OS CRONONAUTAS
A Versão EXERIANA de
"A Máquina do Tempo" de H.G.Wells
CAPÍTULO I
Era uma sala branca. Janelas grandes e arejadas com cortinas claras esvoaçando suavemente.
Aquela agradável manhã se configurava poeticamente perfeita para um momento inesquecível, e
ainda que isso estivesse previsto, a maior parte dos poucos ali presentes ainda não estava
convencida da importância que o Dr. George alegava estar carregado o momento.
Anos de espera e investimento talvez ali se justificassem. Assim esperava Herbert, o principal
financista do projeto, que de sua fortuna pessoal, maior parte herdada, emprestava tudo o que
fosse possível para manter tão ousada pesquisa científica. Herbert tentava se convencer que
George merecia todo aquele crédito, e não que o fazia apenas por sua longa amizade pessoal.
O outro presente, o jovem Wells, era o terceiro amigo. Ele Herbert e George haviam se conhecido
antes da maioridade, e sempre se mantiveram em contato. Wells era escritor e jornalista, com
bom emprego, em parte graças a seu amigo Herbert, mas o mais importante, era o grande sonhador
do grupo, a mente da qual saíam as mais ousadas elucubrações fantásticas que divertiam os amigos,
ainda que, como cientista, George vivesse a colocar freios na imaginação do rapaz, se ele um
dia quisesse se tornar um bom escritor de Ficção Científica.
Os demais membros daquela reunião eram cientistas e consultores das mais conceituadas
universidades, laboratórios e instituições de pesquisa particulares e governamentais. Apesar de
desligado dos projetos oficiais controlados pelo governo, e oficialmente expulso do projeto
norte-americano mais promissor da história da Física, George ainda era respeitado pelo seu
indisfarçável brilhantismo
- Esperando que todos tenham lido a bibliografia básica que recomendei... - Iniciou George ante
olhares que pareciam denunciar não tê-lo feito. - ...Podemos começar. Tenho o prazer de declarar
que está pronto!
- Pronto o quê? - Perguntou um dos consultores. - A pesquisa de transição de partículas ou...
- Isso e muito mais! - Interrompeu George. - Hoje vocês entenderão porque eu sempre disse que
não perderam por esperar. Wells!
O jornalista tomou o controle remoto e acionou o aparelho de TV com videocassete embutido, que
poucos haviam notado no canto da sala. Estava bem posicionado em um local onde a claridade
não o atingia diretamente, garantindo uma boa imagem.
" - Como sabemos os americanos estão muito adiantados no teletransporte de partículas.
Conseguiram fazer na semana passada um átomo de hidrogênio ser transportado instantaneamente
a uma distância de 20m, e sabem muito bem que isso implica também em algo similar a um salto
quântico, eliminando o a atraso que costumavam ter nas experiências anteriores."
Na verdade não era Herbert falando desta vez, ou melhor, era, mas na gravação em vídeo.
" - O motivo mais forte de minha indisposição com os dirigentes do projeto é que eu insistia em
não utilizar os método que acabaram por resultar nessa transição instantânea, a correção do
atraso, cuja razão eles nunca foram capazes de entender. Estudaram muitas outras hipóteses e
colocaram para segundo plano a hipótese a qual eu terminei por confirmar em meu laboratório."
Enquanto a narração seguia, imagens simples mas eficientes e bonitas, produzidas em computação
gráfica por Wells, ajudavam a esclarecer as informações.
" - O atraso, nada mais é do que um breve salto para o futuro. Ao induzir a partícula à hiper
vibração que resulta no salto, nós a colocamos por um breve instante fora de nosso Espaço-Tempo
normal. Ela se adianta segundos ou frações de segundo, até que em nosso passar do tempo normal
nós a alcancemos. Essa demora tem sido vista como um tempo decorrido para partícula
sair do espaço normal, se converter em formas sutis de energia e finalmente se reconverter para
voltar ao espaço. Mas isso é um erro! A partícula não está demorando para se deslocar, ela está
na verdade se deslocando rápido demais!"
A apresentação se seguiu com diversas outras explicações e gráficos, num vídeo curto mas intenso,
que terminou por não ser bem absorvido pela maioria dos presentes.
- E o senhor pretende provar isso Dr. George? - Perguntou uma das cientistas consultadas.
- Realmente não é fácil sustentar essa teoria, pois não temos como demonstrar tal salto no tempo sem instrumentos que
meçam com exatidão o tempo decorrido para a partícula transportada e compará-la com o tempo
decorrido em nosso espaço-tempo. O transporte de átomos degradáveis super pesados que
pudessem auxiliar nesse cálculo nunca foi bem sucedido. Foi por isso que propus meu projeto.
