Meu nome é Ronald Rahal e através desta fan-fic quis fazer uma homenagem à série Jornada nas Estrelas (STAR TREK). Este pequeno conto foi escrito em setembro de 2005, utilizando-se de personagens da Paramout sem sua expressa autorização, sem fins lucrativos, no formato de fan-fic.
Viagens no tempo, desde H.G.Wells exercem um fascínio na mente dos leitores ávidos por ficção-científica. Tema recorrente que antes só se limitava à imaginação dos escritores, hoje já é admitido como possível pela física. Claro que ainda não passa de uma possibilidade teórica. Não significa também que amanhã será construída uma máquina na qual, à semelhança da aventura A Máquina do Tempo, possamos com um leve toque nos controles avançar ou retroceder no tempo à nossa vontade. Ainda estamos muito longe disso, mas quem sabe o que o futuro nos reserva.
Um dos episódios de Jornada que mais gostei foi o intitulado “A cidade a Beira da Eternidade” que explorava justamente este tema. Através de uma entidade que auto intitulava-se “nem máquina, nem ser vivo, mas ambos”, somos levados para uma viagem no tempo. Construída por uma civilização extinta com um propósito enigmático, permitia a qualquer ser de determinado planeta viajar por toda a sua história.
Este capítulo em especial foi inicialmente escrito por Harlan Ellison e demorou um bom tempo para ser finalizado. Divergências entre ele e a produção que pedia um roteiro mais “realista” dentro do apertado orçamento da Desilu, fizeram com que abandonasse a sua consecução. O essencial, porém, foi mantido. E este episódio dentro do universo de Jornada abriu um leque de opções, entre as quais, inseri as minhas.
Para quem é fã, procurei preservar ao máximo o original e peço desculpas aos mais ortodoxos. O objetivo é apenas oferecer mais um pouco de Jornada nas Estrelas. Meu sincero desejo é que cada um pegue sua pipoca, relaxe e sinta-se como se estivesse vendo um capítulo inédito, ou no cinema ou na poltrona de sua casa, “indo a onde nenhum homem jamais esteve”.

De volta ao guardião da eternidade

Ronald Rahal


Tempo Presente.

“Diário de bordo, data estelar 43001.3. Estamos nos dirigindo para a base estelar 109, atendendo a um pedido de socorro enviado pelo comandante da estação, tenente Sprwance. Ele solicitou a nossa ajuda para resgatar um membro da sua equipe que desaparecera juntamente com o corpo celeste mais restrito da Federação: o planeta do Guardião da Eternidade. Segundo seu relato uma dupla de cientistas havia sido enviada numa nave auxiliar para investigar um fenômeno que estava ocorrendo com a anã branca, em torno da qual girava o planeta do Guardião. Antes de retornarem, foi avisado de um problema que ocorrera durante a missão. O membro restante conseguiu voltar à base, mas o outro continuava desaparecido, juntamente com o planeta inteiro. Minhas instruções do Comando da Frota são para agir com extrema cautela devido à complexa entidade que habita o mundo designado como GW-01”.
Conforme instruções do Comando da Frota Estelar a Enterprise fora desviada da exploração que fazia para entrar num setor da Federação, considerado de segurança máxima. A base estelar Cento e Nove, estrategicamente construída próxima ao planeta, tinha como principal objetivo, policiá-la e evitar as intrusões principalmente dos romulanos e klingons, que eram os principais inimigos da Federação, na época da legendária nave Enterprise NCC-1701 comandada pelo não menos polêmico, capitão James T. Kirk. Numa data estelar posterior, a estranha entidade fora novamente visitada pelo seu antigo imediato, e hoje embaixador, Spock. O local onde se situava a entidade que se auto-intitulava o “Guardião da Eternidade”, era mantido secreto pelo alto escalão do comando, sendo apenas conhecido por alguns como o ponto GW-01.
Depois da visita exploratória da nave e da avaliação potencial de perigo, que quase mudara a história da terra pela intromissão involuntária do Dr. McCoy, a Federação seguindo uma recomendação do antigo imediato da Enterprise, proibira qualquer acesso ao setor e só abrira uma exceção para uma equipe de físicos que regularmente monitorava o engenho alienígena e reportava suas medições para a base estelar.
Picard assim que recebeu as novas instruções do Comando para desviar-se para o planeta, procurara se informar acessando os arquivos de uso exclusivo de altas patentes, para saber o que ocorrera com a antiga Enterprise. O que viu, deixou-o sobressaltado e apreensivo sobre qual a melhor maneira de cumprir a missão para a qual fora designado. Recebera uma vaga noção sobre a estranha entidade que foi deixada no planeta para o qual se dirigia. E fora alertado sobre as tremendas implicações temporais que qualquer ato não planejado poderia causar no contato com a entidade que se auto-intitulava “Guardião”.
Jean-Luc estava revendo os arquivos confidenciais em busca de informações que pudessem ajudá-lo na nova missão quando Worf o interrompeu, avisando que já era possível à comunicação visual com a base estelar Cento e Nove.
Ele agradeceu o oficial klingon, desligou o seu console e atravessou a porta da sua cabine para a espaçosa ponte de comando.
Sentou-se na poltrona de comando, ladeado pelo assento de seu imediato, o senhor Will Riker e fez um sinal para o klingon - Na tela senhor Worf.
A figura de um jovem tenente preencheu toda o campo da tela central. Os seus dois grandes olhos azuis denotavam uma certa apreensão e a ansiedade era evidente no tom de voz à medida que relatava os fatos para o capitão da Enterprise.
- É como lhe estou contado capitão. Observamos uma súbita irrupção de um jato de plasma na direção do planeta. A máquina-viva que o habita estava inerte fazia já um bom tempo. Os sensores repentinamente detectaram uma súbita emissão de ondas temporais, sinal de que alguma atividade estava em andamento. Por sorte não havia nenhum membro da minha equipe lá. A doutora Stevens foi voluntária para a missão de investigação e rumou para o planeta com o alferes Sunar, do planeta Vulcano. No percurso ela relatou problemas com a nave auxiliar e conseguiu ejetar o companheiro numa cápsula de fuga. Depois disto perdemos contato com a nave e o planeta desapareceu dos sensores. Resgatamos o alferes, mas devido à singularidade da entidade que o habita pedi instruções à Frota que me ordenaram a aguardar a sua chegada.
O capitão Picard ouviu atentamente o restante do relato do tenente, interrompendo-o às vezes com algumas perguntas sem, no entanto compreender o que exatamente estava acontecendo. Picard sabia os potenciais perigos que o planeta oferecia e decidiu fazer uma aproximação cautelosa. Assim, finalizou o contato com a base Cento e Nove, e mergulhou o vaso estelar para o interior da zona, confirmando, à medida que se aproximava da estrela, uma drenagem constante de plasma deste Sol para as coordenadas do planeta do Guardião.
As mensurações prosseguiram tranqüilamente, enquanto uma leve trepidação atingia a Enterprise em intervalos regulares, provocadas pelas ondas temporais que o desaparecido planeta do Guardião continuava emitindo.
À medida que se aproximava do objetivo a ansiedade de Picard aumentava fazendo-o caminhar para um lado e outro na ponte. Periodicamente interrompia a caminhada fazendo perguntas aos tripulantes que monitoravam as telas de sondagem.
Às vezes aproximava-se da tela e ficava observando-a em busca do planeta. Noutras pedia que aumentassem a resolução das telas para que pudesse localizá-lo.
Data foi o primeiro a chamar sua atenção.
- Alguma novidade senhor Data? – perguntou o capitão Picard, mantendo os olhos firmes na tela e esforçando-se para achar alguma coisa que pudesse identificar como o corpo planetário que procuravam.
- Não estou bem certo senhor. - respondeu Data prontamente. – Os sensores informam um forte fluxo de táquions.
- Do planeta do Guardião, presumo?
- Exato, mas há algo errado senhor. Se os instrumentos estão funcionando corretamente, o planeta não se encontra nas coordenadas conhecidas, registradas pela Enterprise NCC-1701.
O capitão Picard levantou-se de sua poltrona e resolveu pessoalmente checar os sensores que estavam no painel à frente de Data.
Caminhou até à posição do andróide, tocou alguns comandos, e seu rosto denotou um misto de espanto e curiosidade.
Voltou-se para a sua poltrona e enfaticamente ordenou a ampliação máxima da tela dianteira. Ela tremulou e teimosamente continuava sem dar sinais do planeta do Guardião.
Os experientes olhos de Picard ficaram observando por alguns minutos a paisagem, salpicadas de estrelas até que com um movimento brusco da mão direita, apontou para um pequeno objeto que eclipsava algumas delas em seu lento deslocamento.
-Vejam! Aqui! Bem aqui! O que os sensores acusam senhor Data?
O andróide manipulou alguns botões do painel e voltou-se para o capitão postado diante da tela.
- As coordenadas estão corretas senhor. Porém os sensores visuais nada registram. Nenhuma massa, nada. Apenas um fluxo de ondas temporais.
De repente o painel do tenente Worf foi ativado.
- Capitão! Estamos recebendo um pedido de socorro!
- Pode identificá-lo senhor Worf?
Data adiantou-se ao pedido do capitão.
- Com licença capitão.
- Do que se trata senhor Data?
Data olhou os sensores de longo alcance de navegação da Enterprise, e depois virou para o capitão Picard, num gesto que aprendera a imitar dos humanos.
- Estou captando também o sinal senhor. Mas há algo errado.
- E o que é senhor Data? – adiantou-se o primeiro oficial Riker.
- O sinal é de uma nave auxiliar e pela freqüência, trata-se da nave que levou a última equipe de físicos para o planeta. Diz estar com problemas nas suas naceles e pede para nos aproximarmos. Só que este sinal, senhor, segundo meu sensor, foi emitido há mais ou menos...Quatrocentos anos!
Picard virou-se na direção do senhor Worf e pediu-lhe que verificasse se os dados do sinal conferiam com os sensores do andróide.
- Perfeitamente capitão! É da nave auxiliar Kepler da base Cento e Nove e foi emitido há exatos... 430 anos!
Picard olhou para o seu imediato com uma expressão de assombro que apenas devolveu-lhe outro olhar interrogativo. Will ajeitou-se na poltrona e fez um pergunta ao andróide.
- Senhor Data. Poderíamos estar diante de um fenômeno relativístico?
O andróide virou-se novamente na direção dos dois, sem esboçar qualquer traço de emoção. – É provável que o fluxo temporal distorça a emissão do sinal causando sua dilatação.
- Muito bem senhor Data! – exclamou Picard. - Marque um curso na direção do sinal.
A nave acelerou na direção da fonte. Sem aviso algum ela adernou ao topar com um copioso fluxo de partículas, que jogaram ao chão todos aqueles que não estavam sentados em seus assentos. Em meio ao ensurdecedor sinal de alerta todos na ponte viram através da tela, partículas aglutinando-se num turbilhão de brilho azul-esverdeado chocando-se furiosamente contra os escudos frontais da nave. Era a energia deste campo que sacudira toda a Enterprise danificando os sistemas e por alguns instantes mergulhando todos numa escuridão indesejada até que as luzes de emergência avermelhada inundassem a ponte.
- O que estamos atravessando senhor Data? – gritou o comandante Will Riker, segurando-se na sua poltrona.
- Trata-se de um campo taquiônico nunca registrado antes senhor. Acabamos de passar por ele. Os sensores indicam também que o planeta desaparecido encontra-se à nossa frente.
- Alerta vermelho senhor Worf! Postos de batalha! – ordenou o imediato.
Em meio ao som estridente da sirene de alerta e o corre-corre dos tripulantes, o primeiro oficial Riker olhou para o capitão. – O que acha senhor? Poderia ser alguma manobra romulana? Ou de alguma raça hostil?
Picard meneou a cabeça e virou-se na direção do klingon. - Alguma interferência subespacial senhor Worf?
Worf não tinha condições de responder naquele momento, pois, não queria acreditar no que o seu painel indicava.
O capitão logo percebeu a hesitação de seu oficial. – Algum problema nos instrumentos senhor, Worf?
- Não capitão! É que simplesmente a base estelar Cento e Nove não existe mais. Os sensores não indicam sua presença.
Todos na ponte trocaram olhares interrogativos e consultaram seus instrumentos para certificaram-se de que a informação de Worf era correta, o que de fato era. A base deixara de existir assim como as comunicações com o Comando.
Enquanto examinava seu painel o klingon percebeu nova mensagem vinda da nave auxiliar.
- Senhor! É a Kepler.
Na tela! – ordenou o capitão Picard.
A princípio, os tripulantes na ponte viram a imagem de uma típica nave auxiliar, que logo foi substituída totalmente pelo rosto de uma jovem mulher.
- Capitão Picard? Jean Luc Picard?
- Doutora Stevens? Estou certo em presumir que estou falando com a doutora Stevens? A senhora está bem?
Picard perguntou-se mentalmente como ela sabia seu nome e o pronunciara de forma tão familiar. Tão íntima. - Já nos conhecemos, doutora?
- Sim capitão, eu sou a doutora Dora Stevens e estou bem. Quanto à sua pergunta se já nos conhecemos, digamos que de certa forma, sim capitão! Mas desculpe-me se quebro todos os protocolos da Frota. Mas eu preciso urgentemente ir a bordo da Enterprise falar com o senhor.
Picard refletiu por alguns segundos no pedido da mulher. – Doutora Stevens, a senhora sabe o que esta acontecendo?
- Perfeitamente capitão. Insisto que é urgente que me receba a bordo.
Diante da inusitada aparição da doutora e de sua insistência, deu autorização para que a nave Kepler adentrasse o hangar. Depois ordenou que substituíssem o estado de alerta vermelho para o amarelo e a engenharia restabelecesse as luzes normais. Acompanhou atentamente os monitores que transmitiam imagens das manobras de recolhimento da pequena nave e depois de trocar olhares inquisidores com os membros da tripulação, pediu que o imediato assumisse a ponte e dirigiu-se para sua cabine.

