O capitalismo engoliu a Esquerda. A classe e o proletário deram lugar ao indivíduo e ao individualismo como sujeitos históricos. As vontades, fetiches e desígnios de porcentagens ínfimas da população mundial são mais importantes do que a realidade da maioria esmagadora dos povos e gentes do mundo.
Empresas que exploram trabalho escravo e semi-escravo, aprimorando o nível de lucro e ampliando o abismo entre as classes ganham automaticamente a simpatia dessa Esquerda que defende absolutamente qualquer "revolução", exceto uma revolução social.
O que importa se o produto do burguês que coloca seus fetiches sexuais como ápice do ativismo político foram produzidos da forma mais bizarra possível? O que importa se suas roupas são produzidas por mulheres trancafiadas num porão, costurando o dia inteiro? Qual a relevância de seus smartphones e computadores terem sido feitos por semi-escravos chineses, com matéria prima extraída por crianças na África? Um comercial "inclusivo" resolve esses problemas.
Filtros de arco-íris e sexualidades minoritárias em comerciais: o capitalismo fagocitou toda a Esquerda não proibindo-a, nem combatendo-a, mas sim transformando ela e todas suas pautas em produtos, e todos eles em clientes.
A Esquerda não deseja destruir o capitalismo. Deseja um capitalismo arco-íris - essa é a verdade pura e simples.
Essa vejice de ontem bem poderia inaugurar uma nova publicação de "Liberalismozinho Globalistinha Miguxo" para meninas adolescentes leitoras da Capricho!
O texto fala por si. Citação LITERAL com grifos meus!
Com uma boa dose de lamento, mas também com alegria, que finalmente volto a publicar mais um conto de Ficção Fantástica, separado 28 meses do conto de Ficção Científica A Queda da Lua.
Em VAMPEL - Vocationem Lamia Noctis, entro mais uma vez na seara do sobrenatural, embora quem me conheça sabe que mesmo meus contos de Fantasia possuem uma dose forte de racionalidade que os aproximam da Ficção Científica, ao mesmo tempo que muitas de minhas estórias de FC possuem grau de suprarealismo tão ousado que também se aproximam da Ficção Fantástica. Um simples diálogo, no limiar do romance e do horror, que descortina um universo por trás de um véu de mistérios, se conectando com projetos literários futuros que podem estar em compasso de espera, mas que jamais foram abandonados.
Quisera poder me dedicar mais à FC e FF, principalmente como escritor original, enquanto a realidade me exige uma dedicação que minha consciência não me permite negligenciar. E prometo me esforçar mais para que minha próxima contribuição literária para este site, que agora conta com 30 livros e contos venha em menor tempo que os quase dois anos e meio de meu conto anterior.
Se não disséssemos que as imagens da foto de nossa postagem foram tiradas no Brasil seria razoável imaginar que imagens desse tipo viriam das áreas na Síria, no Iraque, na Líbia ou alguns outros países sob controle do ISIS e organizações similares, todas adeptas da seita salafista.
Infelizmente essas imagens são daqui. Uma ameaça vem crescendo silenciosamente ao longo das últimas duas décadas, principalmente nas periferias dos grandes centros urbanos.
Sob os auspícios dessa expansão igrejas são invadidas e vandalizadas. O mesmo ocorrendo com terreiros de candomblé e umbanda. Em algumas favelas, padres já foram impedidos de celebrar missas e até de entrar em suas paróquias, mães e pais de santo já foram expulsos sob ameaça de morte. A maioria das outras religiões ainda não passou por essas situações apenas por serem mais discretas ou menos populares.
Mas essa ameaça tem nome. Ela não é algo genérico e abstrato como "intolerância religiosa", "fundamentalismo" ou "fanatismo". Tal como no caso do terrorismo, em que é necessário apontar e especificar de forma precisa a autoria dos fatos, aqui, diante desses casos de vandalismo, perseguição, ameaça, destruição e mesmo de aniquilação cultural é necessário fazer o mesmo.
Essa ameaça é o crescimento do neopentecostalismo e todas as suas miríades de seitas no Brasil. Trata-se de uma expansão que vem no esteio de dois vácuos: 1) O vácuo político-econômico de um Estado ausente que não se faz presente nas periferias e abandona uma população ao desespero da miséria e da indigência; 2) O vácuo religioso de uma Igreja que não parece mais capaz de dar conta de cuidar de seus fieis e começa a perdê-los de forma crescente e inexorável.
No desespero da indigência o homem buscará se apegar a qualquer um que estenda a mão dizendo que quer tirá-lo do abismo. E aí entram os oportunistas que estão na vanguarda dessa expansão neopentecostal. Homens que prometem não só um paraíso no céu, mas dinheiro, carro, casa, roupas novas para todos que depositem fé e dinheiro no "pastor".
Se essa fosse tão somente uma questão teológica e religiosa, ou um fenômeno social apenas, já seria algo grave. O neopentecostalismo é, fundamentalmente, a versão cristã do salafismo/wahhabismo.
Já há materiais sobre isso em outros lugares, por isso não nos alongaremos, mas ambos se fundamentam, essencialmente, na rejeição da Tradição, da contemplação e da reflexão filosófica. O "livro sagrado" é transformado, ele próprio, em um ídolo, um fetiche. Tudo o mais é rejeitado como idolatria.
Sem o apoio em uma longa tradição exegética, a interpretação "correta" do texto fica a cargo do "chefe religioso" local, que mistura literalismo com subjetivismo, tudo sob a lente da total ignorância e falta de erudição teológica. Não surpreendentemente, há muitos "pastores" neopentecostais semianalfabetos, tal como há muitos imames salafistas e wahhabis semianalfabetos ou analfabetos "educando" fieis.
Mas não é só isso. O neopentecostalismo vem acompanhado, também, de um apoio irrestrito e inegociável a Israel e ao sionismo, bem como aos EUA e seus projetos geopolíticos. O neopentecostalismo vem acompanhado de uma forte tendência econômica liberal, e mesmo anarcocapitalista, como vemos entre os "teonomistas".
Em suma, estamos diante de uma receita explosiva. Essa é uma expansão cujas consequências serão nefastas para as várias religiões que aqui coexistem. Para a soberania brasileira, para o bem-estar do povo brasileiro e mesmo para a sobrevivência de nosso Estado.
E basta olhar o exemplo claro dos países mais economicamente liberais que são exatamente os mesmos países mais culturalmente liberais. Em nenhum outro lugar do mundo os valores tradicionais, as religiões e a família são mais atacados que nos países da elite liberal econômica mundial. E o oposto também se dá.
Os conservadores se associam aos liberais como se houvesse uma união natural e inevitável entre os dois ramos. É comum um conservador se designar como "conservador liberal". Mas há erros estratégicos e morais nessa "aliança" - e os maiores prejudicados são os próprios conservadores. Mas, historicamente, sempre houve uma hostilidade entre o Conservadorismo (e o Tradicionalismo) e o Liberalismo.