- Que foi veementemente recusado por todas as instituições norte-americanas, e a maioria das
daqui também. - Comentou um consultor.
- Claro. - Respondeu outro. - A verba necessária é alta demais para um risco tão grande. É um
projeto por demais fantástico. Por Deus... Viajar no Tempo?!
- Felizmente... - Interpelou George. - Os recursos necessários nem sempre tem que vir diretamente
das contas do governo. - Concluiu apontando para Herbert, que deu um sorriso enigmático.
- E afinal... - Perguntou outro cientista. - O que tem para nós?
- Construí o dispositivo! - Respondeu George meio bruscamente, orientando Wells a apertar o
PLAY para continuar a apresentação.
" - Baseado na teoria de que a partícula transportada tenderia a arrastar consigo qualquer
matéria que lhe fosse adjacente e suficientemente leve, logo percebi que bastaria aumentar a
energia do impulso para transportar não uma partícula, não um simples átomo, mas moléculas,
cadeias moleculares inteiras, substâncias, por fim, macro objetos, para o futuro."
" - De acordo com a energia adicionada, cria-se um raio global de efeito, onde tudo o que estiver
dentro é transportado no tempo. Porém nos aparelhos dos institutos onde trabalhei sempre
ocorria do raio de ação levar toda a matéria no interior da câmara, de modo que ela simplesmente
sumia e perdia-se a possibilidade de medi-la com precisão. É exatamente isso que sugeri evitar,
ampliando ainda mais o raio de ação. Porém, a medida que o raio atingia a matéria a sua volta,
a própria aparelhagem da câmara, imediatamente acabava por ter seu efeito anulado, pois não
conseguia arrancar a matéria de sua demais extensão. Ou o raio envolve toda a continuiade do
objeto, ou é inibido pelo excesso de matéria a transportar."
" - Por isso, não basta construir imensos indutores de salto, é preciso construir um dispositivo
pequeno, o menor possível, capaz de flutuar, desconectado de qualquer outra continuidade de
matéria densa. Esse aparelho será capaz então de, com a energia necessária, ser totalmente
arrastado para o futuro, literalmente sumindo por um instante, e surgindo novamente. Com isso
poderíamos medir o tempo decorrido para ele, e para nós, e confirmar a ocorrência de uma transição
no tempo, e não de uma mera suspensão".
- E você pode confirmar isso? - Perguntou uma cientista, após longa pausa do término do vídeo.
George fez uma pausa dramática, e finalmente disse. - Sigam-me.
CAPÍTULO II
Chegaram no laboratório subterrâneo. Pequeno, mas bem equipado, e que funcionava numa
chácara de alguns kms2 onde o próprio George morava, e da
qual praticamente não saia há mais de um ano.
Auxiliares de laboratório abriram a cortina que dava para uma sala escura, onde um estranho objeto
estava em cima de uma mesa. Era basicamente um cilindro inclinado, com uns 30cms de diâmetro e
90 de altura, circundado por uma estrutura em anel. Abaixo dela, um disco espesso parecendo uma
base, e acima um pequeno motor com uma grande hélice, que apesar de tudo não conseguia lhe
dar a impressão de ser um helicóptero. E tudo isso sustentado por um delicado tripé, de pernas tão
finas que não pareciam ser capazes de aguenta-lo, sobre uma mesa de metal.
- Então... Esse é o aparelho? - Perguntou Herbert.
- Exatamente! - Respondeu George. - Prontos para a demonstração?
Poucos conseguiriam descrever a emoção de ver aquele dispositivo aparentemente pesado flutuar
lentamente, começar a piscar, de início tão rápido que não se podia notar, mas cada vez mais
devagar, até aparentemente sumir totalmente por alguns segundos, repetindo então o processo
ao inverso, piscando cada vez mais rápido até que por um momento parecia transparente e por
fim se tornar totalmente opaco ao mesmo tempo que pousava.
- Senhoras e senhores. Acabam de presenciar uma Viagem no Tempo. Basicamente, para exatos 30s
no futuro, que foram percorridas pela máquina em exatamente metade deste tempo. Ou seja, para
nós foram 30, para ela, 15. Em Média.
A nenhum dos presentes ocorria ter sido vítima de um embuste. Ninguém punha em cheque a
seriedade do Dr. George, que aos 21 anos se formara em física por uma das melhores universidades
do país, e se doutorara aos 26 na mais prestigiada universidade norte-americana. Mas o fato era por
demais perturbador. Era sabido que George estava de corpo e alma envolvido num projeto relativo
a viagem no tempo, mas ninguém levava a sério a possibilidade de um feito daquela natureza.