Quando a doutora Dora Stevens pediu permissão para entrar, o capitão esperava receber apenas uma visitante. No entanto, para seu espanto, duas mulheres adentraram-na.
Diante dele estavam a doutora desaparecida, agora reencontrada, acompanhada de uma jovem mulher que, se ele não estava enganado, vestia trajes típicos de algum período do século XX. Seu sorriso era enigmático e seu olhar curioso era indisfarçável.
Dora percebeu o constrangimento do capitão e procurou corrigir a situação rapidamente. – Oh! Desculpe-me capitão! Permita-me apresentar-lhe Edith Keeler. Edith, este é o homem de quem lhe falei: capitão, capitão Jean-Luc Picard, da nave estelar Enterprise.
Picard levantou-se sobressaltado, hesitando por alguns segundos em estender sua mão para a jovem. Precisou usar todo o seu autocontrole para sufocar toda a emoção e as implicações que este nome lhe causara.
- Edith! Edith Keeler! Como é possível... Como?
- Se nos permitir, eu e ela nos sentarmos, tentarei explicar ao senhor da melhor maneira possível. – disse a doutora Stevens calmamente.
Picard percebeu a sua falha na postura de capitão e fez um sinal rapidamente para que as duas mulheres se sentassem, deixando-se cair na poltrona em seguida.
Durante meia hora escutou atentamente o vívido relato da Dra. Dora Stevens, a brilhante astrofísica quântica, que estava sentada à sua frente.
- Resumindo tudo que lhe disse capitão, a Federação está em perigo e eu pedi para ser levada à sua presença, porque sei que é o único que pode afastá-lo.
Ele a olhou fixamente e procurou pesar cada palavra que ia dizer.
- Diante de tudo que fez, a senhora está ciente doutora de que violou várias diretrizes de segurança? E juntando-se a isso, quebrou também os protocolos da Frota Estelar, por tomar decisões que não lhe competiam?
Ela o olhou com um ar de súplica e fez um sinal afirmativo com um gesto de cabeça.
- Mas quero que entenda, capitão. Fiz tudo isto motivada pela compaixão. Sabia e ainda sei dos riscos e pretendo assumir toda a responsabilidade pelos meus atos. Mas, eu lhe suplico, na verdade eu lhe imploro: salve-a! Por favor, não a deixe morrer!
Picard a olhou friamente.
Edith que permanecera calada pediu permissão para falar, com o intuito de dissolver o clima pesado que se instalara entre o capitão e a doutora.
- Capitão se há alguém que deveria ser culpado, este alguém sou eu. Ela fez o que qualquer pessoa faria para salvar outra vida. É com seu eu fosse sua filha. De que crime ela pode ser acusada? De omissão ou de participação? O que faria o senhor nas mesmas circunstâncias? Deixaria uma pessoa que ama como se fosse sua filha morrer?
Ela levantou-se e o encarou firmemente. – No meu tempo eu tinha o dever moral de ajudar meus semelhantes. Seria mais fácil deixá-los à própria sorte. Mas cheguei à conclusão que eles não eram culpados por suas situações. Eram apenas vítimas de um sistema social que quase entrara em colapso. Então o destino me colocara ali para ajudá-los. Conheci muito sofrimento e como lhe disse era meu dever moral fazer o possível para amainá-lo.
O capitão por alguns instantes refletiu sobre as palavras de Edith e fez um gesto de basta com a mão.
- Verei o que posso fazer senhorita Edith. Pelo que a doutora me contou, devo ponderar cada passo à minha frente. Qualquer ação que tomar, deverá ser considerada em todas as sua implicações e creio que o único membro de minha tripulação que poderá computar todas as alternativas é o senhor Data. Agora, com a permissão das duas tenho que tomar algumas providências urgentemente.
Ele abriu a porta da cabine e deu ordens para que os oficiais de segurança escoltassem as duas mulheres até ao aposento que designara especialmente para elas. Foi bastante enfático quando lhes pediu que só as deixassem sair com sua expressa autorização.
Assim que as duas se retiraram ele marcou imediatamente uma reunião com os membros mais destacados de sua tripulação.


Tempo passado.

Era o dia tão ansiosamente esperado pela cadete Stevens. Todos os colegas que tinham conseguido passar as duras provas da Academia, também estavam ali junto com ela, aguardando impacientemente seus nome serem chamados. Apesar de todos estarem unidos na mesma cerimônia, na verdade cada um estava imerso em seu próprio mundo. O que iriam fazer a partir dali. Em que nave serviriam. E que aventuras o espaço lhes reservaria. Só despertavam deste estranho tipo de sonambulismo quando ouviam seus nomes para apresentarem à frente de seus instrutores, para receberem seus certificados simbólicos que lhes permitiria incorporarem-se à Frota.
Dora ouvia os nomes como se fosse um som distante, longe do próprio mundo que criara. Na verdade ela estava neste momento viajando em outro tempo, para o tempo do legendário capitão James Tiberius Kirk. Para o tempo que continha todos os outros tempos e que era proibido para a maioria dos mortais. A maioria dos oficiais da Frota nada sabiam sobre o planeta secreto onde hibernava a entidade mais misteriosa da Galáxia: o Guardião da Eternidade, apenas conhecido pela sigla GW-01. Com muito custo, conseguira obter esta informação que se tornara uma obsessão em sua vida.
Desde que o capitão Kirk descobrira na data estelar 30130.4, a origem de constantes ondas temporais emanadas de uma fantástica entidade que não era nem máquina nem ser vivo e ambas ao mesmo tempo, a Federação havia proibido o acesso a ele por temer as terríveis implicações que as mudanças no tempo poderiam acarretar. Só haviam feito uma única exceção: para o embaixador Spock, que o utilizara para resgatar seu filho. Mesmo assim a experiência que tivera foi arrepiante e ele pedira a proibição de visitas ao planeta.
Mas como tudo o que era proibido acabava tornando-se um imã para qualquer espécie senciente, Dora fora atraída por ele também. Ao longo dos anos, como aluna de astrofísica quântica na Academia, lera e relera muitos relatórios de capitães estelares sobre desdobramento temporais como parte de seu estudo no entendimento de linhas de tempo alternativas. Mas por mais que pesquisasse os relatos de diversos comandantes de naves estelares, sobre desdobramentos temporais, nada havia ali, que pudesse atrair sua atenção até que uma colega de quarto lhe falara sobre um mitológico lugar, conhecido apenas por alguns como o ponto GW-01. No principio pensara tratar-se de uma brincadeira, fato comum entre os cadetes até que, burlando a segurança, constatara que de fato tal ponto existia, mas pouco se sabia sobre ele. Foi então que começou a se sentir fortemente atraída por ele, como se de alguma forma seus destinos estivessem entrelaçados.
Em seus estudos, Dora nada pudera descobrir sobre este enigmático ponto. Todas as informações, mesmo depois de tanto tempo, ainda eram consideradas confidenciais e de extrema importância para o destino da Federação, a ponto de ser negada a sua existência. Ás vezes um ou outro cadete, tocava no assunto, mas nada mais era do que simples especulação. O que quer que fosse, estava envolto numa bruma de lendas e boatos e a verdade é que havia pouca ou quase nenhuma informação disponível a respeito. Dora insistira muito nos anos de Academia para ter acesso aos dados sobre a veracidade do ponto, como parte de sua formação em astrofísica quântica, mas em todas as ocasiões em que lutara por esse direito os instrutores a haviam demovido com a desculpa de que nada sabiam a respeito. Mas quando certa vez foi visitada por agentes do serviço secreto, alertando-a para não tocar mais no assunto, o fato tornou-se evidência de verdade.
- Dora Stevens! Dora Stevens!
Os membros da mesa já a haviam chamado diversas vezes e só agora, Dora se dera conta disso, imersa que estava em seus pensamentos, bem longe da realidade da formatura, que a envolvia neste momento.
Constrangida, ela levantou-se do seu lugar, passou por alguns dos colegas que a fitavam curiosos e dirigiu-se para a mesa, para receber o seu certificado de admissão à Frota e as congratulações de seus instrutores.
Foi cumprimentando um por um, até chegar ao seu melhor professor da Academia, o vulcano S’Par, a quem se afeiçoara, apesar de seu comportamento frio e distante.
Era hábito entre os vulcanos não se tocarem, mas nestas ocasiões cerimoniais faziam uma exceção à sua tradição e apertavam as mãos dos cadetes num gesto tipicamente humano, já que a sede da Frota em S.Francisco era frequentada por uma grande maioria de alunos terrestres.
Quando a saudou, S’Par olhou bem para a sua cadete enquanto a reverenciava com o tradicional “Vida Longa e Próspera” na Frota Estelar. Era esse o costume do instrutor vulcano, mas naquele dia, ele fizera outra exceção. Deduzindo um perigo latente a partir do comportamento de Dora, usara sua lógica impecável, para fazer-lhe uma branda advertência: “Deixe sua obsessão de lado. Ela só lhe trará angustia e desespero, emoções que mesmo os humanos não gostam de cultivar. Por isso esqueça-a. Que você tenha uma longa vida na Frota, cadete Dora Stevens, e prospere em sua carreira”.
Ela apenas o olhou de forma curiosa, sem entender muito bem o que ele quisera dizer com aquelas palavras enigmáticas. De qualquer forma, ele a tinha brindado com um raro momento do comportamento vulcano e respeitosamente respondeu, levantando a palma da mão com os dedos abertos. S’Par fez o mesmo e ela abaixou a cabeça, afastando-se em seguida.


Tempo passado. Alguns anos depois da formatura.

Aquela informação lhe custara muitos créditos. Mesmo no século XXIII a cobiça humana não cessara. Sempre havia alguém disposto a pagar por algo que considerasse valioso demais.
Já que Dora não pudera obter as informações do planeta GW-01 pelos canais normais resolvera optar por outros meios. Procurou agir de forma que ninguém suspeitasse de si.
Tinha sido difícil não despertá-la em vista do que procurava. Contatara aqui e ali, sem ter muita certeza se esse era o caminho para atingir seu objetivo. Nem tinha certeza também, se não se arrependeria mais tarde de tê-lo feito, da maneira que estava fazendo agora. A necessidade pela informação fora preponderante e lá estava ela, esperando ansiosa pela pessoa que viria lhe trazer as informações que comprara.
O local era esse e a hora combinada também. Começou a ficar nervosa com a demora e por mais que procurasse manter a calma, receava que o seu comportamento a denunciasse. Sabia que tinha infringido as regras, mas era tarde demais para voltar atrás.
Logo o informante chegou. Como combinado parou diante dela como se fosse pedir uma simples informação.
- Boa noite. É este o caminho para a o quartel-general da Frota?
Ela ficou aliviada porque era esta a senha combinada.
- Sim. O senhor está perdido? Posso ajudá-lo?
Dora respondeu com a contra-senha.
- Gostaria muito. Eu tenho aqui comigo um pequeno mapa que fiz e gostaria que a senhora me ajudasse a ver se está correto.
Dora aproximou-se dele e quando pegou o mapa, notou que junto foi-lhe passado um envelope. Disfarçadamente o pegou e ao mesmo tempo entregou-lhe outro com alguns cartões de créditos.
- Olhe senhor! O mapa está correto e basta seguir este caminho que logo chegará lá.
Teatralmente ela apontou na direção do quartel e a pessoa agradeceu, rumando para o local apontado.
Ela ficou mais um tempo ali, como se apenas estivesse apreciando a paisagem do agradável jardim e depois rumou para a sua residência, lutando contra a curiosidade de abrir o envelope ali mesmo.


Tempo passado. Superfície do planeta GW-01.

Ela já perdera a conta de quantas vezes o Guardião a trouxera de volta para a superfície desolada daquele planeta. A cada retorno seu desespero aumentava mais e mais.
Tentara inúmeras vezes salvar Edith, mudando o transcurso dos eventos aqui e ali, mas o resultado era sempre o mesmo. Ela tinha que morrer para que a Federação existisse. E ás vezes não! Um fator desconhecido constantemente modificava as alterações que fazia. Eram muitas as alternativas e estava cada vez mais convencida de que o seu plano precisaria de muitas mentes. Não era trabalho para uma só pessoa mesmo com a ajuda dos bancos de dados da Kepler. Era uma tarefa árdua imaginar as conseqüências de tantos eventos e influências aleatórias. Começava a se cansar e já não conseguia por ordem nas idéias. Pensou, repensou e decidiu tentar novamente.
- Guardião! Vamos tentar a série doze. Repasse o ano antigo terrestre de 1900. Ao meu sinal inicie a seqüência e depois nas coordenadas pré-estabelecidas faça-me retornar.
Ela esperou a imagem formar-se. Quando o antigo século XX iniciou-se ela aprontou-se para pular.
- Agora!
A imagem tão esperada passou pelos seus olhos e ela tomou impulso para dentro do guardião.


Tempo presente.

O capitão Picard continuou olhando para o estranho espaço esverdeado que podia observar das janelas da grande nave. Nenhuma estrela. Nada. Só a estranha névoa que envolvia o planeta em torno do qual estavam orbitando. Aguardou todos se ajeitaram em seus lugares. Como sempre, os tripulantes que sempre tinham dado sua contribuição nas mais diversas crises estavam presentes: o seu prestativo imediato Will Riker, o sempre curioso Data, o seu criativo engenheiro-chefe LaForge, o seu eficiente oficial de segurança klingon Worf, a inseparável betazóide Deanna Troi e a não menos inteligente e elegante, Doutora Beverly Crusher. Desta vez sentia-se um clima de urgência no ar e cada um tinha opinião própria de como resolver o problema.
Um tripulante a mais fora convidado para participar da reunião: o senhor West. Formado em geohistória e especialista no que agora era conhecido como época pré-federação, fora chamado para dar consultaria à equipe que o capitão queria formar.


Tempo passado.

Assim que chegou em seu pequeno aposento, Dora abriu o envelope. Até aquele momento não a tinham enganado. A ficha de informações que contrabandeara parecia ser material genuíno. Ele consumira bastante de seus créditos arduamente economizados.
A ansiedade ditou suas ações em seguida... Rapidamente colocou a ficha no aparelho de leitura e avidamente começou a ouvir e a ver as gravações originais do diário de bordo da nave estelar Enterprise na voz do legendário capitão James T. Kirk. Era o diário completo sem a censura que fora imposta pelo serviço de segurança da Federação.
- “Diário de bordo. Data estelar 30130.4. Estamos a caminho de um estranho fenômeno que os sensores da nave captaram. À medida que nos aproximamos dele toda a nave está trepidando por causa do impacto das ondas que emanam todas de um planeta que órbita uma estrela ainda não mapeada. O senhor Spock após alguns exames preliminares concluiu que são ondas temporais”.
Dora não conseguiu dormir naquela noite. Viu e reviu várias vezes o diário de bordo completo daquela antiga missão. Estava excitada demais pelo fato de ser proprietária do diário de bordo do que considerava a mais importante missão da antiga Enterprise. Encontrara ali muito material secreto que lhe revelara o que era até então o intangível ponto GW-01. Agora entendia porque havia censura sobre esta parte do diário de bordo. Mas ao mesmo tempo descobria algo que a atraiu como uma mariposa era atraída pela luz. A figura de uma mulher carismática: Edith Keeler. Naquela ocasião, preso na Terra do século XX, o tricorder do senhor Spock conseguira registrar um futuro alternativo da história da Terra onde a Alemanha conseguira vencer a II Guerra Mundial. Descobrira que o ponto focal desta mudança era Edith Keeler. De forma alguma ela poderia ter sobrevivido àquela noite na década de trinta do distante século XX, quando o doutor McCoy e o capitão Kirk haviam-se reencontrado.
Se tivesse sobrevivido a um banal atropelamento, nada do mundo que conhecia existiria. Quando ainda estavam à frente do Guardião toda a Federação deixara de existir graças à atitude ética do doutor McCoy que chegara antes e impedira sua morte. Na tentativa de corrigir o gesto do doutor, Spock descobrira o que teria de ser feito e friamente colocara a opção diante de seu capitão. Fora uma decisão dura demais até para um enérgico capitão de Frota Estelar que jamais se recuperara do que tivera que fazer.
Os registros do senhor Spock, que naquela época era o primeiro oficial e também o de ciências não mostravam muita coisa da imagem de Edith Keeler. Algumas referências ao seu trabalho de assistente social e uma pequena foto estampada num antigo jornal que mostrava uma moça muito bonita, de aspecto frágil e delicado, mas que escondia um forte caráter. O pouco que pudera ver desta mulher lembrava-lhe algo familiar e sua obsessão para encontrá-la e conhecê-la ainda viva começou neste dia. Dora dera-se conta que de alguma forma os dois destinos estavam entrelaçados, mas ainda tinha uma vaga sensação do que era.
O caminho para o planeta do Guardião não era fácil. Durante muitos anos a doutora Stevens tentara em nome da pura investigação científica obter permissão do serviço de segurança da Frota para poder viajar até o ponto simplesmente como GW-01. Pedira, implorara e até ameaçara deixar a Frota, mas tudo em vão. O comando central sabia do enorme perigo e por mais que lhes agradasse a idéia de mudarem o fluxo temporal em favor da Federação, as alterações poderiam seguir rumos aceitáveis no curto prazo e danosos numa perspectiva que uma vida humana não poderia abarcar. Portanto os pedidos que chegavam ao comando eram sempre submetidos à apreciação de um conselho que tendo em vista os acontecimentos danosos do passado sempre acabavam por vetar qualquer pesquisa científica.
A princípio Dora seguira à risca as recomendações da Academia e os regulamentos da Frota. Mas o acesso ao tal Guardião tornara-se uma obsessão e com o tempo tomara a decisão de seguir atalhos nada éticos para conseguir o que tanto desejava.
Servira em diversas missões, aproximando-se mais e mais da zona proibida. Durante anos planejara os passos que daria para aproximar-se do ponto secreto sem despertar suspeita.
Quando finalmente conseguiu ser designada para a estação Cento e Nove, ainda estava proibida de singrar o espaço próximo ao ponto GW-01. Mesmo os que lá trabalhavam pouco sabiam sobre o que ocorria nas proximidades com exceção de em pequeno grupo, que viajava constantemente para “estudos” mas que nunca revelavam o que estudavam. Então procurou colocar em prática o plano que acalentara a vida toda.
Seu plano era simples e engenhoso. Desceria no planeta secretamente com a equipe de estudos. Quando se afastassem acionaria o artefato alienígena, enviando as ondas temporais de volta no tempo para que os sensores da base às recebessem. Depois voltaria para o passado um dia, avisando seu outro eu do que deveria fazer e retornando ao seu tempo normal. Como o Guardião mantivera-se adormecido desde que o capitão Spock deixara o planeta, a base estelar acionada começaria a investigar seu aparente despertar, enviando uma equipe. Quando a nave auxiliar fosse autorizada a coletar dados sobre o Guardião, ela se adiantaria à seleta equipe. Desta vez partiria sozinha, enganando o controle central da base. Depois, já a bordo, simularia uma pane, cortando as ligações com a base.
Durante um bom tempo, apesar de sua função de física quântica, aprendeu tudo o que podia sobre a pilotagem e o funcionamento da única nave auxiliar da estação. Quando a base foi alertada, Dora avisada pelo seu outro eu do futuro era a única que sabia exatamente o que fazer antes mesmo de deixar a estação numa “missão exploratória”.