Antes, é preciso entender essa hostilidade no campo filosófico. O Conservadorismo é, em essência, o reconhecimento de princípios atemporais e a tomada do ontem (o passado) como referencial. Há valores sociais, religiosos e morais que superam todos os outros elementos (economia, política, cultura, etc.) e que devem moldar esses elementos. O Liberalismo é o oposto: é o amanhã como referência, a crença no progresso rumo ao futuro e a tomada do lucro como a base de tudo e do dinheiro como a medida de todas as coisas. Esse fator supera qualquer outro elemento. A economia não deve ser restrita por absolutamente nenhum agente: nem Estado, nem Igreja, nem família, nem povo - nenhuma identidade coletiva. Ela é útil em si mesma e deve reger toda a sociedade.
Há um exemplo histórico bastante claro que ilustra isso:a Revolução Francesa. Os revolucionários franceses eram essencialmente liberais, e muito do liberalismo tomou fontes do Iluminismo e da Renascença, além da própria Revolução Francesa. O culto à razão, o pragmatismo, o materialismo, a visão de que o futuro é essencialmente melhor, a ascensão da burguesia (um movimento revolucionário conduzido pela elite burguesa, a elite econômica), entre outros pontos de convergência com o liberalismo atual.
A "aliança" entre conservadorismo e liberalismo é sempre temporária. Assim que ganham proeminência e alcançam seus objetivos, os liberais começam a descartar os conservadores e a própria cosmovisão conservadora (que é antagônica ao liberalismo).
Isso já acontece no Brasil. Conservadores e liberais enxergam na Esquerda um inimigo comum. Historicamente, os maiores opositores da Esquerda no Brasil foram os setores conservadores, especialmente os mais religiosos (com várias exceções, mas vamos deixar uma generalização aqui). O conservadorismo se opôs em essência ao materialismo marxista. Os liberais, aproveitando essa oposição, se "aliaram" aos conservadores para combater um inimigo comum. Mas o que triunfa, hoje? A retórica conservadora, ou o discurso liberal? Que ideias são mais marginalizadas e perseguidas: as ideias de casamento tradicional, ou aquelas contra o Estado? Não é difícil responder essa pergunta.
Pelas sombras e nas costas do discurso antiesquerdista dos conservadores, os liberais propagaram sua própria ideologia e ganharam autonomia. Agora, os antigos aliados não são mais tão necessários e eles podem assumir abertamente o antagonismo com os próprios conservadores. Versões mais radicais do liberalismo, ainda mais profundamente hostis ao conservadorismo, ganham espaço dentro do próprio escopo liberal: libertários e ancaps ganham são exemplo disso.
Esses grupos "radicais" consideram os próprios conservadores como comunistas, socialistas. Esse processo autofágico, primeiro contra o liberalismo clássico ou moderado, depois contra o conservador, é um fenômeno natural do liberalismo. O liberalismo, como Dugin diz, precisa libertar o homem de algo (nunca para algo): se não há inimigos reais, eles criam - nem que sejam outros liberais, ou os conservadores.
Se você é conservador, faça a seguinte pergunta: excetuando o campo econômico, quais as diferenças reais entre o liberalismo e o pós-modernismo da Esquerda? Eles defendem essencialmente as mesmas pautas opostas à religião e ao conservadorismo, essencialmente em relação à ideologia de gênero, aborto, drogas, outras concepções de família e quebra de valores tradicionais. De que adianta defender outras pautas econômicas se os objetivos são essencialmente os mesmos?
Há valores mais importantes que a economia. Se você é conservador, sabe disso. Família, religião e cultura estão acima de lucro, prejuízo, demanda e oferta. Bolsas de valores não são mais importantes do que sua dignidade humana e a integridade da sua família. A única preocupação dos liberais é com o lucro, o dinheiro. Podem haver liberais que sinceramente defendem e conservam seus valores tradicionais, mas o liberalismo enquanto ideia é essencialmente oposto ao conservadorismo e às tradições.
A degeneração moral, social e cultural e a destruição de valores religiosos é uma consequência natural do liberalismo. Se o marxismo é materialista, e ele realmente é, a solução não é adotar outro materialismo (o materialismo liberal). A melhor resposta é uma experiência filosófica profunda, metafísica e transcendental. Só assim é que se resiste ao pós-modernismo e ao globalismo nocivo.
Conservador, os liberais não são seus aliados. Não são seus amigos. Preserve seus valores, preserve suas tradições. Você não precisa do liberalismo para combater o niilismo e a destruição moral da Esquerda pós-moderna. Você já tem ferramentas que são suas e pode fazer isso por conta própria. Não se alie àqueles que te esfaqueiam pelas costas na primeira oportunidade.
Que Michel Temer é o chefe da maior organização criminosa do Brasil não necessita de Joesley para ser dito, afinal é o Presidente da República de um governo que assumiu o poder por um golpe parlamentar aliado a tudo o que há de pior no universo político e empresarial brasileiro. Tão pouco é novidade sua ligação com a espionagem norte americana, como já noticiou o Wikileaks.
E os tentáculos da CIA (que não passa de outro órgão do interesse econômico das megacorps estadunidenses) puxando fios de marionetes que agem no nosso (e no de quase todo o "Mundo Livre") cenário político e midiático nacional, conduzindo processos sociais há quase um século não são novidade alguma a não ser para quem acha que ler jornais, semanários e assistir TV torne alguém capaz de pensar por si próprio. (Uma interessante compilação histórica aqui redigida pelo Pravda: CIA SEMPRE QUIS O PETRÓLEO BRASILEIRO)
Mas como na cabeça de patinhos qualquer coisa que não passe no Jornal Nacional é "Teoria da Conspiração", podem continuar acreditando que a farsa-tarefa da Lava Jato, depois de desmantelar a Petrobrás e grande parte da indústria nacional, está combatendo a corrupção.
Faça um regime identitário político: perca rótulos bobos como "feminista"
Já me rotulei como homem "feminista" por alguns anos. Fui até citado em revistas de esquerda como tal. Claro, durou pouco, e hoje quem me fazia elogios por eu ter defendido o termo e o suposto conceito por trás dele faz algum esforço, se necessário, para fingir que eu não existo. Vejo agora alguns colegas da ciência embarcando nessa. Então isso aqui é explicitamente um aviso de cautela ("cautionary tale") de quem saiu do mesmo caminho.
Não precisei falar disso antes, porque para quem acompanhou ficou evidente que, especialmente depois de eu ter publicado uma tradução do texto da minha amiga Helen Pluckrose falando sobre por que ela abandonou o termo, eu também parei de usar. Antes, eu costumava dizer que o problema não eram feministas, mas "corporativistas de gênero". Eu gosto do termo "corporativismo de gênero", pois faz uma boa descrição de parte do problema desse setor da política, porque os brasileiros conhecem bem o problema dos corporativismos: do praticado pelos parlamentares (que tentam boiar com seus privilégios acima da crítica da opinião pública) ao praticado pelos médicos (que dificultam responsabilizar alguns por erro médico).
Não se enganem: eu estou completamente ciente de que há pessoas autointituladas "feministas" que defendem sob esse termo somente justiça nas relações entre os gêneros, igualdade de oportunidades e direitos (em vez da quimera autoritária de forçar paridades em tudo). Mas eu acho que já perderam a batalha pela defesa de um sentido totalmente justo para o termo.
