SEXTA-FEIRA 13
JASON NÃO É MAU!
É A Navalha de Ockham Moral!
Há muito tempo venho pensando em escrever este texto, e o dia de hoje acabou sendo irresistível
para tal, uma Sexta-Feira 13 de Agosto. Porém, na verdade, esse texto nada tem a ver com a
popular superstição de que este dia traz azar.
Quero falar sobre a interminável série de filmes de terror intitulada
Sexta-Feira 13
(Fryday 13th), que ao menos até onde sei, também muito pouco a ver tem com esta data, uma
vez que os massacres de jovens que ocorrem nestes filmes não são assim datados.
Nada menos que 12 filmes trazem o inesquecível personagen Jason Woorhees, ainda que no primeiro
e no quinto não seja exatamente ele o assassino. Devo confessar também que não vi todos os filmes da
série, na verdade, por completo, assisti apenas o
III,
IV,
VII,
VIII
e o
Jason X, tendo visto
apenas partes de alguns outros. Mesmo assim, sei o bastante sobre eles para sustentar minha
opinião.
Apesar de ser quase um Anti-Crítico de Cinema, não posso negar o fato de que tais filmes são
no mínimo Trash, e isso para ser generoso. Eles não primam por qualquer elemento quer
seja atuação, direção, enredo ou mesmo efeitos especiais.
Isoladamente, devo dizer, cada um deles é um tanto quanto digno de uma certa desconsideração
como obra cinematográfica, não obstante, quando observamos o fenômeno em si, toda a popularidade
que tais filmes atingiram e sua estrutura conceitual, pode-se observar muitas coisas interessantes,
não exatamente nos filmes, mas na mentalidade envolvida em si.
A primeira coisa que eu gostaria de chamar atenção é para o fato de que, por estranho que pareça,
Jason não é mau! Ele não tem sentimentos. É apenas uma "máquina" de matar, e o faz fria,
insensível e automaticamente.
Ninguém diz que uma onça é má porque estraçalhou uma pessoa, nem mesmo que uma bomba que exploda
matando crianças é em si, "má". Portanto, não se deveria dizer isso de Jason. Ele não é humano,
não apresenta qualquer sinal de regozijo ou satisfação ao abater suas vítimas. Apesar de algumas
vezes ele parecer curioso como uma criança, o fato é que normalmente ele mata a vítima o mais
rápido possível, sem qualquer "requinte de crueldade" que envolva se deliciar com o sofrimento
alheio. Ao que parece, antes a existência humana em si lhe causaria sofrimento, ou uma simples
reação automática, e ele a extermina impulsivamente.
Observe que normalmente sequer vemos o rosto de Jason, ele não tem expressões faciais, não fala,
nem tem expressões corporais, e aparentemente também não "pensa", apenas age.
Dessa forma, podemos ver claramente que Jason na realidade não é o vilão dos filmes, ele é
simplesmente a fatalidade em si, tão mecânica e sem sentido quanto um acidente de carro. Ele
apenas cumpre uma certa função, é uma espécie de encarnação da própria morte.
Jason é como a mera lâmina da foice do ceifador de vidas, quase um instrumento de punição nas
mãos do "Destino", ou da Casualidade.
Podemos notar claramente nos filmes de Jason que há sempre uma divisão de personagens. Há
os "normais", cada um com sua peculiaridade mas neutros, há os eticamente corretos, que são em
geral os "mocinhos" da estória, e há sempre um ou alguns que são eticamente incorretos. Em geral
ambiciosos, corruptos, e cujas atitudes acabam pondo os demais em risco.
Aliás este é um tema comum em filmes de terror e cinema catástrofe. O fato de que muitas vezes
o verdadeiro vilão não é o monstro, ou o fenômeno catastrófico em si, mas um ou mais indivíduos,
que geralmente querem se beneficiar às custas de outros, colocando suas vidas em perigo. A lista
de filmes que apresenta isso é simplesmente interminável. Desde os famosos filmes catástrofes de
Irvin Allen, como
Inferno na Torre,
ou
Inundação,
até filmes catástrofe recentes, como
Armageddon.
