mudança no Espaço sem mudança de Tempo, e vice-versa. Mas isso não é importante para nosso propósito, e sim a noção de Relatividade.

Adicionando mais uma à sua já vasta lista de noções anti-intuitivas, a Ciência do "saudoso" século XX, violou o senso-comum ao afirmar que o Tempo não transcorre de forma Universal, mas sim pode correr mais "rápido" ou mais "lento", por mais contraditório que isso possa parecer, dependendo de certos parâmetros.

Não fosse possivelmente a influência da Ficção Científica e sua recorrente temática da "Viagem no Tempo", seria bem mais trabalhoso traduzir essa idéia em linguagem não especializada, apesar dos inúmeros equívocos que freqüentemente ocorrem. E contando com o fato de que tal noção não mais está em dúvida no meio acadêmico e científico, já tendo sido demonstrada em diversas experiências com relógios de alta precisão, espero que fique já estabelecida essa primeira premissa: O Tempo é Relativo.

Isso significa, entre outras coisas, dizer que na superfície do Sol, e tempo passa mais devagar que na superfície da Lua, e que mesmo no térreo de um edifício o tempo decorre mais lentamente do que no último andar, apesar de, é claro, tal diferença ser desprezível até mesmo para as aplicações práticas mais acuradas.

Portanto, esse é o Primeiro fator que afeta a passagem do Tempo, a Gravidade.

O Segundo Fator é a Velocidade. Ainda que isso seja estranho, uma vez que a definição de velocidade nada mais é do que Espaço Percorrido em um determinado período de Tempo. O resultado inegável da aplicação da Teoria da Relatividade é que quanto mais rapidamente um sistema se move, mais lentamente o tempo em seu interior decorre, em relação a um sistema que se mova mais devagar. Portanto, quem está viajando de avião, principalmente se no sentido equatorial correspondente à rotação da Terra, está submetido a uma passagem de tempo menor, e fica literal e comprovadamente "menos velho" do que quem está parado.

Mais uma vez, o resultado é desprezível até mesmo para as pessoas que estejam acostumadas a lidar frequentemente com extremos de velocidade, como os tripulantes de naves espaciais e aviões supersônicos.

Portanto, para resumir todo esse capítulo, o Tempo é Relativo, sendo afetado principalmente pela Velocidade, e pela Gravidade.

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TEMPO É DINHEIRO?

Muitos poderiam achar que a pergunta agora deveria ser, "O que é Dinheiro", mas considerando que esta monografia atende principalmente a um objetivo acadêmico de Filosofia Marxista, e tendo em vista seu direcionamento, me darei ao luxo de pressupor que quem a lê já tenha uma visão ao menos razoável da natureza do Dinheiro.

Isso não impede que reflexões sobre o mesmo sejam lançadas, e esta é a primeira, a noção de que talvez essa máxima, diz a lenda, popularizada pelos comerciantes e negociantes, fosse mais precisa se dissesse o inverso: Dinheiro é Tempo.

Por dois motivos. Primeiro, porque é mais natural e espontâneo definir o elemento mais novo pelo mais velho, e não posso esperar outra coisa que aceitação ao afirmar que a idéia de Tempo é mais antiga que a de Dinheiro.

Segundo, porque sendo o Dinheiro uma referência de troca para mercadorias e serviços, e convenhamos, muito mais eficiente que o escambo, ele precisa ter algo em comum com qualquer coisa com a qual se relaciona. E o que poderia haver em comum com um raríssimo diamante, um automóvel, um refrigerante em lata, uma aula de piano e uma lavagem de roupas? Apenas o fato de que tudo é resultado de trabalho humano, e que tal trabalho pode ser quantificável no tempo.

Portanto, todo e qualquer tipo de produto ou serviço é resultado da atividade humana, que consome um determinado período de tempo para ser executada, quer seja uma lavagem de roupas, ou os esforços necessários para procurar, escavar e refinar um diamante. E prefiro aqui não me alongar na interposição de que nem sempre uma pedra preciosa despende para ser encontrada um esforço e tempo equivalentes ao seu valor econômico, bem como em outros resultados dos fetiches mercadológicos.

