Vamos simplificar e dividir uma sociedade imaginária qualquer em 3 grandes segmentos:
1 - Uma Classe "Superior", privilegiada, detentora do poder, e com o menor contingente populacional;
2 - Uma Classe Intermediária, semi-privilegiada, semi-detentora do poder, e com contingente populacional intermediário;
3 - Uma Classe "Inferior", o máximo afastada do poder, e com o maior contingente populacional.
Para que fique ainda mais simples, vamos visualizar:
Fazendo ainda uma paródia bem simplificada da mitologia grega, vamos intitular estas 3 classes de
Deuses,
Titãs e
Mortais.
Tal estado de coisas pode ser satisfatório para uns e não para outros, e caso haja alguma tentativa de mudança nessa
estrutura, ela certamente não partirá dos Deuses, que estão no poder e não pretendem sair. Porém, também não
poderia partir dos Mortais, porque a principal causa que os mantém na submissão é sua evidente falta de poder,
principalmente, de conhecimento. Os Deuses evidentemente não estão no poder por acaso, desenvolveram meios de
perpetuar esse estado de coisas, e um dos principais é restringir o acesso dos Mortais ao conhecimento.
Isso pode ser feito por proibições, restrições ou, no nosso caso contemporâneo, desestímulo sistemático, ao mesmo tempo
que celebra e incentiva toda sorte de ocupações emburrecedoras. (O Caos e os Anjos - A Fonte da Discórdia)
Portanto, todo e qualquer movimento revolucionário só poderia partir dos Titãs, porque apesar de sua situação
ser melhor que a dos Mortais, eles não estão no topo, no entanto, possuem algum poder e têm acesso ao conhecimento.
E se não podem subir ao poder por si próprios, se aliam aos mortais para mudar o estado de coisas.
Daí decorre o fato escandalosamente óbvio de que toda e qualquer mudança de uma ordem social sempre partiu das classes titânicas. A única questão que resta é se essa apenas usa os pobres mortais como massa de manobra, ou se realmente pensa em não apenas alterar a ordem, mas a própria estrutura da ordem.
Quando um conservador reclama que os revolucionários vieram não dos mortais, mas dos titãs, ou em alguns casos até dos deuses, nada mais diz do que tolice, pois não há como ser diferente e jamais ocorreu de outra forma.
Não foram os mortais que desafiaram Zeus, mas sim Prometeu que lhes deu o fogo.
Não foi Adão e Eva que decidiram comer do fruto proibido, mas sim um ser abaixo dos deuses, mas acima dos humanos, que lhes induziu a fazê-lo.
Não à toa, até mesmo arquetipicamente, um herói lendário ou ficcional, daqueles tipos revolucionários que realmente mudam as coisas, sempre provêm de alguma classe tida como superior, embora praticamente nunca da classe dominante em si.
(Heróis da Areia, Heróis de Esquerda X Heróis de Direita)
E sentido não faz que se proteste contra o fato de tal iniciativa supostamente em prol dos mortais partir de quem nunca experimentou na própria pele seus sofrimentos. Pois um certo distanciamento objetivo pode ser imprescindível para que se compreenda a situação.
Não se pode estar por demais longe do objeto de análise, nem por demais imerso nele, e sim num grau intermediário. Todo pesquisador sabe disso.
Por isso, da próxima vez que ver um conservador ou reacionário acusando os reformadores ou progressistas de não pertencerem à classe pela qual pretendem lutar, e por isso desqualificá-los, faça-lhe um favor e lhe lembre disso.
Principalmente se ele for cristão, pois seu raciocínio desqualificaria o mérito libertário da própria religião, visto que o messias crucificado não era realmente um mortal.
Marcus Valerio XR
Esboço original de Abril de 2008
Revisado e Finalizado em 9 de Fevereiro de 2012