O primeiro grande problema do rótulo "feminismo"/"feminista" é que ele induz ao erro por causa de sua raiz. Quem cunhou o termo e o adotou na maior parte da história pode bem ter tido a melhor das intenções e a mais lapidada das filosofias morais em torno disso. Mas, ainda assim, o termo atrai corporativistas de gênero, ou seja, atrai pessoas cuja intenção é, para parafrasear a feminista cética Janet Radcliffe Richards, apenas a vantagem das mulheres até mesmo quando isso tem o potencial de ser injusto. Negar que o termo é chamariz para corporativistas de gênero seria como ficar surpreso após botar num letreiro que sua padaria é um açougue e aparecerem clientes pedindo meio quilo de alcatra. Quem quer fazer guerra dos sexos se sente muito bem-vindo sob o rótulo de "feminista" apenas pelo radical "fem": não é à toa que quem mais insiste no radical da palavra são as mais radicais. São essas pessoas que repetem dezenas de milhares de vezes todos os dias nas redes sociais, geralmente com um tom ranheta e um perpétuo sarcasmo belicoso, que "você é homem então não venha dar palpite no assunto".
Outro problema é que, como vão insistir quase todas as pessoas buscando convencer mais pessoas a se rotularem como "feministas", há várias, inúmeras, definições de feminismo. O que por si só já é meio bizarro: por que você recomendaria um termo identitário político para alguém sabendo que há uma floresta de definições por trás dele? Inclusive, ironia das ironias e incoerência das incoerências para quem crê estar defendendo justiça nas questões de gênero, definições que são nada menos que sexistas? Ora, se vão me pré-julgar por causa de algo que não escolhi, e há uma quantidade suficiente de pessoas que o fazem por eu ser gay, por que eu me envolveria com pessoas que o fazem por eu ser homem? Não faz sentido. Dizer que não posso opinar, ou mesmo não dizendo, agir como se minha opinião automaticamente valesse menos por causa do meu gênero, é nada menos que sexista. E há inúmeras pessoas que se autointitulam "feministas" que agem exatamente dessa forma.
Finalmente, comparemos o termo com outro, usado muitas vezes como alternativa por atrizes de Hollywood que (milagrosamente) ainda não se dizem feministas: "humanista".
Há, também, definições diferentes para "humanista". Eis as principais e de longe as mais frequentes:
- profissional acadêmico das humanidades;
- pessoa de boa índole, agradável, ética [este explica por que até o Marco Feliciano já alegou ser "humanista"];
- pessoa sem religião que apóia o projeto iluminista de universalismo epistemológico e ético.
Sob o último sentido nos agrupamos eu, a LiHS - Liga Humanista Secular do Brasil, a International Humanist and Ethical Union - IHEU, a Humanists UK e outras organizações espalhadas pelo mundo. A IHEU, que agrupa todas elas e tem status consultivo no Conselho de Direitos Humanos da ONU, gerou definições (uma longa e uma curta) de "humanismo" que foram aprovadas pelas organizações-membros. Não há grandes desafios a esse uso do termo "humanista", exceto por alguns que preferem acrescentar o qualificativo "secular" por entenderem que há religiosos também "humanistas" (acho que isso indica que talvez esses humanistas transitam entre o segundo e o terceiro sentidos). Nada parecido existe para o feminismo. Emma Watson tentou vender o peixe da "definição igualitária" de feminismo na ONU. Terminou atacada tanto por pessoas que se julgam alvo de injustiças causadas por feministas (como alguns homens injustiçados em direito da família) quanto por feministas cujo sentido de feminismo exige a exclusão dos homens (e pode ter certeza que também odiaram que a campanha da Watson se chamava "he for she" - "ele por ela"). Depois disso Watson ficou tão estressada que passou um tempo afastada do ambiente público.
Não precisava disso tudo. Bastava dizer que estava na ONU para defender os direitos das mulheres, pois eles estão sob ameaça dos Estados Unidos (com os republicanos ficando cada vez mais criativos em tentar driblar a descriminalização do aborto) à Arábia Saudita, ao Brasil (onde há níveis alarmantes de mulheres vítimas de violência doméstica e onde há bolsões culturais em que meninas são tratadas de forma muito mais restritiva que meninos nas famílias). O termo "feminismo" não anda ajudando muito a lidar com essas coisas. Está, como expliquei no primeiro problema acima, ajudando a consolidar tribos políticas irracionais em guerra que atrapalham a resolver os problemas. Não se esqueçam: a politização tem o Toque de Merdas. Tudo o que toca fica fedido.
Se eu soubesse que uma fração substancial de pessoas que se dizem "humanistas" pensam que ser humanista significa tatuar testas de ladrões à força, eu abandonaria o termo. Por que insistiria? É o uso que faz os significados. Os dicionários capturam sentidos, mas uma fração das palavras muda de sentido com o tempo. A fonte dessa mudança é simplesmente o uso. Foi assim que dicionários anglófonos passaram a aceitar que o advérbio "literalmente" pode significar o oposto do que significava antes: foi para acomodar o uso do termo. Pois uso faz significado. O uso popular de "feminismo" realmente está igualitário? Creio que não. Se está igualitário, faz a distinção crucial entre igualdade de direito e oportunidade de um lado e paridade de resultados do outro? Aí tenho quase certeza que não.
É por isso que eu não mais chamo a mim mesmo de feminista. E acho que quem ainda insiste está pedindo para ser mal entendido. Mantenha sua identidade pequena: quanto menor o número de rótulos identitários políticos você adotar, mais livre você estará para considerar problemas e soluções um a um, com base em evidência e argumento, não com base em qual vai te dar mais popularidade e aprovação pelas diversas turbas das redes sociais.
É o que vivo dizendo. A idéia de que os países mais desenvolvidos chegaram aonde estão por políticas liberais é puro delírio! Depois de atingir um grande desenvolvimento por políticas imperialistas e protecionistas é que se tornam liberais, especialmente impondo Liberalismo em sua esfera de influência. Só que diferente de EUA, Inglaterra, França, Itália, Alemanha ou Japão, que são ou foram, TODOS, potências militares imperialistas que em algum momento usaram a força contra seus vizinhos, a China além de tudo isso tem 5 mil anos de tradição como potência, e os séculos XIX e XX foram apenas um breve hiato histórico onde ela esteve em franca inferioridade perante outros países.
Se tem um país que realmente pode atingir uma supremacia mundial capaz de reinar por séculos, é o "Reino do Meio", que tem a idéia de ser o centro do mundo em seu próprio nome.
O discurso liberal de Estado mínimo, anulação das fronteiras, negação de qualquer medida protecionista, não-participação do Estado na economia e rejeição de qualquer resquício de planejamento ou projeto central parece soberano. Os liberais já criaram a moldura psicológica baseada no discurso de que não há economia sem liberalismo, e que as leis do liberalismo são equivalentes às leis da Física e da Química: indiscutíveis e insuperáveis.
Entretanto, o projeto liberal é uma retórica esgotada, vazia, que só alcança algum eco nos países pobres ou em desenvolvimento - no Brasil, o liberalismo/neoliberalismo é visto e tratado como o ápice da inovação econômica, quando já está totalmente desgastado no cenário externo. Mas esse discurso e essa retórica quase que hegemônica do liberalismo encontram um grande opositor, um inimigo de peso: a China.