De qualquer modo, tomemos como ponto de partida que toda a base de sustentação de nossa civilização pressupõe trabalho, no Tempo.

Uma forma alternativa e até mais óbvia de chegar a essa conclusão é observar que em nosso cotidiano atual a forma mais prática de se quantificar o valor de nosso trabalho é a temporal, visto que recebemos por "horas trabalhadas". Mais revelador ainda quando consideramos os serviços que não implicam em nenhum tipo de matéria prima tangível e significativa, cujo custo é mensurado apenas pelo gasto de tempo necessário.

Logo, ao calcularmos quanto Tempo iremos levar para executar determinada tarefa, e baseados nesse cálculo oferecemos nosso preço, estamos nada mais que declarando que Dinheiro é Tempo.

E, para finalizar, lembremos que tal noção é tão aparentemente universal e inevitável, que a ninguém parece ocorrer que ela por si só implique em injustiça, pelo menos à medida em que quanto mais Tempo mais Dinheiro, estando geralmente as insatisfações mais relacionadas à questão de "quanto" deve ser cobrado por hora, eu se tal ou qual condição momentânea, como uma situação de emergência onde não se está em boas condições de negociar, é mesmo relevante para justificar tal ou qual custo adicional.

E é sobre esta temática de uma ao menos aparente arbitrariedade de correlação Tempo e Dinheiro que se desenvolve a idéia subsequente.

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GERAÇÃO ESPONTÂNEA DE DINHEIRO

Espero não ser difícil concordar que é bastante aceitável pressupor que um serviço seja cobrado de acordo com seu consumo de tempo, uma vez que se está a realizar alguma coisa em troca do empenho de existência humana numa atividade específica. O mesmo Tempo que poderia ser usado para o lazer ou descanso será empregado para realizar tal tarefa, e isso justifica que a mesma seja remunerada.

Por outro lado, menos fácil é aceitar o modo arbitrário como períodos de tempo que ao menos diretamente não envolvem trabalho possam justificar aumento de "valor", acarretando em aumento de preço. O mais famoso deles é aquilo que me parece ser menos dito do que deveria, que a alma do Capitalismo atual é o Juros.

Para entender certas nuances da idéia de Juros, nada melhor do que o mito do primeiro banco.

Tal estória diz que num certo reino, onde havia muitos ladrões, um homem já relativamente poderoso teve a brilhante idéia de oferecer um serviço de segurança para o dinheiro ganho honestamente pelos cidadãos. Ele criou então o primeiro Banco. Neste, os cidadãos depositavam seu dinheiro, que ficava protegido por guardas bem armados. Sendo este hipotético primeiro banqueiro um cidadão de idoneidade comprovada, todos confiavam em seu serviço, e é claro pagavam uma certa taxa periódica pela proteção ao mesmo tempo que mediante comprovantes nominais podiam reclamar seu dinheiro de volta a qualquer momento. Digamos então que para um mês de serviço para guardar 30 moedas de ouro, o banco cobrava uma dessas moedas, e para o correntista era melhor tal custo do que correr o risco de perder todo o seu dinheiro para os malfeitores.

O negócio se sucedia com muito sucesso, e logo não foi difícil notar que a maior parte do dinheiro ficava depositado a maior parte do tempo. Sendo assim, embora não lhe fosse pertencente, uma elevada quantia monetária estava sempre em "poder" do banqueiro, de modo que fora natural a idéia de que ao menos temporariamente aquela quantia lhe estava disponível. Podemos então imaginar o hipotético e sugestivo diálogo.

Requerente: Estou com dificuldades financeiras, preciso de uma certa quantia de dinheiro com urgência! Você tem muito dinheiro à sua disposição senhor Banqueiro, não poderia me emprestar algum?
Banqueiro: Mas... Esse dinheiro não é meu! É de meus clientes!
Requerente: Sim! Mas eles nunca o tiram totalmente. Você pode me emprestar uma boa quantidade e eu lhe devolverei antes que sequer alguém perceba.
Banqueiro: Pensando bem... Você está certo. Posso emprestar uma certa quantia. Mas isso implica num certo risco, portanto isso terá um preço. Eu empresto X, e você daqui a um mês, me devolverá 10% a mais.