Passando por filmes de Terror e Ficção Científica como
Aliens
ou
A Mosca 2.
É observando essa diversidade de personagens que notamos que filmes como os de Jason parecem
imbuídos de um forte e inflexível senso de Justiça. Sem exeções, os sobreviventos do massacre
são os "mocinhos", aqueles de melhores qualidades morais, os demais, quase sempre representantes
de algum vício específico, são eliminados, e os vilões sempre recebem a morte mais escabrosa,
ao final do filme, em geral provocando a aprovação do espectador, pois "esse merecia morrer".
Dessa forma, Jason não é um Criminoso ou um Psicopata, ele acaba sendo a "Mão da Justiça"! Tão
previsível quanto o Final Feliz de um romancezinho água com açúcar.
Jason é como uma
"Navalha de Ockham" moral! Que elimina as pessoas eticamente nocivas ou
dispensáveis, funcionando quase como um purificador da humanidade.
Pela estrutura de funcionamento dos filmes, se milhões de Jasons percorressem todo o planeta,
muitos inocentes morreriam, mas os sobreviventes seriam uma espécie de nata da espécie humana.
É não é só isso que me faz ver em Jason uma autêntica dimensão filosófica. Também há o fato de
que ele costuma chacinar suas vítimas em situações que causam um certo contraste. Muitas vezes
uma cena de Sexo, Romance ou Tensão humana comum são bruscamente interrompidas pelo assassino.
Jason parece um recado à todos nós. Vivamos a vida, pois ela é curta, e pode acabar
num instante! Muitos de nós que de repente sintam que morrerão muito em breve, tendem a assumir
posturas conciliadoras, e não perder tempo com triviais bobagens cotidianas que tanto sofrimento
podem causar.
Portanto, creio que a grande Mensagem de Jason é também essa: Viva Bem! Pois a Navalha mortífera
da Fatalidade pode lhe atingir a qualquer momento.
Marcus Valerio XR
Sexta-Feira, 13 de Agosto de 2004
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Acréscimos depois que vi o JASON X FREDDY.
Como eu previa, de fato JASON "quase" se torna um "Herói", mesmo porque ele é claramente visto antes de tudo como uma vítima, afinal fora uma criança com deficiências físicas e mentais que era constantemente perseguida e atormentada pelas crianças "normais" até que estas aparentemente o mataram por afogamento. Porém, depois descobre-se que apesar de suas limitações, sua resistência física e força se tornam sobrenaturais, e mesmo assim só depois que a sua mãe se torna uma assassina serial e acaba sendo morta, ela se torna o temível vilão.
Ou seja, pelo próprio ponto de vista dos roteiristas, Jason, de certa forma, ainda é perdoável, e este filme mostra claramente que há ao menos uma chance de redespertar seu lado humano. Por outro lado, de Freddy Krueger nunca foi mostrado nada digno de remorso. Ele já era um cruel infanticida serial, e por isso foi morto, antes de se tornar um demônio. Apesar da situação trágica que lhe deu a vida, um freira que trabalhava num sanatório e foi estuprada por dezenas de criminosos insanos, isso não serve como desculpa pelos seus atos, pelo contrário, é só mais uma forma de ressaltar sua essência maligna. É por isso que eu sempre previ que num encontro como esses, todos acabariam torcendo por Jason, porque ele é incomensuravelmente menos perverso do que Freddy, como deixei claro no Texto
Mas é melhor tomar cuidado com toda essa analogia. Jason promove um extermínio sem qualquer critério. Nos filmes, o que seleciona os melhores personagens, em termos éticos, para a sobrevivência, é a sorte. Ou uma Justiça Poética do Destino. E embora eu concorde que se a pior fração da humanidade simplesmente desaparece o mundo seria bem melhor, não me atreveria a dizer exatamente quem deve ser essa fração. Tirando, é claro, o fato óbvio que criminosos cruéis ao estilo Freddy Krueger deveriam estar nela.
Marcus Valerio XR
Quarta, 27 de Outubro de 2004
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