Todos estes fatos já estavam no passado. Ejetara seu colega vulcano desacordado pelo faiser de tonteio, que encontrara inesperadamente dentro da nave auxiliar, numa cápsula de escape e rumara sozinha para o planeta. E agora ela estava ali, parada, em frente ao portal, diante do que tinha almejado a vida inteira. Todas as lembranças tinham passado diante de seus olhos e agora ela saberia o que fazer. Deu alguns passos, refletindo sobre as ordens que daria em seguida ao Guardião.
- Guardião, pode mostrar-me a história da Terra, quando passou por aqui o capitão Kirk da nave Enterprise?
Fez-se um silêncio momentâneo, seguido de um estranho ruído.
- SIM. POSSO LHE MOSTRAR TUDO O QUE ACONTECEU DURANTE O TEMPO DO CAPITÃO KIRK DA NAVE ENTERPRISE. QUER VÊ-LO AGORA?
- Quem? O capitão Kirk? - perguntou confusa Dora.
- SIM. ELE ESTÁ AQUI. TODOS ESTÃO AQUI. O TEMPO É SEMPRE IGUAL PARA MIM. NÃO FLUI COMO VOCÊS ENTENDEM. VOCÊ TAMBÉM ESTÁ AQUI EM DIVERSAS SEQÜÊNCIAS DE TEMPO. QUER ENCONTRAR-SE COM UMA DAS SUAS VIAJANTES?
Dora estranhou um pouco as palavras do Guardião já que só viajara uma vez ao passado. – Não, não quero. Nem ela nem o capitão Kirk. Aliás, os registros dizem que ele foi resgatado do passado e acabou morrendo num planeta distante e foi enterrado pelo capitão Picard.
- O CAPITÃO KIRK NÃO DESAPARECEU. ELE ENCONTRA-SE NUMA OUTRA SEQÜÊNCIA TEMPORAL. QUER ACESSA-LO?
- Não Guardião. Talvez num outro dia. Minha prioridade é outra.
- QUAL É SUA PRIORIDADE?
Dora hesitou e acabou decidindo-se logo.
- Guardião gostaria que me mostrasse a história da Terra, trinta anos antes da chegada do capitão Kirk. Quando chegar nesta etapa, avise-me, pois entrarei nela.
- AVISO – pronunciou-se o Guardião. – PARA PENETRAR NO TEMPO É NECESSÁRIO INFORMAR COORDENADA DE ENTRADA E SAÍDA, PARA QUE O VIAJANTE DO TEMPO NÃO SE PERCA EM UM CICLO.
- Ah! Certo Guardião! Esqueci-me que da primeira vez pediu-me isto. O tempo de entrada é ano 1930, mês agosto, dia 16, hora quatorze horas conforme calendário cristão gregoriano. O retorno é 1930, mês agosto, dia 17, dezoito horas. Compreendido?
- PARÂMETROS TERRESTRES ESTABELECIDOS. ATENÇÂO À SEQÜÊNCIA.
A máquina-viva resplandeceu no seu interior e uma rápida tela leitosa, cedeu lugar a uma sucessão de imagens vívidas.
- Por alguns segundos Dora ficou olhando-as hipnotizada até que quando viu a imagem certa, deu um pequeno impulso e saltou na direção delas.


No interior do Guardião.

O estranho planeta que deixara com sua baixa luminosidade fez com que seus olhos lacrimejassem até acostumaram-se com a claridade provocada pelo sol terrestre.
Não estava bem certa se viera à época exata, apesar de saber que os construtores do Guardião primavam pela exatidão.
Por sorte o local em que se materializara era bem isolado e desta forma não teria que se preocupar com a reação de olhos que testemunhassem sua súbita aparição. Afinal ela estava no século XX e sabia que fenômenos deste tipo poderiam atrair a atenção da polícia, alertada por pessoas ignorantes.
Ela vira fotos antigas da cidade de São Francisco e jamais imaginara que um dia estaria dentro de uma delas. O local era ainda uma mescla de construções levantadas no século XIX e novas do século presente. Previdente, fizera um levantamento da rua onde estava situado o abrigo onde o capitão e o senhor Spock haviam encontrado um quarto, conforme as gravações secretas. Para orientar-se trouxera consigo uma versão mais sofisticada do Tricoder que possuía muito mais recursos que o utilizado no tempo do capitão Kirk. Olhou à sua volta e notou que as ruas eram realmente desertas e contrastava com aquelas onde multidões circulariam no futuro. Sentiu-se em paz com a tranqüilidade que a localidade transmitia.
Foi então que se deu conta que estava trajando vestimentas incompatíveis com a época que vivia agora e teria que arranjar roupas apropriadas para as mulheres deste tempo para não chamar a atenção. Lembrou-se do relatório do capitão Kirk que relatara ter roubado roupas num dos becos da cidade para melhor poder passar despercebido aos habitantes da cidade e esta agora, deveria ser sua primeira providência.
Como se materializara nos subúrbios da cidade, caminhou um pouco e logo deparou com várias casas que possuíam em seus quintais varais cheio de roupas. Ficou sem coragem para roubá-las. No entanto, à medida que caminhava, mais e mais chamava a atenção por causa do uniforme da frota. Logo, pensou, alguém a denunciaria. Ficou mais confiante quando passou em frente a uma pequena loja que expunha numa modesta vitrine um manequim vestido com as melhores roupas femininas da época. Como não dispunha de dinheiro teria que engendrar um plano para ficar com ela.
Entrou calmamente na loja e não deixou de chamar a atenção de todos que lá estavam. As mulheres quando a viram, cochicharam entre si e Dora fez de conta que não era com ela. Aproximou-se de um rapaz que lhe pareceu ser o ajudante da loja e pediu-lhe para ver a roupa exposta no manequim.
- Perdoe-me pela minha aparência senhor, senhor?
- Smith, madame. John Smith. Eu me dirijo a quem?
- Ãh? Dora, Dora Stevens. Como eu estava lhe dizendo, minhas roupas são originárias da Mongólia, onde meu pai era um missionário cristão. Eu e minha mãe moramos muitos anos lá até à morte dele. Que Deus o abençoe! Chegamos à América ontem e hoje saí para comprar novas roupas para mim e para ela, entendeu? Aquela exposta na vitrine esta à venda?
O rapaz olhou-a espantando e depois para o patrão, que aquiesceu com um gesto.
- Claro senhora Dora, deixe-me mostrar-lhe um modelo igual.
Dora ficou encantada com a atenção do rapaz e de certa forma deleitou-se em examinar pessoalmente a vestimenta entregue. Tinha observado-as em museus, mantidas em condições especiais e jamais imaginara que um dia poderia manipulá-las e sentir o cheiro de tecido novo, de uma vestimenta que para ela possuía mais de trezentos anos. As viagens no tempo tinham esta estranha característica de confundir a mente, oferecendo oportunidades únicas.
Depois de alguma hesitação decidiu continuar a farsa.
- Por favor, poderia entregar neste endereço?
Ela pegou uma antiga caneta tinteiro e rabiscou o endereço onde Edith Keeler trabalhava como voluntária.
O rapaz deu uma olhada e anexou o pequeno papel ao vestido.
- Senhora, assim que o nosso rapaz de entregas chegar, eu o enviarei ao local. A senhora fará algum adiantamento?
- Oh perdão! Não costumo andar com dinheiro! O senhor sabe esta cidade é muito perigosa, pois receio ser assaltada. Assim que o rapaz chegar no endereço eu lhe darei o dinheiro. Combinado?
O atendente apenas concordou com um movimento da cabeça e passou à cliente seguinte.
Ela agradeceu e saiu da loja com um plano em mente. Esperaria o rapaz das entregas sair e usaria seu faiser em tonteio. Doía-lhe a idéia de fazer isto, mas não tinha escolha.
Ela observara que a loja remetia as mercadorias pelos fundos e provavelmente seria dali que seu vestido sairia.
Posicionou-se num trecho deserto próximo aos fundos e como esperado os acontecimentos transcorreram como havia previsto.
O rapaz não se deu conta do que o atingiu. Dora aproximou-se dele para certificar-se de que não sofrera nenhuma lesão, pegou o pacote, olhou em torno e afastou-se rapidamente.
Agora seria mais fácil passar despercebida no século XX, enquanto planejaria seus próximos passos no sentido de evitar a morte de Edith Keeler.


Tempo presente. A bordo da Enteprise.

O capitão Picard, como sempre, se posicionara numa das extremidades da mesa e dirigia-se aos atentos membros da tripulação. Primeiro o capitão lhes contou o suficiente do que era permitido pelo Comando sobre o que acontecera na época do capitão Kirk somado ao relato da doutora Dora. As suas tentativas frustradas de salvar Edith Keeler, até que tomara a decisão radical de tirá-la de seu tempo. Com isso criara um tempo alternativo do mesmo tipo que o capitão Kirk tivera que corrigir. Num ato extremo de desespero pedira ao Guardião que mantivesse o planeta num êxtase temporal, numa espécie de pausa atemporal, mantendo-o envolto num campo taquiônico para que a radical mudança no tempo que fizera, não afetasse a Federação. Por desconhecer muito de seu funcionamento, a própria doutora não soubera precisar por quanto tempo o campo taquiônico se manteria estável, antes de entrar em colapso, arrastando com ele toda a realidade que conheciam.
Ela tinha também atraído a atenção da Enterprise, com o falso pedido de socorro que enviara através do tempo, para que a nave fosse envolta pelo campo e mantivesse sua existência, caso a Federação já não existisse mais devido à sua interferência. De qualquer forma a nave estelar já estava inserida nesta linha temporal artificial, pois ela relatara que membros da tripulação, a tinham ajudado a retirar Edith Keeler.
Depois de algum tempo os tripulantes haviam se agrupado em duas correntes contrarias. O primeiro oficial Will Riker liderava a primeira e opunha-se a qualquer tentativa de mudar os acontecimentos. No seu entender por mais difícil que a situação fosse era uma vida contra a de bilhões.
Picard liderava a outra que tentava manter a história da Terra sem o sacrifício de Edith. A discussão chegou a um impasse e só foi solucionada quando especialista West pediu a palavra.
- Senhores e senhoras. Ouvi atentamente o que disseram e creio que tenho uma idéia que possa mesclar as duas opiniões. O que acham de pensarem numa forma de Edith “morrer” de mentira para que os fatos aconteçam da forma que a história registrou?
Todos olharam para West e depois entre si.
- Então o que acham da idéia? Poderia ser posta em prática? O fluxo temporal não seria alterado?
Data pediu permissão para falar.
- A idéia do senhor West capitão, parece ser a mais viável para romper este ciclo temporal. No entanto não estou bem certo de como Edith Keeler reagirá a este plano. Não sabemos o que aconteceu ao corpo dela. Não sabemos para onde foi levado e onde foi enterrado. E então surge a questão: como contornaremos esta parte?
- Concordo com o senhor, comandante Data – disse West - mas temos que aceitar este desafio e solucioná-lo o mais rápido possível, antes que toda a trama do universo conhecido se desfaça, pelo colapso do campo taquiônico.
- Com licença senhor West – pediu LaForge. – Já que o Comando não disponibiliza muitas informações sobre este período, devemos concluir pelo relato da doutora Dora, que a nossa participação, o que fizemos em fim, de certo modo tornou-se parte da história.
- Está é uma probabilidade muito grande senhor LaForge.
- A chance é de 93,567566 % de certeza capitão, disse Data.
O capitão Picard os olhou firmemente e procurou ser bastante enfático. – Então senhores, devemos agir com rapidez, mas com cautela sem desprezar qualquer detalhe que possamos antecipar, deduzindo que nossos atos se incorporarão aos registros desta época. Sei que isto deve exigir muito dos senhores, mas quero que entendam que o que está em risco e muito mais do que uma vida. Trata-se de uma existência. Se realmente prezamos o mundo que conhecemos, da forma como o conhecemos, todo o sacrifico se fará necessário.
Depois se virou para o primeiro oficial. – Senhor Riker. Sei que não concorda com essa decisão e em vista das circunstâncias sou obrigado a lhe pedir que junto com o senhor O´Brien, estudem com todo detalhe o local onde ocorreram os eventos com o capitão Kirk, principalmente se há indicação do hospital e ou do necrotério para onde o corpo foi levado. Qualquer detalhe que conseguirem serão de extrema importância.
Riker manteve-se circunspeto. Podia não concordar com o capitão, mas sabia obedecer a uma ordem.
Picard levantou-se, deu uma volta pela mesa e apoiou-se no encosto de uma das poltronas. – Senhores, quero deixar bem claro que não quero despertar quaisquer suspeitas de nossos antepassados deste século quando agirmos e muito menos chamar a atenção do capitão Kirk. Nossa performance deverá ser perfeita.
Depois olhou para a doutora Crusher. – Doutora... Sei que o que vou lhe pedir e antiético, mas, diante das circunstâncias e para que o plano flua bem é necessário que a senhora prepare Edith Keeler para enfrentar uma morte simulada, de forma que não fique nenhuma seqüela de caráter físico ou psicológico. Não quero que esta simulação deixe pistas ou traços da nossa tecnologia.
A doutora Crusher não escondeu seu espanto com o pedido do capitão, mas ela sabia que o que estava em jogo era o destino de bilhões de vidas e não poderia entrar num dilema moral e filosófico com o seu capitão. – Entendo Jean-Luc. Compartilho a idéia do primeiro oficial, mas farei todo o possível com minha equipe. Mas como o senhor Data ressaltou, há detalhes que me escapam. Não estou ainda entendendo muito bem como substituiremos a Edith Keeler dos registros pela “nossa”. Não sabemos quem a socorreu, quem a levou para o hospital e assim por diante. Tenho medicamentos que podem baixar o metabolismo parecendo uma quase morte. Mas este não é o problema capitão. É submetê-la ao impacto do veículo sem sofrer lesões corpóreas.
O capitão apenas trocou olhares com ela, esperando encontrar ali um sinal de consentimento, pois para ele a idéia de usar a própria Edith para simular a sua morte também lhe soava repugnante. E alguns dos detalhes que foram levantados tinham que ser contornados para o seu plano dar certo e assim restabelecer o fluxo normal do tempo.
- Capitão! – Pronunciou-se por sua vez Deanna Troi que desde o início fora a favor da idéia. – Há um outro aspecto que não estamos considerando!
- Qual conselheira?
- É a afeição que o capitão Kirk sentia por ela e ela por ele. Como sabemos, foi muito difícil para ele aceitar sua morte. Spock teve de usar o elo mental para que o seu capitão superasse o trauma da perda. Não podemos precisar o que ela fará emocionalmente quando a trouxermos para aquele exato momento que precedeu sua morte. Ela poderia não colaborar e entrar em contanto com Kirk, criando uma nova linha temporal desconhecida.
- Todos têm razão. É por isso que decidi realizar este reunião com o objetivo de usar suas habilidades para superar quaisquer tipos de obstáculos. Creio que temos pouco tempo e por isso peço-lhe para me trazerem idéias ou soluções que encontrarem para os problemas citados. E agora senhores, ao trabalho!