Neste momento, nasceria o Juros. A idéia da transformação literal de Tempo em Dinheiro, sem envolver diretamente nenhum tipo de trabalho humano. Um certo período de Tempo simplesmente se transforma em Dinheiro, arbitrariamente.

De acordo com a situação, o credor pode definir sem qualquer critério físico o quanto vale cada instante de tempo, de modo a aumentar a dívida cumulativamente pelo simples decorrer da queda da areia na ampulheta. Mais uma vez, e agora de modo ainda mais dramático, Dinheiro é nada mais do que Tempo!

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Outra forma de entendermos isso é mediante uma pequena fórmula, tão simples quanto as famosas M-D-M' e D-M-D' de Marx, cuja última pode ser interpretada como uma expressão de como o Dinheiro usa a Mercadoria para se multiplicar.

Mercadoria todavia pressupõe tempo, e então o Capitalismo usa Tempo para se expandir.

Os procedimentos então poderiam ser expressos da seguinte forma:

Nas relações comerciais pré-capitalistas, temos:

TRABALHO (Mercadoria/Serviços)
DINHEIRO (Tempo)

TRABALHO

Ou seja, para se estabelecer um parâmetro de trocas, o trabalho é convertido em Tempo, que é traduzido em Dinheiro, Moeda, e assim realiza-se o comércio.

Nas primeiras relações Capitalistas, temos:

TEMPO
TRABALHO

DINHEIRO

Onde passa-se a usar o Trabalho, e consequentemente o Tempo, para se "produzir" Dinheiro. Vemos que até aqui, permanece uma relação direta entre o Dinheiro e o Trabalho, de modo que cada Capital produzido tem alguma correspondência com trabalho, serviço ou produção realizada. Desta forma, o Dinheiro ainda é um representante relativamente legítimo do trabalho humano.

Porém, com o advento do Capitalismo financeiro, os Juros bancários, temos:

TEMPO
Trabalho

DINHEIRO

Ou seja, o Trabalho é dispensado, e o Tempo é convertido diretamente em Dinheiro, e este passa a não mais ter uma representação legítima no mundo real. Tornando-se um ente Virtual, pode assumir comportamento análogo ao dos entes digitais, inclusive se multiplicando de forma ilimitada, não estando limitado pela realidade material.

Mais Dinheiro pode ser literalmente inventado, sem custo inicial, e só posteriormente passa a provocar o efeito descendente de se converter em mais mercadoria e trabalho. Ocorre então uma desproporção entre o valor virtual e o patrimônio econômico real, em outros termos Inflação.

A conseqüência mais grave, é que sistemas que nada produzem podem aumentar cada vez mais sua replicação etérea de valor, e então podem trocá-la por produção real, resultando então no fenômeno inédito de que justamente quem não produz passa a se apropriar da produção, e em pouco tempo a tendência é estes sistemas de produção virtual financeira controlarem toda a produção material, o que resulta então na escassez de valor real, pois o valor virtual é muito maior, e os prejudicados passam a ser então os que não possuem meios para "Inventar" Dinheiro.

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DINHEIRO É RELATIVO

Estando estabelecida a natureza temporal essencial do dinheiro, passemos agora à articulação da correlação com a Teoria Física da Relatividade. O mais importante é então afixar bem a idéia da relatividade do dinheiro aos moldes einstenianos.

Isso não me parece muito problemático. Basta lembrar que não há um "índice" fixo de relação entre Tempo e Dinheiro, tais índices variam de acordo com a natureza das relações. Ainda mais trivial é o fato que bastam leves mudanças de local, contexto e época para tornar insignificante uma quantia antes tida como vistosa.

Alguns bens desvalorizam-se com o tempo, outros valorizam-se, como bons uísques e vinhos, relíquias artísticas ou raridades. Isso demonstra não só o efeito do tempo sobre o valor econômico, mas a própria relatividade do efeito.