Primeiro, é importante ressaltar uma informação muito relevante: as autoridades chinesas estão fomentando o discurso liberal. Nos pronunciamentos oficiais, oficiais de Estado da China discursam sobre as "vantagens" e os "benefícios" da lógica liberal. Isso parece contraditório, mas não é. Todas as potências globais fomentaram o mesmo discurso - mas para os outros, é claro.
A Inglaterra fomentou, durante dois séculos, o discurso de laissez faire laissez passer, exigindo que tarifas e barreiras alfandegárias fossem anuladas por seus concorrentes, enquanto adotava para si mesma uma série de medidas protecionistas. Mais recentemente, os EUA fizeram exatamente a mesma coisa, enquanto mantém subsídios bilionários e proteções sobre sua própria economia.
A lógica é a seguinte: você abre seu mercado para os meus produtos, me fornece mão de obra e matéria prima e compra meus produtos superiores. A China faz exatamente a mesma coisa. Não interessa se isso é "liberalismo de verdade" ou não, nem se a China é liberal ou não: o que interessa é o fenômeno histórico. Os chineses querem novos mercados, querem engolir setores inteiros e o discurso de Estado mínimo é atraente pra eles: quanto menos protecionismo nos outros países, mais fácil é dominar seus mercados.
Alguém pode argumentar que a China depende dos parques industriais instalados em seu território. Isso é só meia verdade: a China está se deslocando duma mera subsidiária para empresas estrangeiras e fortalece cada vez mais sua indústria nacional. Além disso, já tem o maior corpo científico do mundo, investe pesadamente em pesquisa, formação duma elite e produção de tecnologia, além de entrar cada vez mais no setor de serviços e de mercado especulativo. Ou seja: ela vai competir cada vez mais em setores nos quais o Ocidente ainda é praticamente hegemônico.
Alguém pode argumentar que, depois das reformas "liberais" de Deng Xiaoping, a própria China adotou o liberalismo. Mas isso não é verdade: o Estado é um agente ativo na economia chinesa, há um forte planejamento econômico no país e as "facilidades" para o capital e as empresas estrangeiras só existem porque beneficiam os interesses Chineses. A China só realizou uma abertura em níveis específicos e em nichos bastante restritos, mantendo os setores estratégicos para si mesma (o contrário do que os "nacionalistas" brasileiros defendem por aqui). Se isso é socialismo, comunismo ou "capitalismo de Estado", pouco importa. A China assegura seus interesses, e é isso o que conta pra um país. Ideologia ou terminologias são aspectos secundários, no máximo.
Só restarão duas opções ao Ocidente: adotar medidas protecionistas e reinvestir na economia nacional (foi esse discurso que permitiu a eleição de Donald Trump nos EUA, por exemplo), ou prosseguir no curso neoliberal e deixar que a China torne-se gradativamente a maior economia do mundo. E, consolidada como primeira economia, não é difícil imaginar que também será o maior poder militar do globo, mesmo que ainda bem distante dos EUA. Mais dinheiro significa mais armas, mais think tanks, mais poder na mídia, mais força nas organizações como a ONU, etc.
Enquanto isso, os liberais continuam com delírios de que o Estado mínimo é o caminho mais certo para o progresso (sim, mas só se for para o progresso chinês).
Fontes e notas:
Sobre a ascensão da China, recomendamos fortemente a leitura da obra "When China Rules the World" [Quando a China Governa o Mundo], de Martin Jacques.
Já está pronta a obrigatória tagline para qualquer manchete jornalística que noticie qualquer passagem misteriosa de um dos delatores desta para melhor.
Em 8/5/17 a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal (cuja sigla CRE ao omitir o "DN" parece fazê-lo de forma bastante apropriada) liderada por Fernando Collor, realizou um debate público sobre Populismo e Protecionismo que focou-se na prática em defender a entrega total do patrimônio brasileiro ao interesse estrangeiro.
Neste, o sociólogo Paulo Delgado, ex deputado constituinte pelo PT, afirmou com ênfase que o fato do agora presidente da França Emmanuel Macron ter desposado uma professora 24 anos mais velha do que ele é da mais alta relevância, talvez a maior, em todo o processo eleitoral francês.
Evidentemente trata-se de uma opinião de teor politicamente correto e "progressista", no sentido entorpecido de "progresso social" típico do Nova Esquerda e sua verve de "desconstruir" padrões e "combater preconceitos".
Que isso seja considerado mais relevante que a economia, a questão da imigração e todas as urgentes pautas sócio políticas de França e União Européia é só mais um tedioso sinal da absoluta inversão de prioridades típica de quem acha que defender o casamento homoafetivo que atende no máximo ao interesse concreto de 0,5% da população é pauta mais importante que a deterioração das famílias pelos índices de divórcios e monoparentalidade que atingem praticamente toda a sociedade.
A não ser pelo fato de que talvez seja a coisa mais importante mesmo. Ao menos do ponto de vista simbólico. A história de amor de Macron e sua antiga professora Brigitte Trogneux (que por sorte não foi acusada de estuprá-lo) é inegavelmente bonita, mas quando aos 30 anos ele, sem filhos, decidiu se casar com uma mulher de 54, estava optando em definitivo pela mesma "esterilidade" de Angela Merkel e Pepe Mujica, tornando-se então mais um representante perfeitamente ilustrativo de decadência populacional de seus países.
O símbolo apropriado de uma nação que cada vez mais abre mão de qualquer futuro, embora tenha atingido certa maestria em fingir fazê-lo dada sua incrível "preocupação" com o "progresso social" e o combate aos "preconceitos", rótulo usado para a defesa cultural dos comportamentos reprodutivos que são por si próprios a única garantia de futuro real. Tudo isso ao mesmo tempo que lidera a dilapidação gradativa de sua legislação trabalhista.
Tendo como praticamente único projeto social a destruição de sua própria civilização, a União Européia, títere do interesse financeiro globalista, poderia de fato ter sua sentença de morte decretada com a vitória de Marine Le Pen, e não é de admirar o esforço monumental em impedir tal fato, no que chamá-la de "extrema direita" enquanto na realidade ela é tão "centrista" quanto seu adversário, ainda que numa "altura" distinta do mesmo "centro vertical", foi apenas uma das estratégias midiáticas massificadas.
Penso que tal como a França teve papel crucial no advento da Modernidade com a Revolução de 1789, terá também papel crucial em enterrar definitivamente o contínuo histórico das Idades Moderna e Contemporânea. O que poderia ter se dado numa contra revolução que resgataria valores tradicionais no sentido de defender o próprio legado cultural que teriam como resultado inevitável varrer as tendências sociais suicidas típicas da neoesquerda.
Mas é quase certo que o será justo pela concretização de sua própria eutanásia civilizacional.
Malgrado algumas ilusões e neoesquerdices, este sincero texto de Fernando Haddad é uma das coisas mais interessantes que já li recentemente. Uma verdadeira aula sobre muitos aspectos estruturais da política brasileira por quem a conhece por dentro.