Tempo passado. Dentro do Guardião.

A doutora Dora que agora viajava pelo tempo em períodos pré-estabelecidos estava começando a perder-se em meio a tantas variáveis que determinados fatos criavam a partir de uma condição inicial dada.
Era essa, de acordos com os registros do Tricoder, a vigésima sexta tentativa de salvar a mulher que se dispusera a salvar a qualquer custo. No entanto todas as vezes que assim procedia toda a trama modificava-se de tal forma que a partir de um núcleo central ela sofria desdobramentos inimagináveis e descontrolados e Dora tinha que partir da estaca zero novamente. E sempre aparecia uma força misteriosa alterando o que fazia. Estaria o tempo tomando suas próprias decisões apesar de sua interferência?
Em algumas situações ela quase que conseguira, mas um fator não computado acabava por mudar a história da Terra de tal forma que era inaceitável para ela. Com muito custo concertara as variáveis e quando o fazia a resposta era sempre a mesma: Edith Keeler tinha que morrer.
Foi então que imaginou algo nunca tentado antes. Raciocinara da seguinte forma. Edith Keleer não poderia viver o suficiente para criar o movimento pacifista que retardaria a entrada dos Estados Unidos na II Guerra Mundial e permitir a vitória da Alemanha. Ela não precisaria morrer, somente deixar de existir. Portanto se ela não nascesse deixaria de existir e o doutor McCoy não alteraria o rumo da história.
Fez então a última e desesperada tentativa de impedir que os pais de Edith Keleer se conhecessem e se casassem. Infelizmente eram escassos os registros do período anterior a ela e a vida dos seus progenitores não representava um ponto focal na história para que pudesse utilizar o Guardião da mesma forma como vinha fazendo.
Segundo o diário de bordo, uma única vez, Edith dissera ao capitão Kirk que sua mãe se chamava Melvy e trabalhava como enfermeira num grande hospital da cidade. Quanto ao seu pai apenas o detalhe de que ele conhecera sua mãe no dia do grande terremoto que abalara a cidade. Tentou obter informações pelo computador da Kepler e só obteve pequenas referências sobre o terremoto de 1906. Era muito pouco.
Neste ano a cidade de São Francisco fora arrasada por um terremoto no dia 18 de abril às 13:12. Poderia utilizar esta coordenada para tentar encontrar um deles e evitar que se conhecessem. Havia, é claro, o perigo representado pelo próprio terremoto. Teria que chegar lá antes dele começar, fazer o que se propunha e retirar-se antes do seu início. Estava ciente dos perigos e os dados que conseguiu do computador da Kepler eram insuficientes para uma empreitada deste porte. Mas teria de se contentar com eles, pois muitos dos registros oficiais anteriores à III Guerra Mundial tinham sido destruídos.
Ditou as coordenadas de entrada e saída para o Guardião e pulou para 1906. Ainda era de manhã e tinha algumas horas pela frente. Decidiu procurar o hospital principal da cidade valendo-se das informações de várias pessoas que encontrou pela rua. Gostaria de salvar todas da catástrofe iminente, mas alterar a linha do tempo, poderia trazer conseqüências inimagináveis.
Para encontrar a mãe de Edith, só indagar pelo primeiro nome poderia levar à pessoa errada, o que a faria perder tempo precioso. Mas a chance de uma Melvy trabalhando em um hospital reduzia as opções, facilitando o trabalho de busca.
Depois de vários dias, indo e retornando no tempo, para evitar o terremoto encontrou finalmente o hospital, onde trabalhava uma enfermeira com este nome.
A direção informou que ela começava o seu plantão às doze horas. Teria de esperar por ela ou voltar numa outra ocasião.
Dora decidiu esperar ciente de que uma hora e doze minutos depois o terremoto aconteceria. Instruíra o Guardião a removê-la antes disso, por isso teria que ser convincente. Não podia voltar um dia atrás, pois era nesta data que os pais de Edith se conheceriam. Havia muita coisa em jogo e teria de que agir de acordo com o que planejara.
Faltando dez minutos para o meio-dia, Dora foi avisada de que Melvy chegara.
Ela viu de longe quando o homem do balcão falou com a enfermeira e apontou o dedo na sua direção. A mulher ficou ali parada tentando reconhecer em meio às outras pessoas quem era sua prima. Então ela juntou forças e dirigiu-se na direção dela.
- Enfermeira! Enfermeira! Podemos conversar?
- Em que posso ajudá-la senhora? Senhora?
- Dora. Meu nome é Dora Stevens.
A mulher a olhou desconfiada. – A senhora disse que é minha prima? Por parte de quem? Do tio Joe de Arkansas?
Dora baixou a cabeça fingindo um certo embaraço – De uma forma sim! É que o tio Joe antes de se casar namorou uma outra moça e eu sou sua filha!
Melvy ficou surpresa. – O tio Joe! Quem diria?
- Eu preciso de sua ajuda. – disse Dora.
- Já sei. Precisa de um lugar para ficar até resolver sua situação, não é?
- Não! Não é isso. - disse Dora calmamente. – É a respeito da... Sua filha.
A enfermeira arregalou os olhos.
- Filha! Não sei do que está falando prima. Eu não sou casada!
- Escute Melvy pode parecer loucura... Mas o que trouxe até aqui é muito importante! Apenas me escute. Podemos ir para um lugar mais reservado?
A futura mãe de Edith concordou e a levou até uma pequena sala vazia. Dora antes de entrar observou veladamente o relógio do corredor. Em uma hora esgotaria o seu período de tempo e o Guardião a retiraria desta seqüência. Por isso tinha que ser rápida.
Melvy fechou a porta e a olhou atenciosamente. – Escute. Escute muito bem. Eu venho de uma outra época e no futuro você dará à luz a uma bonita menina.
A enfermeira continuou olhando-a cada vez mais desconfiada.
- Essa menina não pode nascer.
O que?!!!
- Como explicar isto de forma que entenda? – disse Dora ansiosa.
- Olhe... Ela não pode terminar a frase. Um estrondo forte cortou suas palavras e as duas olharam-se assustadas. Tudo começou a tremer e a cair.
Dora ficou surpresa. Os registros. Era uma falha dos registros. Um tremor precedera o principal que ocorreria em uma hora e não havia menção sobre isso. Tinha acertado as coordenadas de saída pelo que pudera obter e agora era vítima de sua própria decisão. Ela tinha que sair dali ou acabaria morrendo esmagada pelo desabamento do teto.
Tentou chegar à porta, sob uma chuva de detritos e poeira que caiam do teto. A mãe de Edith com o pavor estampado no rosto segurou-se nela e Dora era a única que ainda conseguia pensar como escapar dali.
O tremor logo cessou, mas um forte ranger de algo se partindo chamou sua atenção. Do teto uma enorme viga despencou e caiu na direção de Melvy. Dora com muito sangue frio atirou-se para perto da parede tentando empurrar a mulher na sua frente, para que a viga não a atingisse. Mas foi lenta demais. A viga estatelou-se no chão, esmagando o corpo da enfermeira. Mas o perigo não cessara. A outra viga estava suspensa, entrelaçada em duas madeiras menores e pendia num delicado equilíbrio momentâneo. Se não saíssem dali todo o resto do teto acabaria por desabar sobre sua cabeça, esmagando-a, como fizera com Melvy.
Ela tentou abrir a porta, mas ela estava emperrada. Desesperada forçou a porta com o corpo sem muito sucesso. Então começou a bater nela e pedir por socorro. Foi quando ouviu uma voz do outro lado.
- Vocês estão bem? Quantas pessoas estão ai?
- Eu somente. Pode-me ajudar a abrir a porta? O teto esta para cair!
Dora juntou o resto de força que tinha e com a ajuda do estranho deslocou a porta para fora, o suficiente para uma pessoa de cada vez passar.
Assim que ela passou para o corredor, o tremor principal começou e a outra viga cedeu e tudo veio abaixo num forte estrondo. Os dois se apressaram evitando os destroços e chegaram aos jardins que contornavam o hospital, repletos de pequenas escoriações e cobertos de pó. Dali olharam para trás e viram horrorizados, o restante da cobertura do hospital desabar, matando todos os que não tinham conseguido sair. Então em meio a todo aquele caos ela entendeu. Mais uma vez o que mudara não era exatamente o que tinha de acontecer. Não salvara a mãe de Edith o que não permitiria o seu nascimento. Indiretamente conseguira o que queria. Mas aos se lembrar da enfermeira e da futura Edith, uma sensação estranha a invadiu.
Resignada olhou em volta. A destruição era grande e muitos edifícios estavam em chamas. Olhou os arranhões e cortes que fizera nos braços, à procura de algo grave, mas felizmente não tinham sido graves. Depois voltou sua atenção para o homem que a salvara.
- Você está bem? Como se chama?
Ela virou-se para ele para lhe agradecer o ato de coragem que salvara a sua vida.
- Agradeço o que fez por mim. Meu nome é... D... Melvy. E o seu?
- Meu nome é John. John Keeler senhora. Às suas ordens.
Dora sentiu um frio no estômago e controlou-se para não perder o equilíbrio. Não pudera impedir o encontro dos pais de Edith. Na verdade, não poderia impedir o nascimento de Edith, já que ela seria sua mãe. Seus atos estavam inseridos na trama que permitira o contato de ambos e posterior desenrolar dos fatos que já conhecia e tentara evitar. Com a voz cansada dirigiu-se ao homem.
- Sabe? Foi um milagre o senhor ter aparecido. Não sei como me achou ali, mas sou lhe grata.
Ele a olhou curiosamente e fez um sinal afirmativo.
Dora, a futura Melvy se levantou e olhou para os dois e todo redor. Passou a mão pelos cabelos desalinhados e bateu na roupa para tirar um pouco do pó. E seguiu em frente sem olhar para trás aguardando o momento de ser removida pelo Guardião. Estava decidida a agir da única forma que lhe restara. Teria que voltar e dar prosseguimento aquele encontro. Teria que viver uma vida ao lado do homem que a salvara. Até que pudesse retornar e resgatar sua filha. Era o melhor que podia fazer. Jamais conseguiria salvar a enfermeira, mesmo que voltasse no tempo. Quem nascesse, mesmo que conseguisse salvá-la, não seria a Edith que conhecia.
Para John Keeler, a ida e o retorno de Dora, nunca ocorreu, tamanha era a complexidade do tempo e a sofisticação do Guardião. Mas assim que voluntários apareceram para prestar socorro à vítimas, ele afastou-se e tirou um pequeno aparelho do bolso e sorriu. Tudo estava correndo conforme o planejado. Encontrara a mulher que seria a mãe de Edith Keeler. A sua linha temporal estava garantida. A história não seria alterada e a Alemanha ganharia a II Guerra Mundial.


Tempo presente.