Em termos da Física do século passado, lembremos que o fatores mais significativos capazes de distorcer o Tempo são a Gravidade e a Velocidade.

Gravidade é resultado direto da concentração de Massa, então vamos correlacionar a Massa com o próprio Dinheiro em si, melhor chamado Capital. Quanto maior a acumulação de Capital, maior seria a "Gravidade" do sistema.

Como Velocidade, ou Movimento, vamos considerar as transações financeiras. Aplicações, investimentos na Bolsa, títulos e etc. Quanto mais amplas e dinâmicas sejam, mais tendem a acumular Capital. Portanto, a esse movimento financeiro, podemos dizer que é "Veloz".

É aqui que entra então a correlação Inversa, pois vimos que para o Tempo Físico, quanto maior a Gravidade mais lentamente decorre, o mesmo se dá quanto maior a Velocidade do sistema, que faz o Tempo no interior do mesmo em relação a um referencial exterior, decorrer mais lentamente.

No caso do comportamento do Capital, fica mais ilustrativo se entendermos como decorrendo o exato inverso. Quanto maior a Gravidade Financeira, mais rapidamente o Tempo econômico passa, e mais Capital se produz. Quanto maior a Velocidade Financeira, mais ligeiramente o Tempo econômico decorre, e mais Dinheiro Virtual se acumula.

Dessa forma, as "mesmas" ocorrências que fazem o Tempo Físico transcorrer mais lentamente, fazem o Tempo Monetário transcorrer mais velozmente, e tal inversão ocorre até mesmo quando mudamos o referencial.

Se uma nave espacial viaja, com uma pessoa dentro, numa velocidade extremamente elevada, para esse viajante o Tempo parece transcorrer normalmente, mas em relação aos não-viajantes ele transcorre mais devagar. Por outro lado o Tempo dos não-viajantes, as pessoas que ficaram na Terra, transcorrem mais rapidamente para este viajante.

Isso significa que mesmo que se passe anos, para os que ficaram, ao terminar a viagem o viajante poderia ter envelhecido somente poucos meses, dias, ou mesmo minutos. Poderia voltar literalmente mais jovem que os que não viajaram.

Com o Movimento do Capital ocorre o inverso. Para os que não participam desta movimentação, o que na verdade inclui toda a humanidade menos os poucos e privilegiados investidores, o Tempo decorre mais lentamente em relação ao "Tempo Interno" deste sistema de transação financeira, e seus poucos "viajantes". Para esse capital viajante, entretanto, o Tempo decorreu muitíssimo mais rápido.

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O resultado, é que esse sistema pode realizar a conversão Tempo => Dinheiro numa taxa muito maior do que o decorrer do tempo normal. Esse sistema realiza a "mágica" de multiplicar o Capital mediante a distorção temporal resultante da movimentação financeira. Da mesma forma, ocorre com a acumulação de Capital, que ao gerar "centros de gravidade" financeira, fazem com que o Tempo em seu limiar se acelere, sendo convertido em mais Capital.

É fato óbvio que quanto mais Capital se acumula, mais fácil é acumular mais. Ninguém tem maior dificuldade de ganhar dinheiro do que os que o tem em pouca quantidade. O supra sumo disso são as aplicações financeiras, onde quanto maior a quantia aplicada maior o rendimento, ou seja, tal qual a gravidade física, quanto maior for a massa do sistema, mais fortemente ele atrái mais massa.

No entanto, enquanto no mundo físico isso distorce o tempo retardando-o, no mundo financeiro isso o acelera, fazendo com que mais capital se acumule apesar do tempo real ser o mesmo.

Logo se nota aqui, que parece haver uma certa oposição entre as tendências de se reproduzir virtualmente o capital por meio da acumulação, e da movimentação, mas isso seria apenas ilusório, visto que o destino dos investimentos em fundos de rentabilidade é ser utilizado para as movimentações financeiras. O dinheiro fica retido pelo tempo necessário para que o banco possa negociar com ele, por meio de suas transações baseadas em taxas de juros arbitrárias, devolvendo-o num prazo previsto após ele ter se acumulado o suficiente para gerar lucro ao banco, e ao investidor.