Apesar de longo, mais de 64 mil caracteres, vale cada parágrafo. Até prefiro nem citar trechos para evitar que alguns se dêem por satisfeitos com eles. Há os pontos bombásticos, mas que demandam um desenvolvimento contextual mais elaborado.
Tem elementos cruciais para se entender as Jornadas de Junho de 2013, que é fundamental para entender o que está ocorrendo até hoje. Sobre o comportamento midiático muitíssimo mais autoritário e repressivo do que qualquer censura jamais conseguiria ser, e sobre as próprias bases estruturais do Estado brasileiro.
Embora antigo, gravado logo após manifestações ocorridas no Congresso por defensores da intervenção militar em Outubro de 2016, a mensagem do vídeo ainda é atual.
Ainda sobre a Mulher Maravilha, são verdadeiramente espantosas algumas tentativas de cooptação do filme para a causa feminista (enquanto outras a tomam por anti feminista), por parte inclusive de algumas que a repudiaram em episódios como sua rejeição como símbolo do empoderamento feminino da ONU ou reclamaram de não ter pelos nas axilas, questionando o padrão de beleza "impossível" como se Gal Gadot, ou outrora Linda Carter, não fossem mulheres perfeitamente reais! (Não estamos falando de computação gráfica!)
É fato que ela foi criada como um símbolo do poder feminino por um ginólatra confesso que acreditava na superioridade moral das mulheres, e que tinha como objetivo inclusive inspirar meninas. Embora isso tenha sido em 1941 num contexto onde havia toda uma campanha governamental em vários países de estímulo a participação das mulheres no esforço de guerra. Lembrando que sua primeira missão nos quadrinhos era lutar contra os nazistas, seguindo a linha do Capitão América um ano antes. Nesse contexto seria difícil criar um novo super herói com outro diferencial significativo que não o gênero num mundo onde Super Homem, Batman e Capitão Marvel já tinham mais de uma década. E já havia uma tal de Miss America, uma super heroina criada 3 meses antes que recebeu seus poderes da Estátua da Liberdade! Que para quem não sabe, é a Lady Columbia que personifica a essência dos EUA.
Mas o estranho é ver uma série de cenas do filme sendo interpretadas como exemplos de uma mulher ocupando o espaço que lhe foi negado pelos homens!
Grande Hera! A Princesa Diana peitou os burocratas britânicos, se impôs sobre seus companheiros de combate e avançou sobre as tropas alemãs não por ser uma feminista empoderada problematizadora que quer derrubar o patriarcado! For Goddess Sake! MAS, além de ser de uma nobreza ética profunda, PORQUE É UMA SEMI-DEUSA COM PODERES SOBRE HUMANOS! Que pode esmagar qualquer homem normal com um simples peteleco! Se fosse o Super-Homem, o Thor ou o Hulk poderiam feito a mesma coisa! Se os burocratas almofadinhas do primeiro caso tivessem resolvido engrossar para cima dela, e ela engrossasse de volta, teria posto o departamento de guerra britânico abaixo com PODERES DIVINOS! E não mostrando os seios nem fazendo vitimismo.
Se fosse ao menos uma versão feminina de Batman, daria até pra forçar um pouco mais essa noção de empoderamento de uma forma mais literal. Mas Diana é uma super heroína não por ser mulher, mas por ser uma divindade! Que tem a missão sagrada de destruir outra divindade.
Claro que há uma simbologia de gênero inegável. Mas o que explica seu comportamento é o contexto de sua missão e sua natureza amazona.
O mais curioso é que o filme permite leituras "feministas" sim, e até bem interessantes. Mas não essas tolices que estão sendo feitas. E pelo que estou vendo parece que ninguém vai se dar conta delas, muito menos as "militantes de gênero", que já perderam há muito tempo a capacidade de perceber sutilezas simbólicas principalmente quando dizem respeito a psique humana.
Em 4/5/17 comentando o filme Capitão América: Guerra Civil, eu disse que a DC ainda tinha muito o que aprender com Marvel por mais que seu Batman Vs Superman tenha sido muito animador. Agora fico muito feliz em ver que finalmente a excelência foi atingida no filme da Mulher Maravilha.
Gostei muito do filme Homem de Aço, o primeiro da franquia cinemática interligada dos filmes da DC, bem como de sua sequência Batman Vs Superman, que comentei em 4/4/17. Mas ambos os filmes, que tenho em Blu-Ray 3D original, possuem falhas relativamente fáceis de apontar e que muitos fãs são capazes de solucionar com ideias que provavelmente tornariam os filmes melhores. Na minha versão Batman teria feito uma armadura com tecnologia kriptoniana apreendida da nave colonizadora que lhe permitiria enfrentar o Superhomem com mais equivalência antes de ter que apelar para a kriptonita, o que ainda daria uma satisfação de como os kriptonianos em Man of Steel já eram capazes de enfrentá-lo de igual pra igual sem sequer se expor à atmosfera terrestre. E ainda faria uma armadura com kriptonita embutida a ser usada mais adiante que lhe deixaria capaz de dar algum trabalho para o Apocalipse.
Esquadrão Suicida, o terceiro filme da franquia, dá um ótimo complemento ao universo com participações curtas mas sublimes do Batman. Mas eu ainda mexeria em algumas coisas. Já em Mulher Maravilha eu nada mudaria, exceto aquelas opções estéticas cujas escolhas não costumo questionar. Seria interessante que o céu se abrisse e surgisse o Sol após a primeira batalha contra as tropas alemãs, por exemplo, dando um belo efeito simbólico. Mas ainda acho que o filme beirou a perfeição.
Para começar, a retratação das AMAZONAS é absolutamente excelente. Fugiu do lugar comum hollywoodiano de colocar patricinhas com corpinhos de Barbie e colocou mulheres verdadeiramente atléticas e de aparência incrivelmente convincente enquanto guerreiras. Nada daquelas "Coelhinhas da Playboy" do saudoso seriado da Linda Carter. Acertaram em cheio não apenas na escolha de mulheres grandes, mas numa maquiagem cuidadosa que mostra o resultado de anos de treinamento duro e ferimentos de combate que mesmo assim não eliminam a beleza feminina natural. Não é o que eu escolheria para a minha "Ilha Paraíso" pessoal, prefiro as mais voluptuosas. Mas conheço uns caras que arriscariam a vida ali alegremente.
Quem me leu sabe que reclamei muito da escolha de GAL GADOT para o papel, mas após ver o resultado final tenho que dar "meu braço a torcer" (preferiria dar o meu pescoço para ela me dar uma tesoura) e admitir que esta israelense me convenceu e me conquistou, principalmente ao considerar a boa retratação das amazonas. Sou fascinado por quadris largos, mas estes em nada ajudam no desempenho físico. Mulheres atletas sempre tem quadris estreitos, e sendo assim talvez Gadot seja o ideal entre uma mulher fisicamente convincente e uma mulher bonita. Sem contar que sua interpretação foi excelente, aliás já desde o filme anterior.