O capitão Picard aproximou-se da cabine da doutora Dora e pediu permissão para entrar. Assim que o fez seus olhos cruzaram-se com os de Edith.
- Doutora! Creio que encontrei uma solução para este dilema temporal. Pedi aos membros da minha tripulação que me ajudassem, mas sem o apoio de Edith ela não será viável.
- Por que ela capitão? Com qual propósito?
- Posso me sentar, doutora?
Dora olhou para ele envergonhada. – Desculpe-me a falta de educação capitão! É claro que pode. Perdoe-me se a esqueci, mas o senhor não faz idéia do que passei nestes últimos anos... Oh! É claro que estou falando de anos dentro de minha linha temporal, não da sua. Estou muito abalada pelo que fiz e pelo que ainda possa acontecer.
Prometi a mim mesma, no entanto que Edith, de forma alguma seria sacrificada.
- Não será necessário chegarmos a tanto doutora. Nossa idéia é manter os acontecimentos que ocorreram na presença do capitão Kirk de acordo com os registros secretos.
- Mas eu não vejo outro modo dos fatos não serem alterados se não pelo sacrifício que me recuso a fazer.
- Garanto-lhe novamente doutora, que isto não ocorrerá.
Que modo seria este então? - perguntou a doutora com bastante ansiedade na voz.
- Bem, doutora! Chegamos à conclusão que a melhor forma de mantermos a história inalterada seria colocarmos de novo Edith, diante do veículo que a atropelou. A diferença, desta vez, estaria no fato de que minutos após o acidente, ela seria substituída por uma outra Edith. Ela será previamente preparada por nós para enfrentar o acidente fatal que a vitimou sem alterar os acontecimentos que o capitão Kirk presenciou.
Em seguida o senhor Riker e o senhor O´Brien se apresentariam como cidadãos voluntários, tomando a louvável iniciativa de escoltar a “acidentada” até o hospital. Sabemos que ela foi atropelada por um veículo da época denominado caminhão. Lá faremos a substituição de seu corpo enquanto a verdadeira Edith voltaria para a nossa época.
- Mas capitão! – interrompeu Dora, - estou apreensiva por dois motivos. Como vão simular sua morte? Eu me recordo de pessoas atropeladas naquela época e a maioria das mortes era ocasionada pelo arremesso do corpo para longe do veículo. Como vai impedir que nada sofra quando isso acontecer?
- Estamos pensando numa solução para isto, doutora.
Dora o olhou friamente. – E não é só isso capitão. O que acontecerá quando descobrirem que seu corpo sumiu juntamente com os homens que a levavam ao hospital? Já pensou neste detalhe?
- Não doutora. Mas como não temos registros do que aconteceu depois, creio que fizemos a história acontecer do que jeito que deveria. Não considerei ainda estes detalhes, mas estou trabalhando para resolvê-los e um deles e preparar Edith para o que irá acontecer.
Dora desconsolada sentou-se na poltrona e Edith encostou-se nela para lhe dar apoio emocional.
- Estou curioso quanto a uma coisa doutora: como Edith Keeler tornou-se parte de todo este ciclo temporal? Essa parte, a senhora não me contou.
Edith ajudou Dora a ajeitar-se na poltrona e virou-se para Picard. – Creio que posso lhe explicar capitão. Apesar de ser uma civil posso chamá-lo pela patente?
- Não é necessário senhorita. Apenas me chame de Picard!
- Ah, sim! Capitão, digo Picard! Minha mãe foi uma enfermeira chamada de Melvy Keeler. Antes de desaparecer no mar, ela contou-me como foi salva no dia do terremoto por meu pai que aparentemente surgira do nada.
- E o como foi isso? – perguntou Picard.
- Ela me disse que quando ocorreu o grande terremoto de S.Francisco, em 1906, jamais virá meu pai antes e tem certeza, de que ele não estava ali antes, pois ficou na entrada por um bom tempo. De qualquer forma, se não fosse por ele, eu não teria nascido.
Dora levantou-se novamente.
- O senhor entende agora como é difícil lidar com as variantes do tempo, capitão? Na minha obsessão por mudar a linha temporal, acabei sendo a agente que a traria a este mundo.
Resolvi não mais tentar mudar os acontecimentos. Descobri amargurada que, quanto mais tentasse agir para alterar o desenrolar dos acontecimentos, mais eles estariam inseridos na trama do tempo. Então, depois que descobri que era sua mãe, tomei a decisão radical de tirá-la daquela rua. Apenas uma vez, transgredi esta regra novamente, quando simulei minha morte, desaparecendo nas águas do Pacífico.
- Há um detalhe que não lhe perguntei doutora.
- Qual capitão?
- O que houve com John Keeler?
Ele morreu na I Guerra Mundial. Apesar de gostar dele, nunca conheci sua família. Apenas me disse que haviam morrido, quando era pequeno e que fora criado num orfanato. Ele sempre procurou falar pouco sobre seu passado, dizendo-me que não havia muito que saber.
- Minha mãe ficou muito chocada quando recebeu a notícia de seu desaparecimento em ação na França – disse Edith. - Ela sofreu muito com isso. Foi esta a razão que me fez tornar uma pacifista.
Picard ficou pensativo por alguns segundos e fez outra pergunta.
- A senhora também me disse que de certa forma já conhecia a Enterprise. Como foi que a conheceu?
- Bem capitão, eu jamais pisei na Enterprise. Mas quando resolvi tirar Edith do caminho que a levaria aos acontecimentos que já conhecia, recebi a visita de dois homens que se diziam membros da tripulação da sua nave. Eles apenas me disseram que eram da Enterprise e que cuidariam de tudo a partir daquele momento. Perguntei-lhes angustiada se eles tinham vindo para impedir que levasse Edith, mas para minha tranqüilidade concordaram com a minha atitude e nada fizeram para impedir-me. Sem hesitar, mais uma vez, como já fizera em outras realidades, apresentei-me à Edith e ordenei que o Guardião nos tirasse dali.
- Mas isto não teria alterado todo o futuro, impedindo o surgimento da Federação e da Enterprise?
- O paradoxo foi contornado graças aos recursos com os quais os construtores do Guardião o dotaram. Ele possui mecanismos que o nosso conhecimento científico mal arranhou, capitão. Por isso não saberia explicar-lhe em termos que entenderia, ou que eu pudesse entender. Só sei que ele ativou algum tipo de campo atemporal no exato momento em que alterei nossa linha temporal, de forma que a Enterprise fosse envolvida por ele e continuasse existindo no seu interior como produto de uma realidade paralela. Fora dele, todo contato com a realidade da qual viera não seria mais possível.
- E o que fez o planeta desaparecer?
- Acredito que o campo atemporal, uma vez ativado, deslocou o planeta para todos os tempos possíveis sincronicamente.
- Isto explicaria a tremenda necessidade de energia que a estação cento e nove detectou.
- É provável que seja, capitão. Tanto movimento espaço-temporal precisaria dobrar o espaço ao seu redor com muita energia extra que só a anã branca poderia proporcionar.
- E quanto à mensagem que recebemos?
- Ah! Isto eu fiz antes do Guardião retirar-me de lá, com Edith. Como sabia que viriam usei o meu comunicador antes de sair e enviei duas mensagens: a primeira de socorro e a segunda para que se aproximassem do planeta, pois sabia que seriam envolvidos pelo campo atemporal.
- Isto explicaria a mensagem vinda do passado que os sensores captaram! Uma idéia engenhosa doutora Stevens! Mas agora, como sabe, estamos numa corrida contra este mesmo tempo. Não tenho dados para saber por quanto tempo o campo que nos envolver aguentara. Caso ele entre em colapso tudo que conhecemos deixará de existir. Por isso vim até aqui. Preciso que Edith me escute e me ajude uma última vez.
Ela olhou para a doutora Dora sem entender o que o capitão dissera. – Está tudo bem querida. Ouça o capitão Picard atentamente. Veja como pode ajudá-lo.
Diante da reticência dela, Dora abraçou-a carinhosamente. – Entenda Edith, o capitão só que nos ajudar. Eu não vou perdê-la novamente. Faça o que ele lhe pedir.
- Senhorita Edith, sei que foi de certa maneira, retirada do seu meio e conduzida a um mundo que jamais imaginara. A doutora não fez isto por egoísmo e sim por amor. No entanto, emocionalmente envolvida, não mediu as consequências de seu ato e agora estamos numa situação muito delicada. Estamos na verdade num impasse. E só você Edith, poderá nos ajudar a interrompê-lo.
- Está pedindo que me sacrifique Picard? Que eu de minha vida pelo bem da humanidade? Que aconteça comigo o que a doutora tentou evitar? Não tem idéia de como foi difícil aceitar o que ela disse quando nos conhecemos pela primeira vez. Uma morte sem sentido, apenas para evitar acontecimentos que eu nem tenho certeza de que realmente seria a causadora! E o homem que amei? Meu Deus, eu... Eu já nem sei mais... O que é certo ou que é errado... O que devo ou não fazer.
Ele relaxou o corpo e deixou os braços caírem, desalentado. Depois segurou os dois ombros de Edith e falou pausadamente. – Não Edith! Não vim aqui para pedir-lhe isto. Trairia tudo que dou valor também. Apenas lhe peço que confie em mim. Arranjaremos um jeito para que nada lhe aconteça e para que a história seja preservada.
- Quer que eu volte para lá então?
- Sim. Mas será como representar em um teatro. Tudo será simulado e você não sofrera um arranhão.
- Eu voltarei para a doutora?
- É uma promessa que lhe faço, Edith.
- Mas capitão! Como pretende levá-la e mantê-la viva? - interferiu Dora.
- Meus melhores tripulantes estão trabalhando nisto doutora. Eu lhe garanto que conseguirão superar esta dificuldade. Só peço mais uma vez que as duas confiem em mim e nos que estão ajudando.
Edith olhou para ela e depois olhou para o capitão, movimentando a cabeça em sinal de concordância.
- Muito bem Edith. Primeiro eu quero lhe apresentar a conselheira Deanna Troi para que tenha uma conversa com ela. Depois a levarei ao senhor LaForge e por último à doutora Crusher. Eles serão os responsáveis pelo seu retorno e por sua saúde. Está pronta para caminhar comigo?
Edith suspirou e abraçou a mãe. Depois abraçou o braço que Picard lhe estendera e seguiram juntos até ao camarote da conselheira.
Assim que a porta abriu-se uma jovem morena atendeu. Ela olhou para os dois e fez um gesto para que entrassem.
- Conselheira. Esta é, Edith Keeler. Edith, esta é a nossa conselheira betazóide, Deanna Trói.
- O que é uma betazóide, Picard? – perguntou Edith curiosa.
- Olá, Edith! – Deanna segurou a mão da moça, afastando-a do capitão e calmamente a fez sentar-se.
- Betazóide é nome do povo ao qual pertenço. Somos de um planeta, longe do seu. E...
Picard sabia que havia deixado Edith em boas mãos e então rumou para a engenharia, para ver se encontrava uma maneira de salvar-lhe a vida. Chegando lá, Data se apresentou.
- Sim Data?
- Se o senhor me permite eu tenho uma idéia de como preservar o corpo da srta. Edith do impacto provocado pelo atropelamento.
- Qual seria ela, Data?
- Poderíamos acoplar ao corpo de Edith Keeler, um campo de deflexão individual Borg.
- Poderia explicar melhor isto, senhor Data?
O plano em si era simples, mas envolvia uma certa dose de ousadia. No momento do “atropelamento” o dispositivo Borg seria automaticamente acionado, envolvendo-a num campo protetor, invisível. Apesar da energia cinética ser transferida para seu corpo, arremessando-a, ela não sofreria nenhum dano orgânico. Teria que ser atendida rapidamente por membros da tripulação “, plantados” no local, para receber uma injeção preparada pela doutora Crusher que diminuiria seu metabolismo, provocando uma “morte” aparente.
Picard ouviu atentamente e decidiu-se pela sugestão de Data.
LaForge adiantou-se. – Resta apenas um problema senhor.
- Estou ouvido, senhor LaForge.
- Precisamos preparar a srta. Edith no uso do dispositivo. Não estamos bem certos de que modo ela reagirá no momento do acidente para que pareça “natural”. Ela não passou pelo treinamento da Frota e isto me preocupa senhor.
- Bem, senhor LaForge! Em vista do nosso tempo curto, teremos que fazer o melhor. Eu já a encaminhei a conselheira que lhe dará todo o respaldo psicológico. Depois eu a deixarei em suas mãos para que juntamente com o comandante Data, ela possa se inteirar do dispositivo e adaptar-se a ele.
- Há mais uma coisa que me ocorreu, senhor! – falou o andróide.
- Qual seria, senhor Data?
Enquanto imaginávamos um meio de proteger a srta. Edith, utilizei parte do meu cérebro positrônico e fiz uma reavaliação da estrutura e funcionamento do Guardião. Calculei que seria factível acoplar um dispositivo de teletransporte nele, senhor. Isto nos permitiria uma locomoção mais independente do fluxo temporal.
Picard olhou para LaForge e depois para Data. – Concorda com ele, senhor LaForge?
O engenheiro chefe meneou a cabeça de uma forma que o capitão, já conhecia quando manifestava algum tipo de dúvida.
- Bem capitão eu ainda não fiz os cálculos, mas como Data consegue processar informações mais rapidamente, creio que será possível. Poderíamos usar o Guardião apenas como um suporte básico. Mas teríamos liberdade para entrarmos e sairmos das coordenadas que quiséssemos.
- Ótimo! Implementem e mantenham-me informado.
Picard rumou para a ponte com o objetivo de saber como estava a pesquisa do seu imediato.
Assim que adentrou a ponte encontrou-o em frente a um dos console próximo da porta pesquisando sobre o que capitão pedira.
- Conseguiu alguma informação, imediato?
- Sim capitão. Já tenho as informações que foram relatadas pelo capitão James T. Kirk, conforme o senhor liberou. Infelizmente ele não citou as coordenadas com muita precisão e nem o tipo exato de “caminhão” que atropelou Edith Keeler. Quanto às roupas da época já pedi para sintetizaram uma para mim e outra para o senhor O´Brien. Peço permissão para irmos até lá embaixo senhor e usarmos o Guardião para coletar mais dados.
- Este passo é realmente necessário, imediato? Eu sei que precisamos coordenar nossas ações com precisão, mas fico relutante em autorizar uma viagem exploratória devido aos riscos de mudarmos mais ainda nossos destinos.
Riker coçou a barba e olhou fixamente para o seu capitão.
- Bem senhor! Eu creio que se não fizermos o que pretendemos fazer da forma mais exata que possamos, os riscos de fazermos algo errado é ainda maior. No entanto respeito seu ponto de vista e deixo a decisão a seu critério. Devo lembrá-lo, no entanto, que dispomos de pouco tempo. Não sabemos quando o campo atemporal entrara em colapso.
Picard retesou o corpo e puxou a parte de cima do uniforme. Riker sabia que era essa a forma costumeira do seu capitão de reagir a uma tomada de decisão que às vezes contrariava seus instintos. Então aguardou pacientemente ele falar.
- Concordo com você, Will! Apesar dos riscos creio que para que tudo corra conforme planejamos esta é a decisão correta a ser tomada. No entanto...
- No entanto... Capitão?
- O comandante Data disse-me que imaginou um dispositivo que poderia acoplar ao Guardião permitindo que além de projetarmo-nos no tempo poderíamos nos projetar no espaço com precisão. Eu gostaria que você executasse essa missão após a construção deste dispositivo.
Riker levantou-se do assento em frente ao console e empertigou-se por sua vez. – Mas, isto não demandaria muito tempo... Muito mais do que teríamos?
- Concordo. Por outro lado, creio que o comandante Data e o senhor LaForge, conseguirão com uma equipe da engenharia montar o dispositivo rapidamente, já que dispomos de um bom suprimento extra de materiais à nossa disposição.
- Muito bem senhor, será então desta forma. Pedirei aos dois para acelerarem o dispositivo e assim que tiver funcional implementarei a incursão.
- Outra coisa imediato!
- Sim capitão?
- A doutora Dora mencionou membros da Enterprise encontrando-se com ela, quando do resgate de Edith. Acredito que estes membros sejam o senhor e o chefe O´Brien na fase final do nosso plano.
- Ela mencionou outros encontros, senhor?
- Não imediato! É sinal que sua incursão para sondarmos o local transcorreu sem transtornos e espero que continue assim.
- E quanto à participação de Edith Keeler, senhor!
- Data encontrou uma saída, imediato.
- Qual seria senhor?
- Usaremos um campo defletor Borg para minimizarmos o impacto do veículo no corpo da srta. Edith. É claro que ela teria que participar ativamente do acidente e eu conto com a experiência da conselheira para superar esta dificuldade.
- Capitão, Edith Keeler é uma típica mulher do século XX e temo em pensar como sua mente reagirá ao papel que terá de desempenhar para que tudo ocorra conforme planejado. De repente ela poderá correr para o capitão Kirk frustrando todo o nosso plano. Ou até recusando-se a participar por puro medo.
- Estou ciente disto, Will e confio no suporte que Deanna dará a ela para que não falhe nos eventos que se desenrolarão.
- Bem senhor. Ainda resta sabermos como irão reagir as pessoas que presenciarão a cena do atropelamento e é claro, a reação do motorista do veículo.
- Quanto a isso Will, conto com sua criatividade para contornarmos esses detalhes.

Deanna conversara longamente com Edith, explicando-lhe como funcionava o mundo para o qual foi trazida. Quais eram os valores morais que prevaleciam, como funcionava a Frota, a Federação e os incontáveis mundos que davam sua contribuição a um sistema que parecia funcionar melhor do que o mundo do século XX. E que tudo isto deixaria de existir, dependendo única e exclusivamente da ação que ela escolhesse. Falou-lhe que apesar de execrar a violência, o caminho que escolhera para a convivência pacífica e a não interferência dos Estados Unidos levaria a Terra a uma nova guerra mundial muito mais violenta que acabaria com a vitória da Alemanha, mudando todo o destino da história.
Apesar de estarem imbuídas das melhores das intenções, elas se voltariam contra todo o seu povo e o que mais prezava. Seu papel era fundamental no desenrolar destes acontecimentos a menos que não participasse deles. E fora trazida não para se sacrificar, mas para dar uma chance melhor a Terra.
E a conversa continuou por um bom tempo onde Edith falou do único amor que conhecera e que seria difícil para ela, sabendo o que sabia agora, não correr para os braços do homem que amara de verdade, pedindo-lhe que a levasse daquele mundo.
A conselheira explicara-lhe que certos eventos chaves da história da Terra não poderiam ser modificados, coisa que sua mãe tentara inúmeras vezes, conduzindo a história para desfechos diferentes daqueles registrados como conheciam. Os fatos tinham que ocorrer da forma como estavam registrados e se ela amava seu mundo e muito mais o homem que conhecera este seria o sacrifico maior que teria que fazer.
Edith aceitou seu destino e foi conduzida a enfermaria pelas mãos gentis da conselheira.