Dessa forma, podemos inferir que na verdade a reprodução virtual do capital por meio da "gravidade" e por meio da "velocidade", são duas faces da mesma moeda.

Não obstante, estes dois aspectos podem se conflitar, como veremos no próximo capítulo.

Antes porém é bom observar que conseqüências este processo traz para a economia em geral. Evidentemente, apesar das virtualíssimas transações financeiras como as ocorridas numa bolsa de valores, toda a estrutura do sistema econômico se assenta sobre uma base física. O que ocorreu foi uma significativa independência da dimensão virtual sobre a real, a ponto de esta instância sutil ser capaz de, apenas em seu nível de flutuações "quânticas", produzir eventos de conseqüências físicas e reais por vezes trágicas.

Basta uma simples especulação num mercado financeiro, mesmo que baseado em boatos falsos, para se darem processos de fuga de investimentos que podem resultar em crises capazes de fechar empresas e gerar desempregos em questão de meses. O sistema financeiro é hoje algo incontido, uma "criatura" que se tornou livre do controle de seu criador.

De certa forma, ocorre um Emergentismo, a realidade virtual econômica emergiu da física, se emancipou, e agora é capaz de produzir causações descendentes, rumo à infra-estrutura. Essas causações são hábeis em desencadear toda uma série de eventos, mas jamais poderão superar o fato de que os bens materiais não podem se reproduzir tão livremente quanto os virtuais, e tal discrepância é aparentemente impossível de ser contornada enquanto se mantiver esse sistema de suporte às operações do capital financeiro.

Para se traduzir então numa real amplificação de riqueza, o Capitalismo termina por, mediante sua replicação arbitrária, a controlar os bens materiais, e a desigualdade econômica se torna inevitável, pois não há valor real para representar todo o valor "fictício", mas como tais valores são acumulados por grupos hábeis no controle e manipulação de riquezas, os que estão afastados dessas atividades inevitavelmente estarão excluídos. Isso, além do fato de que a simples existência do Capitalismo já pressupõe a desigualdade.

Temos um círculo vicioso.

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O COLAPSO DO UNIVERSO FINANCEIRO

É prevista pelos físicos uma conseqüência bizarra da relatividade do espaço-tempo. São os famosos Buracos Negros. Centros de gravidade tão intensa que atraem até mesmo a luz a seu redor. Em geral, surgem quando uma estrela, que apresenta eventos de expansão e contração durante sua longa existência, atinge um certo limiar de concentração de massa num pequeno volume, passando então a se concentrar cada vez mais e capturando tudo o que estiver a seu alcance.

Há quem teorize que o Universo irá, ao final de sua existência, ser totalmente devorado por buracos negros que levarão toda a matéria para focos de tanta densidade que o Tempo literalmente congela. De uma certa forma, não existem buracos negros no presente, o que temos são os chamados "Horizontes de Eventos" que levam a matéria para um tempo distante no futuro por vezes chamado de "Fim dos Tempos", onde se dá congelamento total da existência, de certa forma, a aniquilação, nos buracos negros do "fim da eternidade".

Na mesma linha de analogia, podemos prever um destino similar para o Universo Financeiro na medida em que os focos de gravidade monetária se tornem tão cumulativos, tão densos, que passem a sugar todo o dinheiro a sua volta e retê-lo, até o ponto onde o sistema financeiro deixa de se mover.

Ora, o objetivo existencial do Capitalismo é a simples acumulação de capital, ele não possui em seu âmago nenhum compromisso com qualquer valor humano ou ético, ou com ideais de justiça e bem estar social. Isso por si só deveria ser suficiente para evidenciar o absurdo da opinião que sustenta que o Capitalismo seria o "melhor modelo" econômico para conduzir uma civilização.

Mas deixando isso de lado, teoricamente, o "Sétimo Céu" da atividade capitalista, o limite máximo de sua realização, seria a evidente concentração de Toda a riqueza mundial em um único ponto, e se é certo que o Capital para se expandir ainda mais teria que se movimentar, ele só o faz quando há perspectivas de crescimento.