A sequência que conta a origem mitológica das amazonas é sublime, com um tipo de arte até difícil de definir. E a batalha inicial contra a tropa invasora é de uma perfeição estética brutal! Tornando incrivelmente realista o encontro de uma tribo de guerreiras que nunca tinham visto armas de fogo e mesmo assim reagindo com habilidades arcaicas mas tão extremas que as permitem derrotar o exército invasor.
O fato inédito de terem dado uma satisfação para a QUESTÃO LINGÚISTICA também é algo digno de um prêmio, considerando que isso tem sido sistematicamente negligenciado de forma infantil, a exemplo do filme Thor, onde bastaria um simples comentário apelando para uma possível habilidade divina de fala qualquer idioma, que mais ou menos o que este filme fez! Não é necessário uma mirabolante explicação, uma tecnologia de capacete tradutor ou uma remodelagem completa da história para dar conta dessa dificuldade. Basta deixar claro que o autor simplesmente está consciente do fato de que não é cabível que culturas separadas por éons no tempo e espaço falem o mesmo idioma.
Chris Pine também está tão bom que quase conseguiu me fazer esquecer o absolutamente horroroso Star Trek Beyond que eu gostaria que um telepata apagasse da minha memória, e o simples fato do filme ser ambientado em 1918, PRIMEIRA GRANDE GUERRA, já é um mérito louvável nesta nossa época atual que me parece enfraquecer a "magia" dourada dos super heróis, em especial a santíssima trindade da DC, toda criada antes de 1950. Meu sonho é ver um filme do Superhomem ambientado na década de 1930!
Nesse ponto cabe a comparação com o primeiro Capitão América, um super soldado com um antiguado ainda que invencível escudo que enfrenta alemães na Segunda Guerra. E agora temos uma super amazona com antiguadas ainda que invencíveis armas místicas que enfrenta alemães no Front anterior. Inclusive com direito a arremesso de escudo.
Mas ainda mais notório foi o enfoque dado as armas químicas. Muitos não sabem que a Primeira Guerra foi "A GUERRA QUÍMICA" por excelência, ocasião onde mais se fez uso das mais temíveis armas já criadas pelo homem, enquanto ainda não se sonhava com as armas nucleares. Nem os nazistas usaram armas químicas em campos de batalha, embora tenham usado nos campos de concentração. Os fascistas usaram Gás Mostarda no norte da África, mas mesmo assim não se compara ao uso feito naquela que também ficou conhecida como Guerra de Trincheiras.
E falei em armas criadas pelo homem por ser notório que mulheres nunca se envolveram na produção de armas, mas no filme vemos a Dr. Veneno, que faz o papel de vilã feminina perpetuando o famigerado mas indelével esteriótipo de "Cientista Louco". Do ponto de vista simbólico, porém, isso é incrivelmente significativo, visto que por outro lado o veneno é a arma favorita das assassinas. A inversão absoluta do arquétipo Feminino primordial, que envolve gerar, dar vida e nutrir. Na final do século XIX na Inglaterra houve uma autêntica epidemia de androcídios praticados por esposas com uso ostensivo de venenos contra pragas caseiras que levou o governo a considerar a proibição de tais substâncias.
Nesta mesma Inglaterra que, em 1918, deu o sinal verde para o sufrágio universal de todos os homens, e mulheres acima de 30 anos, lembrando que até então a maioria dos homens também não votava mesmo sendo obrigado a ir à guerra. Com esse contexto, entende-se a elegante piada contida na fala da personagem britânica Etta, ao ouvir Diana perguntar "Como uma mulher pode lutar nessas roupas?" quando então responde que lutando naquelas roupas haviam conseguido o direito ao voto.
Esse singular momento expõe então toda a abissal diferença do mundo das mulheres amazonas para as mulheres do mundo real, que jamais lutaram num guerra em qualquer escala notável, mas o que não as impede de conquistar seus objetivos por meios bem diferentes. O que nos leva, finalmente, a questão do suposto "FEMINISMO" do filme.
Mas levar essa alegação a sério só é possível aos incautos que não sabem a diferença entre 'mulheres' e 'feministas', ao ponto de achar que um simples protagonismo feminino se transmute em pregação ideológica. Como se Joana D'arc, por exemplo, fosse uma feminista apesar de ser uma virgem cristã devota que jamais questionou a sociedade patriarcal em que viveu, e pela qual morreu.
Há um pano de fundo conceitual analógico e inevitável, que sugere um nítido antagonismo simbólico de gêneros, mas a própria origem mitológica e a própria missão das amazonas depõe contra ela. Seria como tentar reduzir todo o contexto da Guerra a um mero antagonismo entre ingleses e alemães como se as questões políticas, ideológicas e econômicas envolvidas não fossem a verdadeira causa do conflito. Da mesma forma, como fica claríssimo já no início do filme, a questão não é de modo algum homens contra mulheres, por mais que seja inevitável a desconfiança no contexto de um choque cultural tão grande no encontro entre os dois mundos. E sim entre divindades e seus distintos desígnios para os humanos. Vale lembrar que apesar do exército alemão ter sido exterminado pelas amazonas, Steve Trevor, que lutou ao lado delas, fui muito bem tratado.
Nesse choque cultural há a evidente perplexidade de Diana ao chegar em Londres, que é literalmente horrível em aparência, devo concordar. E tal choque se dá tanto no fascínio que ela tem por um bebê, que nunca havia visto (aliás isso merecia ser mais explorado), quanto na covardia e hesitação dos britânicos perante o inimigo e seus preconceitos sexistas mesmo diante de uma mulher que dava espantosa demonstração de competência. Algo que, porém, seria depois atenuado pela misteriosa presença que só se revela ao final do filme.
Portanto, são essas questões inevitáveis, esse choque com um mundo degenerado e afastado dos deuses em comparação com uma ilha paradisíaca ainda imersa em magia, e uma série de boas piadas de gênero por vezes sutis por vezes explícitas, que podem dar a aproveitadores ingênuos ou desonestos elementos para tentar ver no filme alguma pretensão panfletária completamente inexistente, ainda mais depois do injusto fracasso dAs Caça-Fantasmas e da pretensão feminista de Mad Max ter saído pela culatra.
Mas a Mulher Maravilha é claramente uma versão feminina da Saga do Herói clássica, arquetipicamente masculina, com todos os elementos fundamentais. A origem especial, e ocultada, bem como sua natureza única desconhecida por ela própria com vista a uma missão que só ela pode cumprir e da qual não pode se esquivar. O período de adormecimento até o forçoso evento que dará início a jornada. Os desafios a serem superados, o relacionamento com Trevor que faz o papel reverso do despertar dos segredos, numa analogia com a sexualidade, a decepção e o momento de fraqueza, até a reviravolta e a batalha final.
Por serem essências que transcendem o físico, problema não há em que essa jornada arquetípica masculina seja representada por uma mulher, mas isso não muda a estrutura simbólica da mesma forma como sendo guerreiras, as amazonas tem uma função essencialmente masculina que não corresponde à realidade da maioria esmagadora das mulheres reais. Quem quiser uma saga heróica essencialmente feminina terá que e contentar com Crepúsculo. Apesar disso, a inversão do gênero acrescenta alguns elementos femininos à estrutura da saga, que permitem a Mulher Maravilha assumir um tom mais andrógino e por isso mesmo mais universal.