A doutora Crusher recebera Edith deixando-a a vontade na enfermaria, pois sabia que só poderia ter a sua cooperação se ela se sentisse confortável. Sabia que aquela mulher trazida repentinamente de uma outra época precisava de todo apoio emocional possível para adaptar-se a nova situação.
- Então querida posso examiná-la?
Edith teve um sobressalto. – Eu, eu... Para que doutora?
- Apenas para ver se está tudo bem com você. É apenas um exame de rotina. Garanto-lhe que nada sentirá.
- Mas, mas eu... Terei que tirar a roupa na frente de todos os seus... Seus enfermeiros?
Crusher achou engraçada a ingenuidade de Edith, mas manteve a postura profissional.
- Não querida! Isto não será necessário. Basta deitar ali e eu passarei sobre você um pequeno scaner portátil que fará uma análise de sua saúde. Fique tranqüila.
Edith não era uma mulher comum. Ela aprendia rápido, e percebeu que fora infantil na sua reação. Era evidente que muita coisa mudara no futuro e que as referências da sua época já não seriam mais válidas. Ela que fora uma mulher visionária no seu tempo, tinha que se adaptar para não parecer uma mulher ultrapassada.
Assim que terminou o exame, a doutora Crusher, falou pausadamente com ela.
- A sua saúde é perfeita Edith. Com base nos dados que recebi irei preparar um componente químico adaptado para as suas condições físicas que diminuirá sua respiração, o batimento de seu coração, de forma que cairá num sono profundo.
- A inoculação é feita do mesmo modo como no meu século doutora?
- Muito bem Edith! Você é bastante perspicaz! Não, não usamos mais seringas e agulhas. Trata-se de penetrar a pele sob alta pressão concentrada. O composto se injetado na altura do pescoço logo alcança o cérebro em questão de segundos, levando a inconsciência.
- Então, quando o veículo vier na minha direção, deverei aguardar o choque e jogar-me no chão até que alguém me inocule o preparado?
- Exatamente Edith! Isso mesmo! Tenho certeza que LaForge e Data cuidarão para que não sinta o veículo e que Will estarão ali para que nada lhe aconteça. Eles cuidarão de tudo. Se concordarem, estarei ali, do seu lado, injetando o preparado e ajudando-a a ser trazida de volta. Mais confiante agora, querida?
Edith pensou um pouco e depois respondeu. – Vocês todos me parecem bastante familiares agora. Sinto-me segura em suas mãos.


Tempo Passado.

Dora voltou à cidade, da qual tinha sido retirada pelo Guardião anos depois. Chegou à conclusão que seus esforços sempre seriam em vão. Que ela sozinha não poderia conseguir o que mais desejava e quase sem forças relutava em prosseguir.
Como fizera nas vezes anteriores, decidiu tirar Edith da rota do caminhão, sem pensar mais nas conseqüências para o mundo que conhecera. Voltou àquela rua segundos antes de Edith atravessá-la na direção de Kirk e de McCoy. Só que desta vez um fato inédito aconteceu. Dois homens, um alto, que usava uma barba bem cuidada e um outro, de cabelos loiros encaracolados e mais baixo que o primeiro, surgiram na sua frente. Dora achou que eram viajantes do tempo que, como ela, estavam ali para corrigir o que ela viera fazer. Sentiu um misto de angustia e perplexidade quando o homem de barba lhe perguntou se seu nome era Dora Stevens e se esta era a última tentativa de salvar Edith Keeler.
Dora hesitante balançou a cabeça em sinal de concordância e respirou aliviada quando o ouviu dizer que eram membros da tripulação da nave U.S.S Enterprise e que resgatasse sua filha, deixando o resto por sua conta deles.
Ela não pensou duas vezes e nem olhou para traz. Correu na direção da mulher que viera salvar, interceptou-a antes que começasse a atravessar a rua.
– Oi Edith! Sei que tudo lhe parece muito estranho. Eu sou sua mãe e quero explicar-lhe tudo com muita calma. Só peço que me dê chance de fazer isso.
Edith, sem entender muito bem o que estava acontecendo, desviou seu olhar do homem que amava para a mulher que a tirara bruscamente do caminho.
- Antes de me explicar deixe-me enviar duas mensagens...


Tempo presente.

Diário de bordo. Data estelar 43001.8. O engenheiro da nave, juntamente com o comandante Data desceram à superfície do planeta do Guardião, acompanhados de uma equipe de técnicos para acoplarem ao artefato alienígena um teletransporte que nos permita deslocarmo-nos não só no tempo como também no espaço. A construção deste dispositivo é de vital importância para o plano que elaboramos para evitar mudanças na linha temporal que conhecemos.
Continuamos a monitorar o campo atemporal que nos envolve e não sabemos por quanto mais ele se manterá estável antes que entre em colapso.
Estamos acelerando ao máximo nossos esforços para completarmos nossa missão antes que isto aconteça.

Will Riker já ouvira alguns boatos sobre o Guardião e do que ele seria capaz de fazer. Mas nunca dera muito crédito a estas estórias. Até agora. Jamais imaginara, entretanto, que um dia seria levado pessoalmente à sua presença e conduzido até ao século XX para participar de uma das mais estranhas missões de que já realizara a bordo da Enterprise.
- Então senhor LaForge, o senhor garante que com esse dispositivo seremos transportados para as coordenadas espaços-temporais que queremos?
LaForge conhecia muito bem Will Riker e sabia que ele não era um covarde, mas um homem bastante astuto que gostava de planejar os passos que dava.
- Fizemos alguns testes e tudo funcionou corretamente senhor.
- Foi Data quem imaginou este dispositivo, não foi senhor LaForge? Onde ele está?
Embora os olhos de LaForge não pudessem ser vistos por causa do visor que o ajudava enxergar, cada gesto que fazia com ele, substituía a expressão que poderia se depreender caso eles fossem visíveis.
- Está ali parado senhor. Conversando com o Guardião.
Riker olhou para trás e notou o andróide a vinte metros de onde estava, parado diante do Guardião como uma criança na frente de um doce.
- Você não consegue lembra-se de seus construtores, Guardião?
- O ACESSO AOS MEUS CONSTRUTORES JÁ NÃO ERA POSSÍVEL MUITO ANTES QUE A SUA ESTRELA COMEÇASSE A BRILHAR.
Data gravou os dados no seu cérebro positrônico e continuou a perguntar como se não houvesse urgência na situação que os trouxera até ali.
- Não há quaisquer imagens nos seus circuitos da natureza de seus construtores? Eram identidades que poderia definir como orgânicas ou artificiais? Elas tinham qual propósito quando o criaram?
- Senhor Data! Senhor Data!
Data repentinamente saiu da absorção que o Guardião lhe causava e procurou localizar de onde vinha o chamado. Logo o encontrou.
- Pois não senhor?
Riker sabia que o andróide a sua frente era como o Guardião: já havia transposto a barreira de uma simples máquina para a complexidade de um ser vivo. Ciente disto costumava se dirigir a ele como um amigo e um membro normal da tripulação, só usando o protocolo da Frota quando em serviço.
- Perdoe-me a distração senhor. Considerei ser esta, uma boa oportunidade para analisar o Guardião.
- Talvez numa outra ocasião, senhor Data. No momento temos assuntos mais urgentes para resolver. Segundo o senhor LaForge o teletransporte temporal já pode ser utilizado. Eu lhe peço que faça uma revisão geral para que eu e o senhor O´Brein possamos atingir as coordenadas corretas.
- Perfeitamente senhor.
- E quanto ao campo protetor Borg que será utilizado pela srta. Edith? Ela já foi instruída a respeito?
- Não por mim senhor.
- Não estou entendo senhor Data!
- Na verdade senhor, a srta. Edith demonstrou certa surpresa com a minha presença. E muita resistência com o uso e propósito do dispositivo Borg. Relatei este fato ao capitão que decidiu utilizar os préstimos da conselheira Deanna Troi que, no entender dele, seria a pessoa certa para remover os temores da srta. Edith.
Riker apenas reagiu com um levantar de sobrancelha à resposta do andróide.
Sem emoção alguma, pediu-lhe licença e fez o mesmo com o Guardião. Em seguida dirigiu-se para onde estava LaForge para fazer os últimos ajustes no dispositivo que ajudara a criar.

Riker informara-se na Enterprise sobre as vestimentas dos habitantes de S.Francisco na década de trinta do século XX e sintetizara uma para ele e outra para o senhor O´Braien que o acompanharia nesta missão de sondagem.
O capitão Picard viera pessoalmente à superfície para ver o teleporte de seus dois oficiais.
- Lamento não poder ceder o senhor Data para esta missão de sondagem imediato! Mas não tenho idéia de como reagiriam os habitantes daquela época ao ver um andróide como ele. Já basta das interferências que ocorreram. De qualquer forma registre com o tricoder todos os dados da rua em que acontecera o acidente e traga-os para planejarmos nossos passos.
- Sim capitão!
LaForge instalara, afastado do Guardião, uma série de tubos de transporte que funcionavam à medida que recebiam dados da entidade alienígena. Data e ele monitoravam nos consoles as informações de que necessitavam para acionar o teletransporte no momento exato em que as coordenadas aparecessem.
Cada um se posicionou à espera do feixe que os desmaterializaria e os conduziria ao ponto desejado.
- Tudo pronto, senhor O´Braien? – perguntou Riker ao seu companheiro.
O´Braien apenas esboçou uma careta em sinal de concordância, enquanto seus corpos eram envolvidos numa luz azulada, desaparecendo em seguida.

A súbita materialização dos dois num claro dia de outono contrastava com a penumbra na superfície do planeta do Guardião. Riker e O´Braien demoraram um pouco para a acostumarem-se com a claridade do Sol da Terra. Olharam ao redor para ver se ninguém os havia visto e deram início ao registro de informações.
O´Braien foi o primeiro a verificar onde estavam. – Senhor! Conforme os dados do meu tricoder que foram preparados pelo comandante Data, chegamos nas coordenadas exatas.
- Ótimo, O´Braien. Vamos ficar por aqui registrado tudo que pudermos. Assim que o atropelamento ocorrer nos apresentaremos como voluntários para ajudar o motorista a carregá-la para o hospital. Desta forma injetaremos o composto simulando a morte de Edith.
A época em que os dois estavam tinha sido um tempo de grave crise social no mundo todo. O desemprego era grande e as pessoas perambulavam pelas ruas sem destino e muitas vezes passando fome. Alguns desesperados cometiam atos ilícitos e a polícia fazia o que podia. Por isso alguns policiais rondavam os bairros na tentativa de precaver tais atos. Assim se alguém estivesse em atitude suspeita era logo abordado pelo policial na sua ronda preventiva. Mas Riker e O´Braien desconheciam estes detalhes. Procuravam fazer suas medições sem despertar suspeitas, mas olhos desocupados não tinham deixado de observá-los e em busca de qualquer favor acabaram chamando o guarda de plantão.
- Hei! Vocês dois ai! O que estão fazendo?
A principio Riker e O´Braien procuraram fazer de conta que o grito do policial não fora dirigido a eles. Mas quando o homem dirigiu-se na direção deles, batendo com o cassetete numa das mãos, já não podiam mais negar que a atenção do policial voltara-se para eles. Rapidamente esconderam os tricordes nos bolsos dos casacos.
- Hei! Falei com você!
O´Braien apontou para si mesmo, olhando o guarda que se aproximava.
- É você, mesmo!
- Pois não oficial! Como posso ajudá-lo?
- O que é isso que escondeu?
- Isto o que senhor?
- Ora não se faça de esperto! Eu vi guardarem alguma coisa. Devem ser armas, não? Estão planejando algum assalto?
Riker aproximou-se do guarda.
- Senhor! Ah! Oficial... Não fizemos nada! Só estamos aqui procurando emprego!
- Ou planejando um roubo? – retorquiu ele, retirando um revólver e apontando para os dois.
- Vamos resolver isto na delegacia.
Em seguida com a outra mão e ainda apontando-lhe uma arma, tirou um apito do bolso e começou a assoprá-lo.
Assim que parou afastou-se um pouco dos dois - Fiquem de mãos para cima! Assim que meu colega chegar, vou examiná-los melhor. Se estiverem portando armas, serão presos!
O´Braien e Riker trocaram olhares. A presença deles não poderia ser notada. Já bastava a presença de três membros da antiga Enterprise.
Enquanto estavam aguardando a chegada do outro guarda um homem de gorro na cabeça parara para observar a cena, postando-se atrás do policial.
- O que é? – perguntou o oficial, mal humorado.
Antes que os dois oficiais da Enterprise pudessem se dar conta do que acontecia, o braço que empunhava a arma pendeu para baixo. Na verdade o homem começou a cair e isso só não aconteceu porque foi amparado pelo estranho que chegara. Suavemente ele o sentou na calçada, com as costas voltadas para a parede. Certificando-se de que estava bem, aproximou-se deles.
Os olhou fixamente e levemente puxou o gorro para cima revelando um par de olheiras pontudas. – Não sei do que são culpados, mas eu sou filho do demônio e é melhor irem embora.
A reação dos dois foi imediata. – Embaixador Spock!! Se-senhor Spock!!
O vulcano dobrou a cabeça e arqueou uma das sobrancelhas em sinal de curiosidade. Ele imaginara que os dois humanos desta época o confundiriam com um personagem de uma de suas inúmeras religiões, logicamente fugindo em seguida. Isto acabaria com a cena de violência que a sua cultura abominava. Jamais imaginara ser chamado pelo nome. - Eu os conheço? Mas antes podem abaixar os braços. É ilógico mantê-los no ar sem uma razão aparente.
- Cl-claro... Em-baixador Spock! Claro! Co-mo quiser senhor!
Spock olhou para os lados para ver se havia mais testemunhas e depois para o policial que parecia dormir serenamente. - Não podemos conversar aqui senhores. Vi quando ele chamou pelo companheiro. Creio que este ato será difícil de explicar. Sigam-me, por favor.
Os dois homens ainda se refazendo do choque, afastaram-se rapidamente do local, atrás do vulcano.
O delator que os denunciara em busca de algum tipo de favor estivera observando tudo. Escondera-se nas sombras para não ser visto. Ficara intrigado com a queda do guarda e já começara a calcular quanto valeria o que testemunhara. Foi quando sentiu uma mão apertando seu ombro. Virou-se assustado. Diante dele estava um homem carregando o que parecia ser uma arma que o jogou bruscamente contra a parede.
- Q-Quem é você?
O homem nada disse. Apontou sua arma e disparou. O delator mal teve tempo de levantar os braços em sinal de proteção enquanto seu corpo se desmanchava numa névoa avermelhada.
Assim que acabou o trabalho, o homem guardou a arma e tirou de um dos bolsos um pequeno objeto.
Pressionou alguns controles e uma série de faces humanas se sobrepôs com muita rapidez. Só parou quando a imagem do morto apareceu. Abaixo dela informações sobre ele foram surgindo numa rápida seqüência. Os dados projetados indicavam que o homem que acabara de morrer seria vítima de um assassinato alguns dias depois. Sua influência na linha temporal cessava naquele momento. Não havia futuro para ele. Não afetaria a linha temporal do mundo do qual viera. Apenas acelerara o processo. Depois fez nova consulta sobre os três homens que vira. Suas faces tinham sido registradas e não constavam como pertencentes à época que estava visitando. Talvez fossem eles os elementos causadores da distorção temporal que seus superiores o tinham designado para investigar. Talvez tivesse que intervir pessoalmente do mesmo modo como fizera vários anos atrás quando se tornara pai da mulher que levara a Alemanha à vitória.