Insistindo na analogia inversa com a Gravidade, temos que o Buraco Negro financeiro seria quando um foco de concentração de capital atingisse tal ponto onde não mais permitisse o movimento externo, ele congelaria o capital em seu "Horizonte de Evento". Como isso se daria?

No momento em que não houver mais condições de amplificação do capital por meio do movimento, o que pode ter vários fatores causais como nos tem demonstrado as crises, a tendência é os focos financeiros diminuírem sua atividade, no entanto, eles não podem ficar realmente parados, pois o capital definharia, e devemos nos lembrar que aqui a analogia funciona inversamente. Nesse ponto, ocorre um movimento interno no Buraco Negro Econômico. Tal como no Buraco Negro físico a matéria sugada seria, possivelmente, arrancada de nossa dimensão normal e talvez lançada num outro universo, no Buraco Negro Financeiro o dinheiro é tirado do mundo virtual e lançado no mundo real. É o momento onde o Capital tende a ser convertido em riqueza física.

Nesse sentido, mantemos a inversão da analogia. Ao invés de congelar, na verdade o tempo se acelera, como se tendesse ao infinito, ou a velocidade limite, da Luz, passando então para um outro nível existencial e "desaparecendo" do plano virtual.

Isso é comum quando ocorrem as grandes crises no sistema financeiro, e por meio das fugas de investimento, a tendência é buscar a conservação de riquezas concretas, menos suscetíveis de flutuações no instável mundo fantasmagórico do mercado financeiro.

Uma crise suficientemente forte promoveria a fuga da riqueza do plano sutil para o plano denso, para o mundo real, até que o sistema financeiro desabasse por completo, toda a riqueza se reverteria para a acumulação de riquezas físicas, metais preciosos, ou dependendo da intensidade crítica, para bens básicos de subsistência. Evidentemente os beneficiários seriam aqueles que outrora foram os magos da geração espontânea de riqueza, e ao fim desse colapso do sistema capitalista, teríamos praticamente um retorno ao mundo feudal.

No entanto é muitíssimo improvável que isso ocorresse. Meu objetivo aqui foi o estabelecimento da analogia até certo ponto, e creio que tal resultado é menos plausível que o ainda duvidoso futuro Colapso do Universo físico. Mas que o sistema tende a crises locais é indiscutível, e possivelmente o principal motivo seja exatamente consequência desse abuso da virtualidade, da geração espontânea de dinheiro.

É como se na Economia, estivesse sendo "violada" uma espécie de "Primeira Lei Termodinâmica", e que tal violação tivesse um preço a ser pago, pois a matéria não pode simplesmente surgir do Nada.

Sem dúvida, isso não será o fim de nossa civilização, é claro, e é mesmo duvidoso que ocorra dessa forma, principalmente graças a resistência de diversas forças sociais que rivalizam com o Capitalismo. Enquanto o Universo Capitalista tiver possibilidades de Expansão, deverá haver Espaço para o Movimento. Mas até onde isso se dará? Quando a expansão terminar, o movimento não mais será possível, e o capital tende a se concentrar e desabar sobre si mesmo.

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RESPONDENDO À PERGUNTA

Afinal, como toda essa reflexão poderia responder à pergunta básica do curso? Por que, e como, ocorre um bloqueio capaz de impedir ações no sentido de transformar um sistema que, se deixado como está, tende a um colapso?

Simples. A maioria das pessoas, de certa forma, não tem Tempo!

Simplista demais? Não se recolocarmos numa outra perspectiva. Para viver, tenta-se a todo custo transformar o Tempo que se tem em Dinheiro, mas a pessoa comum só tem uma forma de fazer isso, por meio do Trabalho. Por outro lado, o acumulador de Capital, pode fazer isso sem Trabalho. Nessa corrida pela obtenção de dinheiro, quem não precisa do Trabalho está em nítida vantagem.