Pensavam no máximo em transporte de partículas, e acreditavam que apesar de perseguir aquele
delírio, ele conseguiria obter várias observações colaterais que poderiam ser úteis ao avanço da
ciência. Portanto, a preocupação no momento era de que tudo não passasse de um engano. Um erro
de observação acobertado pelo entusiasmo do jovem Dr.
- Você tem certeza disso? - Era a pergunta resultante de uma série de questões lançadas
simultaneamente, mas o Dr. George decidiu dar atenção a uma das perguntas práticas.
- Os motores a hélice sem dúvida seriam insuficientes para levantar um objeto de quase 600kg,
mas a medida que o campo de avanço temporal atinge o objeto ele se desliga parcialmente da
força gravitacional do planeta, de modo que seu peso se reduz drasticamente, e dessa forma
as hélices conseguem levantá-lo. O tripé é constituído de um material o mais leve possível, de
modo a que a massa ofereça pouca resistência ao campo de avanço temporal, o suficiente para que
a redução na atração da gravidade atue a ponto de permitir a elevação do aparelho. Ao ficar
totalmente suspenso, o campo passa agir com maior intensidade, pois o ar oferece resistência
desprezível ao avanço no tempo. Na verdade as moléculas de ar passam de dentro para fora do
campo de avanço, e também de fora para dentro, porém mais de dentro para fora porque a molécula
de ar lançada de dentro do campo emerge no tempo normal com altíssima velocidade e força,
favorecendo ainda mais a impulsão.
- Tudo bem Dr... - Iniciou um dos financistas do governo. - Ainda assim não estamos completamente
convencidos de que de fato houve uma viagem no tempo, ou uma mera fuga de nossa
percepção normal como declararam os críticos de seu projeto. Essa tecnologia já seria
extremamente útil, poderíamos criar máquinas capazes de se esconder de modo extremamente
eficiente, ou se mover com grande destreza. Com certeza, o senhor já conseguiu provar que valeu
o investimento. Só me resta a pergunta: Como pode mostrar que há de fato um salto no tempo e não
um mero mau funcionamento nos relógios do objeto?
- Ele tem razão. - Confirmou uma outra cientista. - Por mais precisos que sejam os relógios e
os demais equipamentos, ainda podemos considerar que esse aparente avanço no tempo seja uma
mera distorção de medida.
- Entendo. - Respondeu George. - Mas já fiz vários testes, não tenho a menor dúvida, e estou lhes
passando meus resultados. Já transportei inclusive cobaias. Agora só me resta um teste com um
tripulante humano.
- Um Crononauta?! - Exclamou Wells.
- Sim. Para isso precisarei de mais apoio para uma máquina maior levar um piloto numa viagem
para o futuro, e de volta ao presente.
Houve uma estupefação geral.
- Como é?!
- Está falando que é possível viajar para o passado?!
- Apenas para o passado relativo ao avanço da máquina. Quero dizer, a Máquina do Tempo, se é que
já me permitem falar assim, só pode viajar para o futuro, e de volta ao presente imediatamente
posterior ao de onde ela saiu. - Respondeu o Dr. George, enquanto pegava um pincel para riscar
num quadro branco.
- Quer dizer que as especulações sobre o retorno das partículas ao tempo anterior têm fundamento?
- Perguntou um dos cientistas.
- Sim. - Respondeu o Dr. - Quando enviamos uma partícula para o futuro, causamos um tipo de
lapso existencial onde ela deveria ter existido. Essa partícula se torna então sensível a uma
indução inversa, que imediatamente a joga de volta ao seu ponto de partida. Se adicionarmos essa
mesma indução a uma partícula comum, que nunca tenha viajado no tempo, nada acontecerá, mas
uma partícula viajante tem no fundo, uma tendência a voltar ao seu tempo original.
- O mesmo ocorre naturalmente com toda a matéria que viajar no tempo? - Completou um dos
cientistas.
- Exatamente. Vejam. - George começou a riscar no quadro. - Vamos supor que a Máquina do Tempo
saia de 20 de Janeiro de 2009 às exatas 14:00 horas, e chegue, digamos,
dez anos no futuro. De lá, ela só poderá voltar para as 14:01. Na verdade voltará para bem mais,
diria uma 14:10, devido ao processo de aceleração temporal ser lento. E da mesma forma, ela não
poderá mais viajar para um tempo futuro anterior a 10 anos. Ele estabelece então uma ponte
entre o tempo presente e o tempo 10 anos no futuro, ambos correndo paralelamente. Daqui, do
presente, só poderá voltar a 10 anos e alguns minutos no futuro, e nem poderia ser de outra
forma.