Spock levou Riker e O´Braien para um pequeno quarto no que parecia ser um velho hotel. Abriu a porta e fez sinal para que entrassem.
Os dois deram-se conta que estavam diante da história, frente a uma das maiores personalidades da Federação.
Assim que entraram, os dois viram o aparelho que Spock construíra para fazer seu Tricoder funcionar e descobrir o que provocara a mudança na história terrestre.
O´Braien não se conteve. – Já conseguiu fazê-lo funcionar senhor?
- Não. Os componentes desta época são muito primitivos. No momento estou curioso quanto aos senhores. Como sabem meu nome? Vocês são da Federação?
Riker adiantou-se. – Bem embaixador. Quero dizer... Senhor Spock! Sei que sua lógica bem como dos vulcanos em geral, é impecável. Não quero mudar os acontecimentos da forma como estão registrados e sei que entenderá o que irei falar, de forma lógica.
Spock apenas arqueou mais uma vez a sobrancelha.
- Sim! Somos de fato da Federação! Mas de uma Federação adiante do seu tempo. Este é o senhor O´Braien e eu...
Spock dobrou a cabeça. – A presença dos senhores estaria relacionada com a nossa tentativa de impedir as mudanças no tempo provocadas pelo doutor McCoy?
- Isto o senhor conseguirá. Mas terá de convencer o capitão Kirk a aceitá-la. – continuou Riker.
- Na verdade nossa missão aqui é de tentar manter o que o senhor conseguiu. E senhor Spock...Nossa presença aqui não pode ser revelada. Nem mesmo para o capitão Kirk.
- O que me pedem senhores dependera do que me contarem. Como sabem, minha lealdade ao capitão transcende a simples hierarquia. Acima de tudo prezo a nossa amizade.
O´Braien continuava a tocar aqui e ali nas válvulas como uma criança que tivesse ganhado um brinquedo novo. De repente virou-se na direção de Spock e lhe dirigiu uma pergunta. – Ah!... Com licença senhores! Senhor Spock o capitão deve retornar logo?
Riker logo entendeu a preocupação de O´Braien. Caso o capitão Kirk os encontrasse ali, seria muito mais difícil evitar interferências na tentativa de Spock de consertar a linha temporal que McCoy modificara.
- No momento o capitão saiu com nossa anfitriã, a senhorita Edith. Creio que seu retorno não será breve.
Riker e O´Braien trocaram olhares quando ouviram aquele nome, mas nada disseram ao vulcano.
- Senhor, - disse Riker – nossa presença aqui é parte de uma coleta de dados para permitir que as ações que tomar sejam as corretas, permitindo que existamos no futuro e possamos realizar a viagem que agora presencia.
Um pouco ansioso Riker olhou novamente para O´Braien. – O senhor descobrira que Edith Keeler é o ponto principal em torno do qual a história da Terra se divide. Se ela não morrer, salva que será pelo doutor McCoy, liderara um movimento pacifista que retardara a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. Isto permitira à Alemanha a construção da bomba atômica antes dos aliados, levando-a à vitória. Se isto acontecer, não haverá Federação, Frota, nada que conheça, senhor. Caso ela não morra num atropelamento por um veículo desta época, o mundo como conhece e como nos dois conhecemos deixará de existir.
Riker olhou bem nos olhos do vulcano e continuou. - Sabemos pelos próprios registros que deixou, que o capitão Kirk se apaixonará por Edith e ele não aceitara o fim da mulher que ama e com muito custo lhe dará as costas quando a vir morrer num terrível ato de impotência.
Spock continuava olhando para Riker sem demonstrar quaisquer emoções, mas o imediato de Picard sabia que por debaixo da aparente serenidade o vulcano teria que tomar decisões lógicas em detrimento da amizade que sentia por seu capitão.
- Podemos provar o que estamos dizendo. O senhor O´Braien é conhecido na nossa Enterprise por fazer milagres. Creio que com a ajuda dele o senhor conseguira encontrar no seu tricoder as informações que procura. O capitão Kirk não precisara saber de nossa pequena ajuda.
Spock arqueou a sobrancelha novamente. – Minha lógica me diz que o motivo de sua visita ainda não está bem claro.
- De fato, embaixador ã... Quero dizer senhor Spock. No nosso tempo a mulher que se tornou a mãe de Edith, evitou sua morte, tirando-a da linha de ação temporal. Mas tomou o cuidado de envolver o planeta do Guardião num campo atemporal. Este campo permitiu que a nossa Enterprise sobrevivesse. Mas o mundo fora dele foi totalmente modificado. Nosso capitão nos enviou para que simulemos sua morte para manter a sincronia da linha temporal como foi registrada, antes que o campo entre em colapso. Portanto só o senhor saberá que Edith na verdade nunca morreu. Assim será um segredo que terá que guardar e um fato que não pesara em sua consciência e nem se constituirá numa traição ao seu amigo.
Spock sem demonstrar qualquer tipo de emoção, colocou as mãos para trás e deu alguns passos. Nesta mesma posição voltou-se para o imediato.
- Agora os fatos parecem encandear-se num todo lógico, apesar de não concordar com a emocional solução do seu capitão. Já acumulei, não obstante, experiência suficiente da sua cultura para saber que às vezes a lógica não é a resposta correta para determinados problemas.
- Obrigado por confiar em nós senhor Spock. Sei que poderei contar com o seu silencio.
- Perfeitamente senhor... Senhor?
- Riker, Will T. Riker, senhor!
- Pode contar com minha total discrição sobre o que aconteceu aqui senhor Riker.
Depois Spock virou-se para O´Braien.
- Senhor O´Braien antes de partir creio que precisarei de sua habilidade para ajudar-me na finalização deste simples aparelho.
O encarregado de teletransporte da Enterprise apenas sorriu e agachou-se para ajudar o vulcano.

Na companhia da conselheira Deanna Troi mais um membro feminino da engenharia designado por LaForge, Edith foi levada para o Holodeck onde testariam as reações dela a um atropelamento simulado e o funcionamento do dispositivo Borg.
Quando as três entraram o Holodeck estava desativado expondo as peculiares linhas amarelas das suas paredes. Para Edith que nunca estivera dentro de um em toda sua vida mais parecia um compartimento vazio que apenas se distinguia pelas marcas quadriculadas.
Deanna recebeu da engenheira auxiliar o aparelho Borg e o ajustou ao braço de Edith. Depois regulou seu campo de ação para as dimensões do corpo da pequena mulher.
- Edith – disse a mulher da engenharia – eu irei jogar este pequeno cubo na sua direção, mas não se assuste, porque você não o sentirá. Pronta?
Ela apenas acenou afirmativamente com a cabeça. Em seguida a mulher jogou o cubo e um pequeno reflexo cobriu Edith. Após atingir o reflexo, o cubo caiu ao chão provocando um pequeno eco.
- Tudo bem? – perguntou a engenheira auxiliar. - Ótimo!
Ele aproximou-se dela e fez mais alguns ajustes no aparelho.
- Agora, Edith não se assuste com o que irá ver. Tudo à sua volta parecerá de verdade, mas trata-se apenas de uma ilusão. Criei um programa que testará sua reação diante de um carro vindo em sua direção. Você será empurrada alguns metros à frente, mas nada sentirá. Se sentir medo basta dizer “parar programa” e tudo voltará a ficar como agora. Preparada? Computador acionar programa EK101.
Para espanto de Edith, o compartimento cedeu lugar a uma rua semelhante aquelas que estava acostumada. Quando se deu conta estava no meio dela e um caminhão dirigia-se rapidamente em sua direção. Sua reação foi instintiva e apenas teve tempo de gritar. Tentou pedir auxílio para a mulher e Deanna que ficaram paradas, olhando para ela, sem se moverem. Então fechou os olhos e preparou-se para sentiu o impacto e o deslocamento involuntário provocado pelo caminhão. Quando caiu ao chão imaginou que a dor a faria perder a consciência. Esperou alguns segundos e depois abriu os olhos e tocou no seu corpo. Estava tudo em ordem. Não sentirá nada. Nenhuma dor, nenhum desconforto. Levantou-se e notou que o caminhão estava ali parado e caminhou na direção dele. Em segundos ele desapareceu e depois o resto da rua. Ela estava de volta ao compartimento quadriculado. As duas mulheres estavam paradas olhando para ela.
- Então Edith, como foi? – perguntou a auxiliar.
- Eu... Ah! Pen-sei, pensei que fosse morrer! Foi a experiência mais terrível da minha vida. E-era real! Parecia real!
- Bem-vinda ao Holodeck, onde todos os seus sonhos se tornam realidade. - disse Deanna, sorrindo.
- Ou os seus pesadelos, se você quiser. – gracejou a engenheira auxiliar.
- Mas o que é isto afinal? – perguntou Edith.
Deanna pegou as duas mãos de Edith e falou carinhosamente. - Aqui é como uma sala de cinema do seu tempo. A única diferença é que as pessoas interagem com ele.
- A propósito, sentiu alguma coisa Edith?- perguntou a auxiliar.
- Fiquei abalada sim, mas não senti nada.
- Ótimo Edith! Meus parabéns! Passou pelo teste! O dispositivo de proteção Borg funcionou perfeitamente!
Querendo amenizar o susto pelo qual Edith passara, Deanna ainda segurando suas mãos, brincou com ela também.
- Viu Edith? A sua performance foi perfeita! Não será necessário nenhum tipo de representação. Sua atuação foi ótima!
Todos caíram na risada e se retiraram do Holodeck.

Riker e O´Braien com os seus tricordes ajudaram Spock a encontrar as manchetes dos jornais das duas versões em que a história do mundo bifurcava a partir da intervenção do doutor McCoy. Para que o capitão Kirk não percebesse que Spock havia sido ajudado, O´Braien o havia auxiliado a conseguir a energia necessária para o seu tricoder antiquado que mostraria as mesmas imagens sobre Edith que tinham conseguido.
Spock por sua vez os ajudou a obter todos os dados necessários que tinham vindo coletar. Despediram-se cordialmente e Riker acionou o sinalizador que carregava para solicitar o seu teletransporte para a superfície do planeta de onde tinham vindo.
Ele e O´Brein ficaram juntos enquanto eram transportados de volta. Enquanto isso ocorria ainda puderam ver a grande figura da Federação despedindo-se deles com o conhecido gesto da palma aberta da mão direita.

Assim que teletransportaram-se depararam com o capitão Picard parado no mesmo lugar de quando haviam partido.
- Imediato?
- Senhor?Há algo errado?
- Vocês acabaram de partir! Não puderam concretizar a missão?
Os dois homens se entreolharam sem entender.
- O que aconteceu senhor? – perguntou Riker.
- Assim que teletransportaram-se, em segundos foram trazidos de volta. Imaginei que o dispositivo alienígena tivesse falhado.
Data que se aproximara e captara metade da conversa, pediu licença para falar.
- Capitão, eu creio que apesar de usarmos tecnologia da Federação no teleporte o dispositivo de tempo alienígena funciona numa sincronia diferente da nossa. Isto explicaria o fato do comandante Riker sentir o tempo passar pelos nossos padrões enquanto o dispositivo reage de outra forma.
- Obrigado senhor Data.
- Então imediato obteve sucesso nas suas medições?
- Está tudo aqui senhor. E graças ao embaixador Spock!
- O que está dizendo Riker? Eu não o instruí para evitar qualquer tipo de interferência?
- Capitão! Não fomos nós que o procuramos, foi ele que nos encontrou! É um longa história senhor, e eu terei prazer em contar-lhes os detalhes.
- Mas imediato se ele descobriu a nossa presença a história como a conhecemos acabou de ser alterada!
- Com licença mais uma vez Capitão.
- Sim senhor Data.
- Até onde posso acessar os registros continuam inalterados.
- Mais alguma brincadeira do tempo senhor Data?
Riker adiantou-se. – Capitão! Quando do nosso encontro com o embaixador Spock contei-lhe o que estava acontecendo no futuro dele. Isto é, no nosso presente. E da forma como descrevi o nosso esforço para salvar Edith Keeler sem alterar os fatos conhecidos, ele deu-me sua palavra que nada contaria ao capitão Kirk ou a qualquer outra pessoa do seu tempo em vista das conseqüências que isto poderia acarretar.
- Bem, senhores, parece-me que o embaixador Spock usou sua lógica vulcana.
Neste instante o capitão Picard foi chamado pela ponte.
- Sim senhor Worf?
- Senhor, o campo atemporal está começando a decair. A taxa é pequena, mas o fato é que está perdendo força.
Picard olhou todos à sua volta com uma grave expressão no rosto.
- Senhores! Temos que nos apressar! O campo começou a ceder!

Holtz trabalhava para uma seção especial do partido que monitorava quaisquer ameaças ao domínio alemão do planeta Terra que já se estendia por trezentos anos.
Seus cientistas tinham descoberto recentemente uma forma de viajar no tempo. Não podiam dar grandes saltos tanto para o futuro como para o passado. Quinhentos anos eram o período máximo em que conseguiam se locomover. Quanto mais próxima deste limite mais difícil era a viagem. E só um homem poderia ser transportado por vez.
Após uma exaustiva pesquisa de vinte anos tinha certeza absoluta de que a Alemanha ganhara a guerra não por bombardear Londres com uma bomba atômica, mas pela demora do antigo território chamado Estados Unidos de participar dela. E isto graças a um movimento pacifista encabeçado por uma tal de Edith Keeler.
Seus pais eram desconhecidos e após toda a pesquisa que fizera, descobrira aterrorizado que ela nunca poderia ter nascido. Fora enviado pelos seus superiores à época que teria sido fecundada para descobrir seus pais e permitir que ela nascesse e assim permitir que a Alemanha ganhasse tempo para construir a bomba atômica.
Após este primeiro susto ele descobriu em uma de suas viagens de pesquisa que existia um outro mundo, onde a Alemanha foi derrotada e fora enviado novamente para impedir que isto acontecesse.
Como da primeira vez que viajara, sua estadia prolongara-se por dois anos e conseguira desvencilhar-se da morte por um triz quando a cidade onde estava foi sacudida por um forte terremoto.
Já fazia um ano que estava ali, pesquisando linhas pessoais, quando seu processador deparou-se com aqueles três homens que não faziam parte do mundo desta época e com certeza eram eles os causadores do mundo que descobrira.

Assim que retornaram a Enterprise, Picard reuniu todos os participantes na sala próxima a seu gabinete. Era chegado o momento de colocar em prática o plano que improvisara para manter a integridade do seu mundo, o mundo da Federação.
Após uma revisão detalhada de todos os detalhes, Dora, que passara o tempo todo calada pediu licença para fazer uma pergunta sobre um detalhe que ninguém comentara.
- Pois não doutora Dora?
- Capitão! Creio que todos aqui se esqueceram de um detalhe. A história registrou a morte de minha filha. Mas como fizeram isso sem um corpo?
- Bem doutora, este detalhe não passou despercebido. Só que pela delicadeza da situação eu decidira não comentar nada a respeito. Senhor Data, doutora Crusher.
Após uma pausa silenciosa, Beverly lentamente levantou-se e olhou para a mãe de Edith. – Doutora Dora! Eu e o senhor Data criamos um corpo artificial baseado nos dados escaneados de sua filha.
- Uma espécie de clone? – exclamou Dora.
- Não exatamente, - manifestou-se Data. – Na verdade trata-se de um andróide sofisticado que externamente parece um ser humano normal. A doutora tomou o cuidado de inserir órgãos internos que provavelmente serão inspecionados numa autópsia.
- Tivemos até o cuidado de duplicar as impressões digitais para o caso de quererem verificar. - completou Beverly.
Constrangida com a macabra manobra de Picard, Dora remexeu-se na poltrona com uma expressão cética.
O capitão forçou os lábios e esfregou as mãos e olhou para ela. - Sei que isto pode não lhe parecer ético doutora, mas diante de nosso escasso tempo e sabendo como o tema lhe é sensível resolvi cuidar desta parte discretamente.
- E como planeja substituir Edith, capitão?
- Bem doutora, assim que meu primeiro oficial e o senhor O´Braien acudirem sua filha, transportando-a para a carroceria do caminhão, executaremos a troca. Para isto Edith levara além do dispositivo Borg um comunicador que a engenharia preparou especialmente para ela ser localizado e transportada de volta. Em seguida, o corpo trazido até a superfície do planeta, será transportado até as coordenadas do caminhão. O dispositivo ajusta-se automaticamente, mesmo que as coordenadas estejam mudando, como no caso de um veículo em constante marcha. Will e O´Brien seguirão com ele até o hospital para se assegurar que ele chegue até lá e se incorpore aos fatos que já conhecemos. Com o retorno dos dois espero poder baixar o campo atemporal e voltarmos ao nosso tempo normal.
Depois Picard os olhou em silêncio. Caminhou pensativo até a janela da sala de reuniões que mostrava um espaço escuro sem estrelas. Virou-se para os presentes com um brilho nos olhos. – Ao trabalho!