Assim, as amazonas tem um valor simbólico interessante, mas há uma diferença crucial entre inversão de papéis e empoderamento feminino no sentido real. Mulheres conquistando maior poder na nossa sociedade não foi exatamente mulheres fazendo papéis tão essencialmente masculinos, que por sinal sempre existiram, a exemplo de guerreiras como Boadicéia (Britânia século I dEC), Tomoe Gozen (Japão, séc XII dEC) ou Khutulun (Mongólia, XIII), ou teríamos que ter exércitos femininos e mulheres lutando de igual para igual contra homens.
Isso permanecerá na ficção, quer seja na mitologia das amazonas, quer seja nas superheroínas contemporâneas, que curiosamente, em sua totalidade, foram criadas por homens, a começar pela própria Mulher Maravilha. Obra de um psicólogo que curiosamente também é o inventor do Polígrafo, o "Detector de Mentiras" (o "Laço da Verdade?"), um ginófilo que de fato tinha uma visão que poderia ser considerada feminista na época, quase 30 anos antes do Feminismo que conhecemos hoje e suas pautas que jamais passariam pela cabeça desse autor.
Enfim, pouco me importa que a diretora do filme tenha dito que o filme Não É feminista ou que a atriz tenha dito que É emendando em seguida uma definição ingênua do termo. O que realmente deve importar é se satisfaz os conceitos fulcrais do Feminismo enquanto ideologia, e isso não só eu posso garantir que não é como aparentemente a maioria das feministas profissionais também o dizem, e aliás o tem dito há muito tempo ao ponto de "vetá-la" como um símbolo feminista oficial da ONU por ser bonita.
E de qualquer modo, o filme é bom demais para isso. Que venha agora Liga da Justiça!
CARAMBA!!! Isto é ÓTIMO!!! Genial e instrutivo! Não posso dizer muito sobre os fatos em si, mas o modo como a letra e a música foram adaptadas foi simplesmente MÍTICO!
Após muita recomendação, certo dia fui assistir SENSE 8 com expectativa elevada não apenas por ser obra dos Irmãos Wachowski (agora transmulheres assumidas) mas por também ter participação de J. Michael Straczinsky, autor da que é até hoje minha série de Ficção Científica favorita: Babylon 5.
Assisti apenas o primeiro episódio e não tive a menor vontade de ver o segundo. Nem entro no mérito de ser uma propaganda feminista. Acho que é direito de qualquer ideologia se promover por meio da cultura pop, só não sendo correto que queira censurar a promoção de ideologias adversárias (que é exatamente o que é costuma ser feito neste caso). Digo porque se a ideia era representar a diversidade da humanidade com uma abordagem global (gostei das locações em vários países), então falhou desastrosamente.
Para começar, numa amostragem de 8 pessoas, o correto seria haver dois chineses, e há nenhum. Há uma indiana (seria correto também ter mais uma) e uma sul coreana, apesar da Ásia ter metade da humanidade. Há um africano, apesar da África ter mais gente que todo o chamado Ocidente, que por outro lado, possui 5 representantes. Dois americanos (apesar dos EUA serem menos de 5% da humanidade) dois europeus e um mexicano.
Considerando que tudo o que chamamos de Ocidente não é sequer 1/7 da humanidade, no que se refere a pretender dar uma boa amostragem da experiência humana universal, a série fracassa por não conseguir escapar de seu etnocentrismo anglófono, uma vez que é evidente que a escolha da herdeira rica sul coreana, da indiana e do africano do Quênia se dá evidentemente pelo fato de serem falantes de Inglês, idioma que é usado no máximo por uns 10% da humanidade. E a questão linguística não seria uma obstáculo à dinâmica da série, como a saudosa LOST foi capaz de demostrar bem, mas também pelo fato de que, envolvendo ligações telepáticas entre os membros, essa barreira idiomática poderia ser facilmente contornada pelo próprio conceito da telepatia, que poderia promover aprendizado praticamente instantâneo dos idiomas por todos os 8 personagens mentalmente conectados.
Como se essa representação demográfica e cultural já não fosse completamente viciada, ainda por cima dois dos personagens são homossexuais, o que numa amostragem de 8 pessoas que representasse a humanidade, deveria haver no máximo UM bissexual. E para completar há uma transmulher, o que mais uma vez, em termos de representação, nem deveria haver, visto serem este menos de 0,1% da humanidade.
Em suma, a amostra não só é viciada etnograficamente, mas sobretudo em termos de sexualidades alternativas, que no máximo atingem 3% da espécie humana. E sexualidade não é um dado de menor importância como seria no caso, por exemplo, a profissão ou a religião, visto que tal como o gênero dos personagens (unica coisa que foi correta em termos de representação) é um dado estrutural da experiência humana que vai além das meras variações culturais, que poderiam ter representação menos proporcionais sem grande prejuízo, afinal ladrões sofisticados e herdeiras de empresários bilionários também não são representantes devidamente proporcionais da humanidade.
Portanto temos aí a insistência progressista de dar a fenômenos humanos ínfimos em termos de representatividade uma importância desmedida, muito além de questões absolutamente cruciais que afetam a maioria esmagadora da espécie humana, como as questões étnicas, religiosas, políticas e econômicas.
Soma-se a isso clichês hollywoodianos contemporâneos como hackers gostosas e franguinhas lutadoras, e não tenho como lamentar o cancelamento da série que tem sido superestimada não pelo seu conteúdo, mas pelo seu tom panfletário ideológico que chega ao ponto de estimular orgias sexuais públicas politizadas, corroborando ad nauseam uma das mais monumentais farsas históricas da contemporaneidade, a tal "Revolução Sexual!" Que atende caprichos de elites mimadas de países ricos enquanto a maioria esmagadora da humanidade ainda almeja revoluções sócio econômicas.
The Matrix pode ser panfletário, mas o é num sentido crucial, associando a clássica Saga do Herói, que é essencialmente revolucionária, numa roupagem que além de permitir vários níveis de leituras mítica, simbólica e psicológica, ainda permite a analogia direta com uma revolução de massas. Não deixa de ser curioso ver entusiastas da "Pílula Vermelha" ideologicamente alinhados ao conservadorismo e liberalismo, quando a leitura mais direta de Matrix é exatamente a da derrubada do sistema político econômico vigente onde até mesmo é falado em escravidão e prisão que está em toda parte e que nos rodeia a tal ponto que não nos damos conta dela, mas que nos destrói continuamente o sentido existencial.
Babylon 5 é uma brilhante analogia da geopolítica mundial ilustrada por meio de civilizações extraterrestres onde podemos identificar facilmente os ocidentais, os orientais, os africanos etc, e ao mesmo tempo com questões místicas e filosóficas mais profundas, envolvendo espécies ultra poderosas que cumprem o papel simbólico de divindades, por vezes esquecidas e ocultas, por vezes que se revelam em eventos galácticos de relevância armageddônica.
Mesmo Jupiter Ascending permite um perspicaz leitura da realidade plutocrática de nosso mundo, com uma analogia até mais precisa que a de Matrix (e que já examinei brevemente em 12/02/2015) mas que infelizmente parece ter passado por completo desapercebida.