- Por quê?
- Teorizei dois motivos. Primeiro porque, creio, a matéria só pode ocupar um local
"temporalmente" vazio. Isto é, um tempo onde ela originalmente não exista no mesmo espaço, ou se
puder. Bem... As consequências de uma matéria ocupar o mesmo tempo-espaço duas vezes poderia
ser desastroso a nível de partículas.
- Segundo porque como já disse há uma atração entre os pólos temporais onde a matéria esteve.
Se saltou dez anos para o futuro, ela aparentemente não tem como tomar outro caminho. Ainda não
sei exatamente porque, mas funcionou assim em todas as micro experiências que fiz, isto é,
experiências a nível de partículas.
- E numa viagem numa máquina maior... - Iniciou um dos cientistas. - Com um piloto, qual seria
o espaço de tempo seguro para o salto.
- Fiz o cálculo me baseando no tempo que cada material leva para estar completamente alterado
a nível subatômico, quer dizer, porque a matéria não é de fato constante e inalterada ao longo
do tempo. Ela muda, suas sub partículas vão assumindo novas configurações e se renovando. Tal
como as células de um organismo vivo mudam completamente ao longo de anos. Com uma
mudança significativa, diminui o risco da matéria se deparar com uma cópia dela mesma a ponto de
gerar algum tipo de atração quântica por afinidade, e um possível aniquilamento.
- Isso tudo não passa de uma série de hipóteses. Contestou uma cientista.
- Sem dúvida. Mas não quero descartá-la. Poderia ser catastrófico. Com os materiais usados na
Máquina do Tempo cheguei a um número aproximado de 846 anos, que preferi arredondar para mil.
Um número também que me dá uma maior segurança de evitar coincidências mais acidentais.
Duvido muito que daqui a mil anos a Máquina estaria neste mesmo local, neste mesmo laboratório.
- Eh... George. - Cochichou Herbert - A máquina só pode avançar no tempo, não no espaço. Certo?
Se assim, e o salto para o futuro for muito grande, como ela poderá acompanhar a rotação da Terra?
Se esta mesma máquina saltasse para daqui a 24 horas, apareceria no vazio do espaço!
- Isso foi de fato uma de minhas maiores preocupações iniciais, mas logo vi que segundo minha teoria,
a matéria continua exercendo entre si influência em vários níveis, mesmo durante a viagem. É como se
o próprio planeta arrastasse consigo a máquina através de sua posição no tempo, mesmo exercendo menor força
gravitacional. Um tipo de... Mútua atração entre... Tempo e gravidade. Ainda não está claro o porquê, mas parece haver
uma afinidade que obriga as partículas viajantes a não se afastarem do campo de influência das partículas que ficaram,
a não ser que o avanço no tempo seja demasiado rápido.
- O que o senhor quer dizer... - Interrompeu um financista governamental, chamando de volta a atenção
de George. - Que precisa de mais verba para construir uma Máquina do Tempo e viajar mil anos para o futuro?
- Não. Só preciso de verba para um estoque de energia. A Máquina já está construída.
CAPÍTULO III
Não foi nada fácil para o Dr. George conseguir convencer o governo a lhe liberar uma licença para
nada menos que um pequeno reator nuclear. Antevendo o incrível potencial da tecnologia ali
desenvolvida, os financistas governamentais não pouparam esforços, mas não deixaram de
enfrentar grandes obstáculos, e agora olheiros de todo o mundo estavam a vigiar a experiência do
Dr. George, a sorte, era que a grande maioria deles não levava o objetivo da pesquisa a sério.
De qualquer modo, no dia 15 de Fevereiro de 2009, o próprio Dr. George estava disposto a realizar
a épica façanha. A Máquina do Tempo era uma máquina estranha. Um anel vertical de metal dourado
envolvia frontalmente uma cabine, onde se dispunham todos os controles. Logo atrás dela o reator
nuclear, movido a plutônio, que forneceria a tremenda energia não para a viagem de ida, pois esta
podia ser retirada da própria rede do laboratório, mas sim para a viagem de volta, pois nada
garantia que poderia-se encontrar fontes de energia um milênio no futuro. Logo abaixo do reator
ficava o dispositivo de indução atômica de salto temporal, onde doses intensas de energia
obrigavam átomos pesados a saltarem para o futuro, gerando um campo esférico amplo que
arrastava a matéria com ele. Em cima duas hélices, que girariam em sentidos contrários,
protegidas por uma grade, o mesmo ocorria em baixo, embora fosse mais difícil distinguir.