O viajante de outra realidade já sabia o que fazer. Teria que intervir pessoalmente nos acontecimentos.
A princípio pensara em visitar Edith e apresentar-se a ela, impedindo-a que cruzasse aquela rua onde seria apanhada pelo caminhão. Mas o mais sensato no seu entender seria mexer o menos possível com ações que tinham ocorrido trezentos anos atrás. Agiria assim que ela fosse atravessar a rua, impedindo o acidente fatal. Mesmo assim sua mente estava confusa. Não estava bem certo se fazia isto por dever patriótico ou pelos sentimentos particulares que sentia pela mulher que era parte importante da sua história. Mas uma coisa era certa: tinha que fazer alguma coisa para preservar o mundo que conhecia. Mas teria que tomar cuidado com os visitantes. Poderiam frustrar seus planos. Teria que ser cauteloso e na primeira oportunidade eliminá-los. Os registros que acessara indicavam claramente que o acidente ocorreria no local onde avistara os estranhos. Não havia mais dúvidas que tinham vindo com algum propósito desconhecido que, com toda certeza, não coincidia com o seu.

Dora descera ao planeta, junto com todos os participantes da reunião. Sua angustia aumentava à medida que o momento da ação se aproximava. Já estivera tantas vezes ali e fracassara. Agora seria a vez de outra pessoa tentar. Enquanto Data e LaForge faziam as últimas calibrações no dispositivo espaço-temporal, Dora aproveitou para abraçar a filha.
Ela estava vestida com a roupa com que foi trazida. Na Enterprise Deanna e LaForge haviam colocado o artefato borg e o localizador de forma a ficarem escondidos. A conselheira a abraçara e o engenheiro desejara-lhe boa sorte. Sabia que dependiam como nunca do seu desempenho.
- Edith, minha filha. Eu... Eu peço-lhe desculpas por tudo isto que está passando. Eu... Eu tentei. Tentei todas as formas... Perdoe-me seu falhei, perdoe-me!
- Mamãe! Não há porque pedir perdão! Só o fato de conhecê-la, de saber como é, de ver em seu rosto, o meu rosto, já valeu por todo o tempo que passei longe de você. Não chore! Eu voltarei... Tudo dará certo. A minha parte neste simulacro é... é pequena perto do papel dos outros que tornaram isto possível. Confio neles e sei que correrá bem. Acredite nisto mamãe!
As duas mulheres se abraçaram.
Picard assistia tudo ligeiramente afastado respeitando a privacidade das duas mulheres. Estava também absorto em pensamentos, divagando como reagiria se fosse um filho seu. O fato de ser solteiro se implicava em solidão também significava ser responsável somente por seus atos. Estava assim parado quando Riker aproximou-se dele junto com O´Braien. – Estamos prontos senhor!
O capitão o olhou bem nos olhos. – Trouxe o inoculador preparado pela doutora Crusher?
- Sim senhor! – Riker levantou o braço mostrando a mão direita. – Está preso entre os meus dedos. Quase não será notado. O efeito sobre ela será rápido e convincente!
- Ótimo imediato! Boa sorte então a todos! Agora só depende de vocês!
Picard ficou olhando os dois afastarem-se na direção de Edith e seguraram gentilmente a sua mão a caminho do transporte. Certificou-se que os dispositivos estavam devidamente acoplados a ela e subiram até as suas posições para o transporte espaço-temporal. LaForge e Data fizeram o último ajuste e os três desapareceram numa luz azulada.
Assim que isto ocorreu Picard recebeu a comunicação de Worf. – Sim?
O klingon demonstrava ansiedade na voz. – Capitão! O campo está para entrar em colapso!
- Mas a taxa não era lenta o bastante para nos dar tempo suficiente senhor Worf?
- Não estou bem certo senhor, mas os sensores indicam que alguma força acelerou o colapso!
Picard dirigiu o seu olhar para os dispositivos de transportes vazios, sem saber ao certo que decisão tomar. Estava olhando para LaForge e Data em busca de respostas quando Dora correu em sua direção. – Capitão! É um palpite, mas deixe-me ir também.
- Sabe o que está acontecendo?
- Não estou bem certa, mas tenho experiência com as nuances do tempo e sei que poderei evitar o colapso do campo. Só me de um feizer e envie-me para lá!
- Um faiser! Para quê doutora?
Picard hesitou por alguns segundos sobre o pedido, mas quando por sobre sua cabeça ele viu o campo tremeluzir ele rapidamente chamou um dos seguranças, pediu-lhe o faiser e o entregou a ela.
- Creio que não tenho mais tempo para filosofar com a senhora! Querendo ou não, nossa existência está por um fio. Se deixarmos de existir jamais saberei se tomei a decisão certa. Vá!
Dora pegou a arma, correu para o transporte, posicionou-se a espera do sinal de concordância de Picard para LaForge e desapareceu na luz azulada.

Assim que se materializaram na fatídica rua que Edith teria que atravessar, Will e O´Braien consultaram o tricorder. Faltavam dez minutos para que suas existências fossem decididas.
Caminharam um pouco e presenciaram a Doutora Dora do passado, interceptando a outra Edith Keeler. Pediram para que a Edith que tinham trazido, que aguardasse ali, longe dos olhos da mãe e se dirigiu para ela.
Quando se aproximaram, ela parou de conversar com a filha, virando-se na direção deles assustada. – Vocês vieram para impedir-me de levá-la?
Riker adiantou-se e fez um sinal com as duas mãos para que se acalmasse. – Está tudo bem doutora. Faça o que tem a fazer. Somos da Enterprise e cuidaremos de tudo a partir daqui.
Dora com a face expressando um cansaço visível não hesitou. Segurou a filha ainda estupefata por um dos ombros e chamou o Guardião que as retirou dali imediatamente.
Os dois então se voltaram rapidamente pela mesma calçada na direção de Edith. Mas assim que fizeram a volta notaram que ela estava conversando com um desconhecido. Os dois trocaram olhares interrogativos.
O estranho se interpunha entre eles e a mulher. Assim que ela desviou o olhar para eles, o estranho o acompanhou e virou-se na direção deles numa atitude hostil. Sacou o que obviamente parecia ser uma arma e apontou.
- Vocês, assim como, eu não são desta época, não é? Tenho certeza que vieram para matá-la. Podem estar certos que não conseguirão isto.
Surpreso O´Braien virou-se para Riker.
- Senhor! Daqui a seis minutos o capitão Kirk irá se encontrar com o doutor McCoy!
- Eu sei O´Braien. Pensamos em tudo, menos numa arma.
Edith tentou segurar a mão do homem, mas ele foi mais rápido.
- Nada disto Edith. Junte-se a eles e fique parada até eu dizer o contrário.
- Mas o que fará com eles?
- Vou eliminá-los. Assim não irão nos atrapalhar.
Neste exato momento Dora materializou-se atrás deles com um faiser apontado para o estranho.
- Você! – disse o homem. Dora? Dora Stevens?
- John! Pensei que estivesse morto. Por que está apontado uma arma para nós?
- Tentando salvar meu mundo Dora? Assim como você tentou salvar o seu há muitos anos atrás.
- Então já estava tudo determinado quando o conheci?
- Eu sabia de sua vinda e da nossa filha. Sabia o que ela representava para a minha realidade. A principio fui incumbido pelo partido para encontrá-la. Depois eu... fiquei confuso quanto à minha lealdade. Quando o terremoto ocorreu, eu resolvi utilizá-lo para afastar-me de você já que havia cumprido o meu papel.
- Todos estes anos eu... procurando por você! Sem saber que fora tudo planejado. Como pude ser tão ingênua!
- Nada está perdido ainda Dora. Venha comigo e com ela. Venha para o meu mundo. Eu as protegerei.
- Não posso permitir que o seu mundo viva John! Trairia tudo aquilo em que acredito.
- Então Dora eu... eu terei que terminar o que comecei.
Holtz apontou na direção dela. – Abaixe sua arma Dora e tudo ficara bem.
O´Braien aproveitou o descuido do homem que estava com a atenção em Dora e jogou-se sobre ele. Os dois caíram pesadamente no chão e quando ele conseguiu se desvencilhar do O´Braien e preparou-se para disparar nele. Riker foi mais rápido e o nocauteou com um soco de direita.
- Rápido ajudem-me a tirá-lo daqui antes que alguém nos veja! – gritou Riker.
Os dois arrastaram o homem até a doutora Dora que acionou o localizador desaparecendo junto com ele.
Por sorte não tinha passado ninguém para testemunhar a pequena luta. Fazia muito frio e as pessoas procuravam locais mais quentes para se abrigarem, procurando fugir das ruas.
Eles olharam novamente o tricoder que marcava quatro minutos para o acontecimento que todos tinham se preparado.
Eles ficaram esperando o caminhão chegar. Dali onde estavam viram o legendário capitão Kirk correr entusiasmando na direção do doutor McCoy.
Edith desempenhou o seu papel. Em seu coração a visão do homem que amava quase a fez esquecer tudo que deveria fazer, mas pensou em sua mãe e nos milhões que deveria salvar. Viu o caminhão, fechou os olhos e gritou.
Kirk e McCoy só ouviram o baque surdo de um corpo caindo.
- Vo-cê... Você deliberadamente me impediu de salvá-la! Por quê?
Kirk apertou o amigo em seu abraço e não quis ver mais o corpo de Edith caído em frente ao caminhão. Por sorte dois homens haviam corrido para socorrê-la. Mas ele sabia que era tarde demais. Tinha que ser assim. Tivera mais uma vez de sacrificar-se pela humanidade.
Riker e O´Braien aplicaram o preparado da doutora Crusher em Edith, assim que se agacharam para pretensamente ajudá-la. As poucas pessoas que começaram a se aglomerar no local do acidente deveriam ser convencidas de que ela estava quase morta. Conversaram com o assustado motorista do caminhão e o persuadiram a levá-la para o hospital mais próximo.
Assim que colocaram delicadamente o corpo de Edith na carroceria do caminhão rapidamente fizeram a troca combinada dos corpos e seguiram até o hospital. Quase nada conversaram, cada um absorto em seus próprios pensamentos e reflexões sobre tudo que acontecera.
Edith chegou “morta” no hospital e a história retomou sua marcha.

Dora materializou-se no dispositivo montado junto ao Guardião com a arma empunhada, apontada para Holtz que estava caído do seu lado.
Os seguranças logo correram para lá e erguerem o homem. Ele começou a voltar a si e assim que recobrou totalmente a consciência, olhou para ela.
- O que fez!
Nem bem acabara de falar ele olhou arregalado para si e para Dora. Os seguranças o largaram assustados e em questão de segundos ele desapareceu como uma tênue fumaça. A doutora ainda tentou abraçá-lo, mas eles simplesmente fecharam-se sobre o vazio.
- John!

Assim que Riker e O´Braien retornaram o Guardião que se mantivera quieto por toda a operação, manifestou-se. – SEU TEMPO VOLTOU AO CURSO NORMAL. QUEREM CONHECER OUTRAS REALIDADES DO SEU MUNDO? DEIXE-ME SER SEU GUIA.
Todos se entreolharam e abanaram a cabeça. A experiência de viajar no tempo fora demais para eles.
Picard adiantou-se e com certeza falou por todos. – Obrigado Guardião. No momento não estamos mais interessados.
Um sinal da ponte interrompeu sua conversa com o Guardião. Era Worf. – Senhor! O tenente Sprwance quer saber o que aconteceu. Ele disse que os sensores da base perderam o contato com a Enterprise por nove minutos.
- Nove minutos? Deve ter sido o campo de táquions que envolveu a Enterprise rompendo a sincronia temporal!
- Senhor Worf diga-lhe que está tudo bem a bordo da nave. Diga-lhe que foi... Foi apenas um bloqueio do campo em volta do planeta.
- Sim senhor.
La Forge aproximou-se de Picard. – Devemos desmontar o dispositivo de transporte capitão?
- Creio que sim senhor La Forge. O Guardião demonstrou ser muito vulnerável. Este dispositivo pode facilitar a tentativa de mudanças na linha temporal e sabemos as conseqüências disto.
Nas horas seguintes Picard acompanhou o trabalho da engenharia de desmonte na superfície do planeta e subiu com a última turma para bordo da Enterprise. Assim que lá chegou, rumou para a enfermaria.
Quando chegou a enfermaria a doutora Crusher cuidava da recuperação de Edith. Dora estava parada ao lado dela segurando sua mão.
Ele se empertigou e resolutamente caminhou até ela.
- Sinto muito doutora! Não imaginei que seu sacrifício seria tão grande.
- As coisas funcionam assim capitão. Não se pode ter tudo. Eu perdi meu marido e ganhei minha filha. Só a posteridade poderá me absolver ou culpar pelos meus atos. Sei que agora terei de pagar minha divida.
- Sua atitude foi corajosa doutora. Farei o que puder para atenuar quaisquer penalidades que lhe sejam impostas.
- Obrigado capitão. Sei que poderei contar com o seu apoio.
Um pequeno sinal interrompeu a conversa dos dois. – Do que se trata senhor Worf?
Uma mensagem criptografada da embaixada vulcana senhor. – Já estou a caminho. Transfira para a minha sala na ponte.
Picard retirou-se da enfermaria e rumou para a cabine próxima a ponte.
Sentou-se e ligou o seu console. Tratava-se de uma mensagem confidencial da embaixada vulcana.
Logo uma imagem apareceu. Ele a conhecia muito bem. Era a do embaixador Spock.
- Embaixador? Em que posso ajudá-lo?
- Usei este canal particular para que nossas conversas não sejam rastreadas capitão Jean-Luc Picard.
- Há anos que sabia de sua missão capitão. Apenas tomei a liberdade de contatá-lo após o seu final. O motivo de meu contato é para cumprimentá-lo pelo brilhante papel desempenhado pelo senhor e pela sua tripulação nos acontecimentos que se deram no planeta do Guardião. Sua atuação é igual à de um capitão que conheci, que sempre fugia aos ditames da lógica, mas conseguia resultados admiráveis. Quero agradecer em especial ao seu primeiro oficial a ao senhor O´Braien que tiveram um papel destacável nos eventos de minha época. Mas para a segurança da Federação eu lhe peço que registre o estritamente necessário.
Picard ajeitou-se melhor na sua poltrona.
- Farei o que pede embaixador. Mais alguma coisa?
- Mais nada capitão. Sei que saberá usar sua discrição oportunamente.
- Obrigado embaixador. Sinto-me honrado.
- Vida longa e próspera capitão Jean-Luc Picard.
- Que o senhor prospere e tenha vida longa embaixador!
Picard desligou o console e dirigiu-se para a ponte.
Estavam todos à sua espera aguardando a ordem de partida.
Ele sentou-se na poltrona de comando e antes de dar a ordem fez uma pergunta para Data que estava no assento do piloto.
- Senhor Data há uma particularidade nesta história que ainda me escapa.
- Qual senhor?
- Como o desaparecimento da realidade do pai de Edith não impediu sua viagem até à concepção dela?
- Bem senhor.Tudo indica que Shörendiger estava certo quanto fez a sua especulação intelectual sobre a realidade quântica do seu gato estar vivo ou morto em sua caixa. O pai de Edith só existia numa realidade, mas ela era como o gato. Mesmo com o colapso do estado quântico ela continuaria existindo qualquer que fosse ele.
Picard olhou para ele, para Deanna, para Will e se afundou na poltrona com um leve sorriso nos lábios.
- Muito bem senhor Data. Vamos deixar a órbita do planeta. Acionar motores de impulso.
Lentamente a gigantesca nave foi deixando o planeta para trás e logo entrou em dobra. Lá embaixo o Guardião dormitava a espera do próximo viajante.

RONALD RAHAL

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