Sense 8 até tem alguns elementos interessantes no sentido de uma alegoria sobre integração, empatia e conexão humana, mas que terminam passando ainda mais desapercebidos devido ao foco na panfletagem feminista e sexualmente libertária, que terminou ditando o tom da percepção de seu público. Os protestos contra o fim da série parecem ter ignorado totalmente o que esta teria de mais interessante, e se focam exclusivamente nessa propaganda da representativa tão falsa e equivocada quanto achar que o hedonismo carnal de uma ínfima minoria é mais importante que toda uma realidade concreta muito mais profunda, dominante e universal, que é o que deveria ser objeto de uma abordagem verdadeiramente representativa da espécie humana.
A EXISTÊNCIA DOS ASILOS É UMA DAS PROVAS
DE QUE NOSSA CIVILIZAÇÃO SEU ERRADO
"Velho é um estorvo". "Velho é parasita". "Velho não serve para nada". "Velho fica ocupando espaço". "Por que esses velhos não morrem logo?"
Aqui estamos em uma das maiores insanidades de nossa sociedade.
Voltem uns poucos séculos. O que é a família? É o grupo de pessoas relacionadas por consanguinidade e afinidade, formando uma rede afetiva, que habitam uma mesma casa ou que vivem próximas. Estamos falando aqui em pais, filhos, avós, primos, tios e toda essa rede.
Em nossos tempos isso passou a ser chamado de "família extendida", mas não. Isso é simplesmente família. É isso que é a "família tradicional", em oposição à família burguesa, a do "pai + mãe + filhos".
Na família tradicional lugar de idoso é em casa, com todo mundo, ocupando a melhor poltrona da sala, ocupando a cadeira de balanço, cumprindo o papel social fundamental de figura sábia e experiente apta a aconselhar as gerações mais novas e que é absolutamente respeitada.
Somos anti-universalistas, mas estamos aqui diante de um papel social que parece próximo de ser universal em sociedades tradicionais. Do ancião indígena, à nonna italiana, passando por figuras correspondentes em sociedades de todos os outros continentes, o idoso ocupa um papel central no lar. Não raro, o "clã", a família, se organiza tendo como centro o ancião.
Sem essa figura, a família perde seu centro. Sem o ancião não há quem possa transmitir a história familiar, a cultura dos antepassados e conhecimentos sociais básicos às crianças. Esse é seu papel.
Voltemos ao presente. Família se tornou o arranjo patrimonial entre homem e mulher para garantir transmissão de herança para filhos. Em um sentido ainda mais baixo, família se tornou o arranjo aleatório entre quaisquer pessoas que nutram algum tipo de afeto umas pelas outras.
O individualismo burguês passou a dominar no entendimento do que é uma família. Em uma família desse tipo o idoso é um "peso morto". Ele só serve para "atrapalhar" a vida familiar. O que os "bondosos" pais pensam em fazer, então? Jogar os "velhos" em um asilo.
Claro, de vez em quando dá para visitá-los. Talvez...1 vez por mês...? Ou bem, pelo menos em alguns feriados, não é? E ali ficam os idosos, cercados por outros idosos, apodrecendo até a morte. Ou então, claro, a grande novidade que é fingir que idosos não são idosos, que é quando convencemos os idosos que eles entraram em outra adolescência. Essa é a figura do idoso totalmente separada de seu papel tradicional.
Em nossa sociedade, porém, os que trancam seus próprios pais em asilos podem ter pelo menos uma certeza: seus filhos, inspirados por seu "nobre" exemplo, também os trancarão em asilos.
Se desejamos defender a tal "família tradicional", se desejamos reestruturar nossa sociedade sobre bases mais sólidas, é para essas questões que temos que começar a olhar.
Há muita discussão em torno do funk (que não é um estilo homogêneo, mas abrange muitas variações). De um lado, a romantização da Esquerda, que trata esse estilo musical como uma "expressão proletária", uma forma de "resistência", ou o discurso vago de "manifestação cultural da periferia". Do outro lado, o moralismo da Direita que, para os outros, adota um código moral rígido e impiedoso, enquanto justifica os próprios erros: demoniza o funk enquanto não oferece nenhuma outra alternativa ou projeto.
A questão é bem mais profunda do que isso. O funk não é apenas um problema de moralismo, muito menos uma simples "manifestação cultural". Ele é reflexo de problemas profundos e de questões muito amplas que são desconsideradas - não por acidente, mas de propósito mesmo. E é um problema que está nas bases e vai até o topo.
Dentro do Estado brasileiro, há vários poderes paralelos. Esses poderes paralelos, principalmente na forma do crime organizado, preenchem lacunas deixadas pelo poder público. Onde estão essas lacunas? Principalmente na favela, na periferia. Lugares sem a mínima infraestrutura, sem a presença positiva do policiamento, sem a interação saudável entre os agentes do Estado e os moradores.
As necessidades imediatas dessas pessoas, abandonadas pelo governo, são "supridas" pelo crime organizado, seja pelo narcotráfico ou por milícias de policiais e ex-policiais que dominam os morros. O funk é apenas uma das várias ferramentas de dominação e de relação de poder entre essas pequenas elites paralelas que dominam essas áreas e as massas que vivem nelas.
O propósito do funk é essencialmente recrutar novos soldados para o narcotráfico/milícia e estimular nas mulheres o desejo (consciente ou não) de parir, dessa casta guerreira de milicianos e traficantes, novos recrutas, novos soldados- a infantaria ("soldado criança"). É simplesmente isso. E, dado o abandono cultural, serve para "amaciar" as tensões e permitir que as massas liberem seus instintos e tenham algum divertimento.
A norma nesses bailes é o consumo irrestrito de drogas, abuso sexual, estupro (inclusive estupro coletivo), práticas de pedofilia, aliciamento, exploração sexual e até mesmo assassinato. A romantização da Esquerda em torno disso só mostra o quanto estão distantes da realidade. E o moralismo da Direita só mostra o quanto estão preocupados com os sintomas, e não com as causas.
Há até mesmo um projeto de lei que visa criminalizar o funk. Mas como fazer valer a Lei em áreas onde o Estado não age? Como fazer uma lei de proibição de funk valer onde nenhuma outra lei tem validade nenhuma?
A questão não será resolvida com proibições ou canetadas, mas sim com um projeto complexo, civilizatório. O Estado precisa retomar o controle das áreas onde está ausente. Não pode haver poder paralelo dentro dum Estado soberano. E isso não significa simplesmente instalar Unidades de "Pacificação": significa oferecer todo um projeto, toda uma alternativa cultural, ética, estética e econômica para as massas. Significa remodelar completamente as favelas e desmantelar o tráfico. Leva tempo, leva gerações inteiras. E não é um problema restrito exclusivamente ao funk: a indústria de massas, independente do gênero, é essencialmente destrutiva.
Enquanto não houver uma alternativa cultural e um projeto civilizatório para o Brasil, especialmente nas áreas mais abandonadas, o problema só vai piorar. Enquanto a questão for tratada apenas pela ótica da romantização ou do moralismo proibitivo, o narcotráfico vai fincar suas raízes cada vez mais fundo nas favelas e nos favelados.