A Máquina repousava num pedestal, sobre um fino tripé de material altamente condutor, que era
usado para receber a energia elétrica das fontes do laboratório para a câmara de indução temporal,
tal como seu protótipo menor, que recebia energia através da mesa de metal. Uma luz vermelha em
torno do pedestal se acendia quando a energia estivesse prestes a circular no imenso circuito,
prevenindo acidentes.
Muito se insistiu que o Dr. George não deveria se arriscar em tão ousado empreendimento. Mas
somente ele parecia ser capaz de entender o funcionamento da máquina a ponto de contornar
qualquer problema que porventura surgisse na viagem. Não parecia ser possível arranjar mais
alguém suficientemente ousado, qualificado e que acreditasse na seriedade do projeto.
Os amigos Wells e Herbert estavam mais próximos da máquina, olhando para George, que acenava
alegremente de dentro da cabine, tentando disfarçar o nervosismo que era maior não pela
expectativa de viajar ao desconhecido, mas pela possibilidade de algo sair errado e a viagem não
ocorrer. Eles seriam plenamente capazes de acompanhar o companheiro nesta louca aventura, e
encabeçavam a lista de futuros viajantes caso a experiência fosse um sucesso.
Pouco mais de duas dezenas de pessoas se concentravam no local, entre cientistas, consultores,
agentes do governo e de universidades, e os poucos mas competentes técnicos e cientistas
auxiliares de George. Herbert, sem quem o acontecimento do dia seria impossível, guardava fé
quase religiosa em seu amigo, Wells não menos, e já pensava em como escreveria sobre aquele
momento épico quando tudo fosse revelado ao mundo. O que esperava fazer muito em breve.
Não deveria demorar muito. Esperava-se que a Máquina do Tempo retornasse segundos depois de
partir, para os que ficavam, por mais que o tempo para George passasse, mesmo porque estava
programada para voltar automaticamente.
O momento chegou. O Dr. George acionou os mecanismos, os imensos pares de hélices começaram a girar,
movidas por um motor a explosão. O intenso vento invadiu a sala obrigando todos a se protegerem.
A luz vermelha de alerta da plataforma se acendeu e então o indutor temporal foi ativado quando a
intensa corrente elétrica percorreu a plataforma.
Lentamente a nave flutuou, leve como um balão, já apresentando breves pisques, flashes que
denunciavam micro saltos para o futuro, de modo que a nave existia um segundo a cada 6, e cada
vez menos, até por fim, desaparecer em definitivo.
Não esperaram sequer um minuto quando de repente a nave do tempo irrompeu novamente na sala,
se deslocando bruscamente do ponto onde sobrevoava a plataforma e se chocando contra o teto, e
em seguida contra a parede, perdendo altura e finalmente caindo inclinada sobre a plataforma,
por fim, tombando abaixo.
O susto e a queda não impediram que todos pudessem perceber que a nave não retornara intacta,
tinha reparos, arranhões e mudanças diversificadas. Todos se aproximaram e viram um homem se
esforçar para abrir a cabine e sair.
Era George, quase irreconhecível. Os cabelos mais compridos e mal cortados, a barba mal feita,
roupas rústicas, totalmente diferentes da que vestia, parecendo feitas de couro e com ornamentos
de madeira, ossos e metal grosseiro. Possuía vários arranhões e cicatrizes leves. Alguns dos
quais ainda inflamados.
Todos estavam pasmos diante de alguém cuja aparência não deixava ninguém duvidar ser de fato o
primeiro Crononauta da história. Ele saiu da máquina, meio atordoado, e foi acudido pelos
amigos Wells e Herbert, outros assistentes se aproximaram. Uma breve e dificultosa troca de
palavras levou os amigos a anunciarem que ele precisava descansar e que não tinha condições de
prestar qualquer depoimento agora. E assim George foi levado para seu quarto, após várias
discussões, um a um os espectadores foram se retirando, até por fim, ao cair da noite, o local
estar habitado apenas pelos técnicos que tentavam reabilitar a máquina, apesar das instruções
confusas de George para não fazerem qualquer alteração drástica.
Exausto, George adormeceu, e seus amigos o deixaram repousar após ele ser submetido a vários
exames médicos. Herbert e Wells não sairiam dali até o dia seguinte, mas voltaram até o laboratório
ainda não totalmente recuperados do choque.
Mas o choque maior ainda estava por vir, quando um dos técnicos veio lhes mostrar alguns dados
da máquina, em especial o registro da viagem.
Ela não avançara até mil anos no futuro, ou marcaria num dos mostradores a data de 3009.
Ao invés disso, ela indicava o ano de 82701!
Contos de FC & FF
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