O beneficiado evidentemente não tem interesse imediato em qualquer mudança, em grande parte pela falta de uma visão maior, mas os não beneficiados, que são a esmagadora maioria, deveriam ter, porém estão submetidos a um sistema que, entre muitas outras coisas, se especializou em Viajar no Tempo, gozando de ampla vantagem.

Para o trabalhador, o simples decorrer do Tempo não lhe traz nenhuma vantagem, seu dinheiro é desgastado pelo mesmo. Já para o sistema financeiro é o inverso, de certa forma, ele suga o Tempo dos demais. A única forma da pessoa comum evitar isso é justamente se aliando ao sistema, fazendo suas pequenas aplicações e poupanças, assim ela alimenta o Capitalismo.

Além disso, qualquer processo que se crie na tentativa de prover uma emancipação, qualquer movimento quer seja de divulgação de idéias, de formação de cooperativas, de estabelecimento de nichos cuja mentalidade seja diferente, tudo isso ocorre no "tempo", e está atrelado ao sistema financeiro. Gráficas, editoras de vídeo, escolas e etc, tudo está imerso num mundo onde o Capitalismo pode alcançar e utilizar para produzir mais dinheiro.

Tudo pode ser comercializado, mesmo as mais revolucionárias idéias dependem de meios físicos para se propagarem, e estes podem ser controlados pelo sistema e usados para a conversão direta Tempo=>Dinheiro.

Qualquer ação terá que se desenvolver em contato com um plano totalmente ao alcance do sistema econômico, por isso a meu ver, uma proposta realmente revolucionária exigiria de certa forma, que se saísse do Tempo. Teria-se que articular um movimento fora do alcance do sistema financeiro, que estivesse além do alcance dos bancos. Talvez uma comunidade isolada, com um novo modo de produção, talvez uma cidade autônoma, auto-suficiente.

Tudo isso porém tenderia a entrar em conflito com estruturas sócio-políticas, as mais diversas, que estão todas sobre influência da estrutura econômica.

Não estou advogando que seja impossível, mas vejo apenas dois caminhos: Ou assumimos uma postura autenticamente Revolucionária, um rompimento drástico, e muito arriscado como sistema por meio da criação de um pequeno sistema alternativo. Ou...

Assumimos posturas Evolucionárias, progressivas, onde trabalhamos por dentro do sistema, passo a passo, mudando o gradativamente e com muita paciência.

É por isso que acho pouco plausível a idéia de viabilizar uma grande revolução. A exemplo do que de fato ocorreu, nenhuma delas conseguiu se livrar da influência direta do sistema, pois estão no mundo, estão no Tempo, o mesmo Tempo que pode ser convertido em Dinheiro.

Creio que a postura Evolucionária é mais promissora, embora possa parecer frustrante para muitos. Ela não deve, é claro, se conter e se conformar, ele deve promover seus breves rompimentos, suas mini revoluções, por meio das quais promove uma paulatina reestruturação.

Numa última analogia, o Universo não lida bem com a idéia de revoluções em sua estrutura constante e aparentemente imutável. Porém ele está em constante evolução.

Passo a passo, sem violar nenhum de suas Leis, saímos da Simplicidade para a Complexidade, e grandes distorções costumam ser em breve neutralizadas.

O Capitalismo é uma grande distorção, sem dúvida, mas pouco a pouco, com uma insistente e progressiva luta, podemos neutraliza-lo, redirecionando o sistema para um modo mais "natural", quero dizer, um modo onde não seja possível inventar riquezas que simplesmente não poderiam existir.

Ao fazer isso, estaremos aptos a iniciar a condução de nossa civilização rumo a um estágio mais avançado, amplo, e mais humano.

Marcus Valerio XR
01 de Julho de 2004

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BIBLIOGRAFIA

LAFARGUE, PAUL. O Capital - Extratos
MARX e ENGELS - Obras escolhidas. Lisboa 1983
DAVIES, PAUL. O Enigma do Tempo. Ed. Ediouro. 2000
ENCICLOPÉDIA MIRADOR INTERNACIONAL ( ENCYCLOPAEDIA BRITTANICA DO BRASIL)

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LISTA DE
MONOGRAFIAS